Morte de Alice: polícia confirma que mulher trans foi perseguida e teve o intestino perfurado

Dois funcionários são suspeitos das agressões e já foram identificados; a Polícia Civil apura se a transfobia intensificou a violência na Região da Savassi, em BH

Morte de Alice: delegada confirma que mulher trans foi perseguida e teve o intestino perfurado

A Polícia Civil confirmou, nesta sexta-feira (14), que Alice Martins Alves, mulher trans de 33 anos que morreu no último domingo (9) após ser brutalmente agredida por dois funcionários do Rei do Pastel, na Savassi, Região Centro-Sul de Belo Horizonte, foi perseguida pelos agressores e teve o intestino perfurado durante o ataque.

Em coletiva, a delegada do Núcleo de Feminicídio do DHPP, Iara França, informou que o caso passou a ser investigado como homicídio e feminicídio, após a morte de Alice por complicações das agressões. A delegada explicou ainda que a vítima era conhecida no local e relatava sofrer olhares preconceituosos.

A agressão ocorreu no dia 23 de outubro. Naquele dia, Alice havia sido incentivada pela família a sair para se distrair. Conforme as investigações, ela esteve em outro bar antes de chegar ao estabelecimento onde o caso aconteceu. Depois de consumir bebida alcoólica, levantou-se e foi embora, sem pagar uma conta de R$ 22, comportamento que, segundo a Polícia Civil, já havia ocorrido outras vezes, sem gerar problemas no estabelecimento.

Mesmo assim, dois funcionários decidiram persegui-la. Também foi revelado que Alice havia pedido um carro de aplicativo e informado ao pai que estava indo para casa, antes de sofrer as agressões. Após a morte de Alice, o estabelecimento Rei do Pastel, onde os agressores trabalhavam, se pronunciou pela primeira vez nesta sexta-feira (14).

Conforme as investigações, esse motoqueiro também foi ameaçado, mas permaneceu no local e ajudou a salvar a vida de Alice, encaminhada para uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) no mesmo dia.

Suspeitos identificados

O chefe do departamento, delegado Thiago Machado, confirmou que dois suspeitos já foram identificados e qualificados. Eles trabalhavam no estabelecimento frequentado pela vítima. A Polícia Civil também apura se houve transfobia, o que pode ter intensificado a violência.

“Estamos investigando se os autores agrediram Alice de forma mais abrupta por ela ser uma mulher trans. É possível que, se fosse uma mulher cisgênero, a abordagem fosse diferente”, afirmou a delegada.

Piora no estado de saúde e morte

Segundo as investigações, no dia da agressão, Alice foi atendida em uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) e liberada. Em casa, ela continuou sentindo fortes dores e voltou a procurar ajuda no dia 26 de outubro, em um hospital particular de Contagem, na Grande BH. Exames apontaram costelas quebradas e outras lesões graves.

Ainda de acordo com a delegada responsável pelo caso, Alice só conseguiu registrar o Boletim de Ocorrência no dia 5 de novembro, acompanhada do pai. Ela demorou por vergonha e medo.

“Ela tinha receio dos autores e revelou esse medo no depoimento”, afirmou a delegada.

A polícia também revelou que, com o passar dos dias, o estado de saúde de Alice piorou. Ela perdeu cerca de 10 kg, teve dificuldade para se alimentar e sentia dores intensas. No dia 8 de novembro, uma nova internação identificou uma perfuração no intestino, causada pelas agressões. Alice morreu no dia seguinte, em um hospital particular de Betim, na Região Metropolitana de Belo Horizonte.

Investigação segue sob sigilo

O caso foi encaminhado ao Departamento de Feminicídios no dia 10 de novembro e segue sob sigilo. A PCMG informou que medidas cautelares já foram solicitadas e cumpridas, mas não detalhou quais, já que os investigados estão em liberdade.

A corporação negou a participação de um terceiro funcionário, como chegou a circular em alguns veículos de imprensa.

O inquérito conta com áudio captado por câmera, que será periciado. A Polícia Civil lembrou que Alice passou por exame de corpo de delito em vida, no dia 5 de novembro, e a perícia confirmou que a morte foi causada diretamente pelas agressões.

A reportagem da Itatiaia entrou em contato com o estabelecimento onde os dois suspeitos trabalham e aguarda retorno.

O que diz o Rei do Pastel

“Tendo em vista o crime ocorrido na Savassi que levou à morte de Alice Martins Alves, esclarecemos que desde o início das investigações, nos colocamos a disposição das autoridades competentes, auxiliando com todos os dados que nos foram solicitados.Várias versões e vertentes estão sendo divulgadas na mídia e principalmente nas redes sociais, sem as devidas apurações e efetivas comprovações. Estamos aguardando e confiantes no trabalho sério e eficiente que vem sendo executado pela polícia, com a certeza da correta apuração dos fatos e a devida culpabilidade dos envolvidos. Ressaltamos a nossa solidariedade incondicional aos familiares e amigos da Alice, e destacamos que não compactuamos, em hipótese alguma, com ações discriminatórias referente a identidade de gênero, orientação sexual, raça ou qualquer outra natureza. Carregamos em nosso DNA uma cultura de bem servir com produtos de qualidade e cuidado com nossos clientes, sempre prezando por um ambiente de harmonia.”

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Formada em jornalismo pelo Centro Universitário de Belo Horizonte (UniBH), já trabalhou na Record TV e na Rede Minas. Atualmente é repórter multimídia e apresenta o ‘Tá Sabendo’ no Instagram da Itatiaia.
Jornalista formado em Comunicação Social pelo Centro Universitário de Belo Horizonte (UNI-BH). Na Itatiaia desde 2008, é “cria” da rádio, onde começou como estagiário. É especialista na cobertura de jornalismo policial e também assuntos factuais. Também participou de coberturas especiais em BH, Minas Gerais e outros estados. Além de repórter, é também apresentador do programa Itatiaia Patrulha na ausência do titular e amigo, Renato Rios Neto.

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