Caso Alice: PC detalha agressões brutais, possível transfobia e últimos dias da mulher trans em BH

Delegados confirmam identificação de dois funcionários suspeitos e se transfobia intensificou a violência; Alice morreu após complicações de agressões sofridas e uma perfuração no intestino

Caso Alice: PC detalha agressões brutais, possível transfobia e últimos dias da mulher trans em BH

A Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG) deu novos detalhes, nesta sexta-feira (14), sobre a investigação da morte de Alice Martins Alves, mulher trans de 33 anos, que morreu no último domingo (9), após ser brutalmente agredida por dois funcionários de um estabelecimento na Savassi, Região Centro-Sul de Belo Horizonte. A agressão ocorreu no dia 23 de outubro.

O chefe do departamento, delegado Thiago Machado, e a delegada Iara França, do Núcleo de Feminicídio do DHPP, confirmaram que dois suspeitos já foram identificados e qualificados. Eles trabalhavam no local frequentado pela vítima.

A PC informou que o caso, inicialmente tratado como lesão corporal, passou a ser investigado como homicídio e feminicídio, após a morte de Alice por complicações das agressões, entre elas, uma perfuração no intestino. A reportagem da Itatiaia entrou em contato com o estabelecimento onde os dois suspeitos trabalham e aguarda retorno.

Segundo a delegada, a polícia também apura se houve transfobia, o que pode ter intensificado a violência.

“Estamos investigando se os autores agrediram Alice de forma mais abrupta por ela ser uma mulher trans. É possível que, se fosse uma mulher cisgênero, a abordagem fosse diferente”, afirmou.

Entenda o caso

A agressão aconteceu na noite de 23 de outubro, quando Alice deixou o estabelecimento sem pagar uma conta de R$ 22. De acordo com a investigação, isso já havia ocorrido antes, tanto com ela quanto com outros clientes, sem gerar conflitos, já que os consumidores costumavam voltar posteriormente para quitar o valor.

A delegada explicou que a vítima era conhecida no local e relatava sofrer olhares preconceituosos.

“Segundo testemunhas, ela era muito tranquila, tímida, formada em estética, sem qualquer passagem pela polícia, e com uma família muito acolhedora”, disse Iara França.

Naquele dia, Alice havia sido incentivada pela família a sair para se distrair. Ela esteve em outro bar antes de chegar ao estabelecimento onde ocorreu o caso. Depois de consumir bebida alcoólica, levantou-se e foi embora, comportamento que, segundo a PC, já havia acontecido sem problemas anteriores.

Mesmo assim, dois funcionários decidiram persegui-la. Ela havia pedido um carro de aplicativo e informado ao pai que estava indo para casa.

“Em um áudio, é possível ouvir Alice dizendo que já havia pago os R$ 22”, explicou a delegada. Poré, naquele dia, os homens a alcançaram em um ponto mais isolado e iniciaram as agressões. A vítima só não morreu no local porque um motociclista testemunhou a cena, interveio e acionou o SAMU e a Polícia Militar (PM).

“Esse motoqueiro também foi ameaçado, mas permaneceu no local e ajudou a salvar a vida dela naquele momento”, disse Iara.

Piora no estado de saúde e morte

Segundo as investigações, no dia da agressão, Alice foi atendida em uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) e liberada. Em casa, ela continuou sentindo fortes dores e voltou a procurar ajuda no dia 26 de outubro, em um hospital particular de Contagem, na Grande BH. Exames apontaram costelas quebradas e outras lesões graves.

Ainda de acordo com a delegada responsável pelo caso, Alice só conseguiu registrar o Boletim de Ocorrência no dia 5 de novembro, acompanhada do pai. Ela demorou por vergonha e medo.

“Ela tinha receio dos autores e revelou esse medo no depoimento”, afirmou a delegada.

A polícia também revelou que, com o passar dos dias, o estado de saúde de Alice piorou. Ela perdeu cerca de 10 kg, teve dificuldade para se alimentar e sentia dores intensas. No dia 8 de novembro, uma nova internação identificou uma perfuração no intestino, causada pelas agressões. Alice morreu no dia seguinte, em um hospital particular de Betim, na Região Metropolitana de Belo Horizonte.

Investigação segue sob sigilo

O caso foi encaminhado ao Departamento de Feminicídios no dia 10 de novembro e segue sob sigilo. A PCMG informou que medidas cautelares já foram solicitadas e cumpridas, mas não detalhou quais, já que os investigados estão em liberdade.

A corporação negou a participação de um terceiro funcionário, como chegou a circular em alguns veículos de imprensa.

O inquérito conta com áudio captado por câmera, que será periciado. A Polícia Civil lembrou que Alice passou por exame de corpo de delito em vida, no dia 5 de novembro, e a perícia confirmou que a morte foi causada diretamente pelas agressões.

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Formada em jornalismo pelo Centro Universitário de Belo Horizonte (UniBH), já trabalhou na Record TV e na Rede Minas. Atualmente é repórter multimídia e apresenta o ‘Tá Sabendo’ no Instagram da Itatiaia.
Jornalista formado em Comunicação Social pelo Centro Universitário de Belo Horizonte (UNI-BH). Na Itatiaia desde 2008, é “cria” da rádio, onde começou como estagiário. É especialista na cobertura de jornalismo policial e também assuntos factuais. Também participou de coberturas especiais em BH, Minas Gerais e outros estados. Além de repórter, é também apresentador do programa Itatiaia Patrulha na ausência do titular e amigo, Renato Rios Neto.

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