Ouvindo...

Cajueiro-anão garante renda no Semiárido e resiste a longos períodos de estiagem

Tecnologia da Embrapa dobra produtividade em relação ao cajueiro gigante e fortalece agricultura familiar

Cajueiro-anão comprovou ser resistente a pragas

O cajueiro-anão vem se consolidando como uma opção de renda sustentável para agricultores familiares do Semiárido nordestino. A tecnologia desenvolvida pela Embrapa Agroindústria Tropical (CE), mostra resultados mesmo em épocas de estiagem severa. Além de ganhos econômicos, a inovação contribui para a permanência das famílias no campo.

Resistente à escassez hídrica e ao ataque de doenças e pragas, como a mosca-branca, o cajueiro-anão comprovou a sua viabilidade durante a seca que destruiu várias culturas no Nordeste entre 2012 e 2017. A planta é capaz de produzir mais de 1.000 quilos de castanha por hectare, mais de duas vezes a média nacional, desde que seguidas as práticas de manejo recomendadas para cada etapa do cultivo.

A rusticidade da espécie vem de mecanismos fisiológicos únicos. Diferente de muitas plantas, cujas folhas caem para evitar perda de água, o cajueiro mantém a folhagem verde, reduzindo a transpiração sem interromper a fotossíntese, processo essencial para a sua sobrevivência. Também consegue melhorar a absorção de água do solo e até aproveitar a umidade da madrugada, típica das noites mais amenas do sertão.

“Poucas espécies frutíferas conseguem produzir em pleno período seco. O auge da produção do caju acontece no segundo semestre, justamente quando a maioria das plantas da Caatinga está em baixa atividade metabólica devido à falta de chuvas. É nesse momento que o caju se torna fonte estratégica de renda. Espécies como o juazeiro, por exemplo, têm raízes muito mais profundas, que lhes garante outra estratégia de sobrevivência. Já o cajueiro, mesmo com raízes menos profundas, consegue produzir no período seco. É realmente incrível”, ressaltou o pesquisador Marlos Bezerra, da Embrapa Agroindústria Tropical.

Essas características presentes nos clones de cajueiro-anão, associadas a outras vantagens, fizeram muitos produtores migrar para a atividade na última grande seca que dizimou outras culturas, inclusive antigos plantios de cajueiros gigantes. Com o cultivo desses clones, associado às práticas adequadas de manejo da cultura, é possível obter, no mínimo, o dobro da produtividade registrada nos tradicionais cultivos de cajueiro gigante. Os produtores ainda contam com a vantagem de aproveitar o pedúnculo, o que torna a atividade mais atraente economicamente.

Para Bezerra, além da sustentabilidade econômica, o cajueiro-anão oferece uma opção de cultura amigável ao fortalecimento da biodiversidade local, principalmente quando cultivado em sistemas agroecológicos ou integrados, como a Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF). Os pomares atraem abelhas, retêm umidade no entorno e favorecem a presença de pequenos animais.

Melhoramento genético

O caju é uma cultura típica do Nordeste, com praticamente 100% da produção de castanhas concentrada nos estados do Ceará, maior produtor, Rio Grande do Norte e Piauí. Embora a amêndoa retirada da castanha seja o principal produto comercial do agronegócio do caju, é possível gerar renda também com a venda do pedúnculo como caju de mesa, para consumo in natura, ou para aproveitamento na fabricação de sucos, doces, cajuína e outros derivados.

Para fortalecer essa cadeia produtiva, o Programa de Melhoramento Genético da Embrapa já desenvolveu 13 clones para o mercado, sendo 11 de cajueiro-anão recomendados para a produção de castanha e pedúnculo, mais produtivos, resistentes a doenças e adaptados às condições de clima e solo do Semiárido. Alguns desses materiais genéticos foram selecionados em regiões extremamente secas do Semiárido e, além de alta produtividade, suportam bem solos arenosos e com alumínio.

O pesquisador Gustavo Saavedra, chefe-geral da Embrapa Agroindústria Tropical, explicou que essas características são essenciais para garantir a continuidade da cultura e segurança para os produtores. Enquanto outras frutíferas necessitam de altas quantidades de água, o cajueiro consegue produzir com uma precipitação anual entre 600 e 800 milímetros. Em anos de elevados déficits hídricos são esses materiais genéticos que se mantêm produtivos no pomar.

“No contexto das mudanças climáticas, a tendência é que algumas regiões tenham maior redução de chuvas e, nessas condições, o cajueiro se sobressai como uma planta resiliente e bem adaptada. Pensando no Nordeste, em especial no Semiárido, desenvolvemos clones para a produção em sistema de sequeiro, com alta performance produtiva e que, bem manejados, podem superar os parâmetros de produção definidos pela pesquisa”, pontuou Saavedra.

Leia também

O especialista acrescenta, ainda, que em localidades onde outras alternativas agrícolas são inviáveis, o cajueiro proporciona renda e prosperidade e pode contribuir para o desenvolvimento de uma classe média rural.

*Giulia Di Napoli colabora com reportagens para o portal da Itatiaia. Jornalista graduada pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), participou de reportagem premiada pela CDL/BH em 2022.