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Nero botou fogo em Roma!

Ninguém de nós, em absoluto, está entendendo exatamente o que é essa tal pós-modernidade

Padre Samuel

Em tempos de incertezas e de crises, a tentação é dar soluções rápidas e fáceis, para questões complexas. A contemporaneidade é um grande tempo de crises. Ninguém de nós, em absoluto, está entendendo exatamente o que é essa tal pós-modernidade. Alguns dizem que ela é líquida, outros que é reflexiva, outros dizem que, na verdade, estamos ainda saindo de tempos modernos. Basta entrar num grupo de pais e mestres no WhatsApp, e a gente percebe, que nestes tempos, ninguém tem a mínima ideia do que fazer, nem quando o assunto é os dramas da infância.

Ah... Em tempos de dúvidas, sobram as infantilidades. Há algo de pueril, ressentido, da ordem do medo, que emerge, como delírio, nas “transições de época”. Lembremo-nos, visitando a história, que se repete como farsa ou tragédia, de que Nero, na crise do Império Romano e, sem saber o que fazer, coloca fogo em Roma.

Esse episódio, na história do Ocidente, foi o sintoma de um César nostálgico de um passado glorioso, delirante com sua própria grandeza, vítima do fetiche pelo espetáculo. A nostalgia do passado é sempre uma ilusão, dado que nosso acesso ao que já passou é fruto da ilusão de com um momento em que “houve” uma identificação exata entre o nossos desejos e a realidade exata. O delírio dos grande é sempre um risco. Isso dado que a maior das ilusões é a de que poder tem a ver cargo, com imposição, com Hierarquia, ou que a soma dessas coisas seja suficiente para proteger a fragilidade de nossa breve existência desse nosso parentesco irrenunciável com o “nada”. O fetiche pelo espetáculo decorre do fato de que as vezes o refúgio do desespero é o riso. Às vezes, é estratégico marcar compromisso com o absurdo, parar se transmitir a impressão “de que algo se sabe” ...

Momentos de crise, de tragédia, de fogo, de farsa, são também de revisão. Há circunstâncias, em que a contingência ou a providência divina jogam bem em nossa cara que todo mundo sempre sabe mais do que deve e menos do que precisa. Diante desses momentos é preciso não ter compromisso com a insanidade!

Sem essa consciência, sem essa ponderação, nações, projetos, relacionamentos facilmente ruem e veem à baixo. Em a meio declínios, sejam civilizacionais ou sejam pessoais, a gente, correr o risco de “sem querer querendo”, catalisar processos que desejamos evitar.

Nosso “Império” experimenta, de novo, mudanças profundas no modo como até aqui se o pensou. E não adianta, de novo, colocar fogo em Roma. Ninguém deve sentir orgulho do imprevisível. “Nem quem ganhar ou perder vai ganhar ou perder. Vai todo mundo perder” (Dilma). Estamos em crise, em guerra!

A sabedoria oriental, há quase três mil anos, ensina que “a suprema arte da guerra é vencer o inimigo sem lutar” (Sun Tzu). A sabedoria chinesa é um dos grandes exemplares, na história, do entendimento sobre “paciência”, sobre “estratégia”, sobre guerras”... São cinco mil anos de estrada. E como já dizia Napoleão Bonaparte: “quando a China se despertar, o mundo vai tremer”.

E nós, o que será de nós? Bom. Será como sempre foi. Nero não sabia e não sabe: “sem ti, tudo correrá sem ti” (Fernando Pessoa). Ter consciência disso é uma das belezas do cinismo diante da vida, do realismo crônico e da fé cristã... Isso seja porque “a crise é espelho que força a olhar o que não queríamos enxergar”, isso porque “dentro de nós há o poder de resistir a tudo e de recomeçar”, isso porque “Deus permitiu a queda de Roma para que os homens buscassem a eternidade em outro lugar"(Cidade de Deus, Sto. Agostinho).

Estão botando fogo na Cidade! E esse texto não é sobre Roma...

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Pró-reitor de comunicação do Santuário Basílica Nossa Senhora da Piedade. Ordenado sacerdote em 14 de agosto de 2021, exerceu ministério no Santuário Arquidiocesano São Judas Tadeu, em Belo Horizonte.

A opinião deste artigo é do articulista e não reflete, necessariamente, a posição da Itatiaia.