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Um pouco do tanto que aprendi na China e na Coreia do Sul

Uma missão brasileira para explorar Inteligência Artificial e inovação em escolas, empresas e organizações asiáticas

Voltei recentemente da Ásia, após participar de uma delegação brasileira composta por 40 representantes de quase 20 instituições que atuam nos campos da educação e da cultura. A missão, organizada pela Fundação Itaú, teve como objetivo aprofundar os conhecimentos sobre Inteligência Artificial e suas relações com educação e a cultura. Nossa expectativa era de que encontraríamos o futuro!

Visitamos escolas de referência, fundações que investem em educação e cultura, empresas que produzem conteúdos educacionais e outras que fornecem produtos e serviços tecnológicos (desde robôs, até sistemas complexos de logística, sites de busca e fábrica de carros autônomos). Chama a atenção como a tecnologia de ponta faz parte da vida de milhões de chineses. Para se ter uma ideia, é difícil conseguir usar dinheiro em espécie, que nas grandes cidades já funciona quase totalmente com pagamentos por aplicativo. Além disso, carros elétricos são comuns e estão no dia a dia.

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Mas nosso foco aqui na coluna é educação, então quero contar o que vi nas escolas que visitei. Uma delas, em Shanghai, me impressionou já na chegada, com seu campus impecável. As crianças faziam atividades físicas diversas em um complexo esportivo de primeira linha. No centro da escola, uma grande horta é cuidada por alunos e professores. Os prédios ao redor tinham salas de aula amplas e bem equipadas. Assistimos a uma aula de inglês com uma turma de crianças de 9 anos. Sabendo que receberia visitantes brasileiros, a professora preparou uma aula sobre as relações entre China e Brasil, passando por geografia, cultura e esportes dos dois países. Em termos de uso de recursos tecnológicos, a professora usou apenas um projetor para exibir um vídeo com músicas brasileiras e imagens do nosso país. O que mais chamou a atenção foi o modo dessa professora ensinar e interagir com seus alunos. Partiu do que eles já sabiam ou imaginavam sobre o Brasil. Depois, ampliou esse conhecimento, apresentando novas informações para o grupo. Nesse percurso, checava e reforçava os conhecimentos dos alunos sobre a língua inglesa. No final da aula, propôs que os alunos entrevistassem os brasileiros que estavam na sala, para aprender com eles e colocar em prática habilidades de comunicação. Não foi uma aula cheia de tecnologia, mas a professora deu conta, com qualidade, do que é essencial: engajou os estudantes para a atividade, favoreceu as interações, promoveu aprendizagem.

A segunda escola, localizada em Hong Kong, me marcou bastante por algumas razões: eles têm um trabalho muito bem estruturado de STEAM (sigla que significa o desenvolvimento de projetos que integram conhecimentos de Ciência, Tecnologia, Engenharia, Arte e Matemática). Ou seja, os alunos aprendem conteúdos dessas áreas enquanto resolvem problemas reais que identificam nos locais em que vivem. Assim, esses conhecimentos são construídos em conexão com a vida real, de modo prático. Essa abordagem ajuda a desenvolver criatividade, comunicação, colaboração e pensamento crítico. A escola tem, também, um laboratório de biologia molecular, que é um espaço de formação dos alunos como pesquisadores. Aprender a investigar, por meio da experimentação e outros métodos de ciência, é fundamental nos dias de hoje. O trabalho da escola com os professores também merece destaque: eles fazem formação continuada na própria unidade escolar, professor aprendendo com professor, a partir daquilo que desenvolvem junto aos alunos. Todo esse conhecimento é organizado por eles e publicado em uma revista científica da escola.

Nesses 15 dias em que passei na China e na Coreia do Sul pude perceber a força da tecnologia em vários campos da vida pessoal, social e escolar. Mas também ficou claro que nenhuma tecnologia substitui o professor. O que muda são alguns dos papéis desses profissionais da educação. Estar aberto a tais mudanças é essencial para valorizarmos cada vez mais a profissão docente.


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Paulo Emílio Andrade é presidente do Instituto iungo, organização sem fins lucrativos que tem o propósito de transformar, com os professores, a educação no Brasil. É mestre e doutor em educação, pesquisador do Núcleo de Novas Arquiteturas Pedagógicas da USP e professor da PUC Minas.
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