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Halloween: city tour percorre locais assombrados e conta as histórias dos fantasmas de BH

‘Almas de Minas’ propõe um mergulho no imaginário belo-horizontino, revivendo personagens como o Cego da Contorno, a Loira do Bonfim e Maria Papuda

Casarão na Rua Estevão Pinto, antiga Rua do Chumbo, uma das paradas da caminhada Almas de Minas

Se você estiver dirigindo pela Avenida do Contorno, em Belo Horizonte, nas primeiras horas da manhã, e avistar um senhor idoso atravessando a pista, cuidado: pode não ser apenas um pedestre. Dizem que ele anda tateando o ar, perdido, procurando a própria casa - até desaparecer segundos antes de ser atingido. Se isso acontecer, já saiba: você não está maluco, e nem sozinho. É o Cego da Contorno.

A lenda do Cego da Contorno é apenas uma das várias que fazem parte do city tour Almas de Minas que mantém esses fantasmas “vivos”, resgatando lendas como as do Capeta da Vilarinho, da Loira do Bonfim e do Avantesma da Lagoinha — e propondo uma reflexão sobre a cidade a partir dessas lendas. A proposta está inserida no Projeto BH a Pé, criado em 2020 por Rafael Sette e Luísa Dalcin. Para quem gosta de uma boa história de arrepiar, o clima de Halloween chega com força nesta sexta (31) e sábado (1º/11)

“Ele é um homem, um senhor que, depois da morte da esposa, é internado pelos filhos em uma clínica. Mas eles fazem isso não por cuidado, e sim porque querem ter acesso aos bens da família. Depois de morto, ele tenta voltar para casa, mas ela já não existe”, explicou Rafael sobre o mistério do idoso da Contorno. A ideia é propor uma reflexão sobre a cidade a partir dessas lendas.

Assombrações da cidade

“Toda cidade tem suas lendas, seus mitos, suas assombrações. No caso específico de BH, há algo diferente: o quanto essas lendas dialogam com o contexto histórico e político da cidade. A gente tem, por exemplo, histórias como a da Maria Papuda, ou Maria do Arraial, que conta sobre um processo de exclusão social, de expulsão de uma população pobre e negra que morava aqui, foi empurrada para a periferia durante a construção da capital e, depois, de alguma forma, volta para assombrar os políticos.”

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Outra história curiosa é a do fantasma da Rua do Ouro, no bairro Serra, na Região Centro-Sul. “Os funcionários públicos que vieram de Ouro Preto (Região Central de Minas) para cá, muitos deles trazidos a contragosto, nem todos eram ricos ou de classe média recebendo casas no bairro. Hoje, a Savassi. Muitos acabaram vivendo à margem da sociedade, do lado de fora da Avenida do Contorno. Por isso, essa assombração aparece sempre ali, na Rua do Ouro, de frente para a Contorno e a Getúlio Vargas”, contou.

Halloween mineiro tem Loura do Bonfim, Capeta da Vilarinho e outros fantasmas em caminhada temática de BH

Para a Loira do Bonfim, uma das mais conhecidas, são apresentados o contexto e até mesmo um novo olhar sobre a personagem, que dizem que ela ainda perambula pela região Noroeste. “É a mulher que retorna do mundo dos mortos por ter morrido noiva, sem se casar. No contexto da época, a sociedade entendia que sua vida não havia sido plena se ela não tivesse atingido o casamento”, explicou.

As lendas e a literatura

A caminhada percorre três quilômetros pela Região Centro-Sul, partindo do bairro Cruzeiro, passando pelo Serra e terminando na Praça da Liberdade, busca lendas de todo o estado, não apenas de Belo Horizonte. Rafael explica, que pesquisa escritores mineiros, como Carlos Drummond de Andrade e Pedro Nava, para reunir histórias de assombrações e criar a curadoria do passeio.

“A gente fala o assassinato do sino em São João del-Rei (Campo das Vertentes)... E até um caso envolvendo Augusto Lima, que teria visto fantasma em Juiz de Fora (Zona da Mata). São muitas histórias interessantes, pouco conhecidas, e as pessoas sempre se impressionam”, relatou Rafael.

Durante os encontros, os participantes costumam compartilhar suas próprias histórias de assombração. Rafael conta que nunca viu um fantasma, mas há quem garanta já ter presenciado uma aparição.

“Eu nunca vi fantasma. Mas uma coisa que a gente já nota é que, especialmente na temática de Halloween, o passeio é sempre muito diferente, porque as pessoas se empolgam. Muitas vezes as pessoas trazem suas próprias histórias. Todo grupo tem alguém que conta sobre algum fantasma, alguma assombração que viu em algum lugar. Muita gente vai fantasiada”, contou. Inclusive, haverá, nesta edição, concurso de melhor traje de Dia das Bruxas.

A dança com o capeta

De acordo com Rafael, muitos afirmam ter conhecido o Capeta da Vilarinho — aquele famoso pelo baile na Quadra do Vilarinho, em Venda Nova — e até mesmo ter dançado com ele. “Há também quem fala da moça da Rua do Chumbo (atual, Rua Estevão Pinto, no bairro Serra). O pessoal diz: ‘Eu estudava aqui no Sagrado Coração e via essa fantasma frequentemente’”, completou.

Para quem já conhece, sempre há uma novidade; e, para quem não conhece, é uma oportunidade de descobrir e repassar as histórias, mantendo os fantasmas como parte da cidade. “Acho que a caminhada ajuda a conservar essas lendas. Mesmo as mais famosas, muitas vezes as pessoas não conhecem todos os detalhes. Então acredito que acabam refletindo, ouvindo novamente essas histórias e, depois, repassando-as adiante.”

Almas de Minas – Caminhada de Halloween

  • Ingresso: R$ 135
  • Datas: 31 de outubro e 1º de novembro (sexta e sábado)
  • Horário: 19h
  • Inscrições: pelo Sympla ou pelo Instagram @caminhadasbh
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Formou-se em jornalismo pela PUC Minas e trabalhou como repórter do caderno de Gerais do jornal Estado de Minas. Na Itatiaia, cobre principalmente Cidades, Brasil e Mundo.