Ouvindo...

Jovem tem caso raro de trombose e vazamento de líquido do cérebro após uso de anticoncepcional

Arquiteta de 27 anos passou por cinco internações e uma cirurgia delicada após desenvolver trombose e fístula no crânio após uso de pílulas hormonais

“Achei que era labirintite”: jovem descobre trombose e vazamento de líquido do cérebro após uso de anticoncepcional (imagem meramente ilustrativa)

A arquiteta Ana Júlia Pires, de 27 anos, enfrentou complicações graves e raras associadas ao uso de anticoncepcional hormonal entre 2021 e 2025. O caso chama a atenção de especialistas para os riscos e para a importância da avaliação médica antes do início do uso desses medicamentos.

Tudo começou em julho de 2021, quando Ana Júlia, então com 23 anos, voltou de uma viagem e passou a sentir tonturas, dores na lombar e no pescoço. “Achei que era labirintite, fiquei meio tonta, enjoada”, contou ao g1.

Um dia depois, a jovem teve uma convulsão e precisou ser internada. Dois dias após a internação, veio o diagnóstico: trombose venosa cerebral, uma condição em que coágulos bloqueiam as veias responsáveis por drenar o sangue do cérebro.

Segundo os médicos, o quadro foi provocado pelo uso contínuo de um anticoncepcional oral combinado, que contém estrogênio e progesterona, hormônios conhecidos por aumentar o risco de formação de coágulos. A trombose deixou sequelas importantes: estrabismo súbito, perda de equilíbrio e diminuição da força muscular.

Ana Júlia passou meses em fisioterapia para recuperar a visão e a coordenação motora. “Um dos meus olhos desviou cerca de 45 graus. Só voltei a andar aos poucos, com ajuda da minha mãe, do meu noivo e da fisioterapia”, relatou. Mais de um ano após o diagnóstico, em outubro de 2022, ela notou um novo sintoma: um corrimento nasal transparente que não cessava. Inicialmente, acreditou se tratar de uma gripe.

“O nariz não parava de escorrer. Depois de um mês, a gripe passou, mas o corrimento continuou”, lembrou. Após uma série de exames, em julho de 2024, Ana Júlia descobriu que o líquido era líquido cefalorraquidiano (líquor), uma substância que protege o cérebro e a medula espinhal. O vazamento indicava uma fístula liquórica transnasal, causada pelo aumento da pressão intracraniana decorrente da trombose.

Segundo a otorrinolaringologista Camila Dassi, especialista em rinologia e base de crânio dos hospitais Albert Einstein e Sírio-Libanês, a trombose aumentou a pressão dentro do crânio da paciente, enfraquecendo estruturas ósseas e abrindo uma pequena passagem entre o crânio e a cavidade nasal. “O ponto central é a conscientização de que o anticoncepcional hormonal é um medicamento pró-trombótico, capaz de elevar o risco de coágulos e, consequentemente, de complicações graves como essa”, explicou à reportagem do g1.

A ginecologista e obstetra Mariana Medina de Almeida Pereira acrescentou que, em cada grupo de 10 mil mulheres, de uma a cinco podem desenvolver trombose espontaneamente. Com o uso de anticoncepcionais hormonais, esse número pode chegar a nove em cada 10 mil. No caso de Ana Júlia, não havia histórico familiar da doença, nem outros fatores de risco como tabagismo, obesidade ou enxaqueca com aura.

“Descobri depois que o anticoncepcional que eu usava tinha risco maior de trombose. Nunca fiz testes para saber se eu era trombofílica”, contou. Ana Júlia usou o anticoncepcional Tâmisa 20 por cerca de dois anos e, depois, o Diane 35 por mais um ano e meio, ambos contendo estrogênio, hormônio diretamente associado ao aumento de risco de trombose venosa, segundo a médica.

O tratamento da fístula exigiu uma cirurgia delicada realizada em fevereiro de 2025, por via endonasal, ou seja, pelo nariz. “Utilizamos estruturas do próprio nariz da paciente para fechar o vazamento”, explicou a médica Camila Dassi. A operação durou cerca de duas horas e foi considerada de alto risco por ser feita em uma área próxima ao cérebro, meninges e vasos sanguíneos.

“Quando deitei na mesa, pensei: posso não acordar bem. Mas deu tudo certo”, disse Ana Júlia. Atualmente, ela está totalmente recuperada. A especialista alerta, porém, que fístulas não tratadas podem permitir a entrada de bactérias no sistema nervoso central, aumentando o risco de infecções graves, como meningite.

O que é trombose venosa cerebral?

De acordo com o Ministério da Saúde, a trombose venosa cerebral ocorre quando se formam coágulos nas veias responsáveis pela drenagem do sangue do cérebro, o que pode elevar a pressão intracraniana.

Os sintomas mais comuns incluem:

  • dor de cabeça intensa e persistente;
  • náusea e vômitos;
  • convulsões;
  • alterações visuais;
  • fraqueza em partes do corpo;
  • confusão mental.

Leia também

A Rádio de Minas. Tudo sobre o futebol mineiro, política, economia e informações de todo o Estado. A Itatiaia dá notícia de tudo.