O roubo de cargas é um problema com ramificações em quase todos os Estados do país.
Os números constam no relatório da Associação Nacional do Transporte de Cargas e Logística (NTC&Logística), divulgado com números consolidados de 2024.
O Presidente da Federação das Empresas de Transportes de Carga de Minas Gerais (Fetcemg), Gladstone Lobato, destacou a gravidade do problema, que vem de outras épocas.
Lobato apontou, ainda, que o custo destes roubos acaba sendo repassado ao consumidor.
“E isso, querendo ou não, no final, vai para o custo. Quem paga isso é a população”, completou.
A região Sudeste, onde estão Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais,
Terror nas estradas
Diferentemente da modalidade de furto, quando as cargas ou mesmo os caminhões são levados sem que o caminhoneiro perceba, no roubo, os criminosos agem armados, interceptam o veículo, ameaçam e costumam ser violentos.
Com mais de 30 anos de experiência, o motorista Sebastião Lage estava lavando o para-brisa do caminhão quando foi abordado pelos criminosos na região metropolitana de Belo Horizonte.
“Eu parei para lavar o para-brisa, estava muito sujo, e quando eu ia entrar no caminhão, quatro caras me abordaram, colocaram a arma nas minhas costas e anunciaram o assalto. Falaram que queriam só o caminhão. Então me colocaram para dentro, deitado na cama, e os quatro entraram armados e arrancaram”, contou.
Segundo o caminhoneiro, ele passou por momentos de terror em posse dos bandidos.
“Quando chegou perto do Topo do Mundo eles pararam o caminhão, mandaram eu ir para o meio do mato e me amarraram em uma árvore. Eles ficaram comigo lá, me ameaçando, com revólver na minha cabeça. Falaram que estava armando chuva e que se chovesse poderiam me matar, porque não iam ficar comigo lá”, relatou Sebastião.
Segundo os dados da Associação Nacional do Transporte de Carga, São Paulo é o Estado com mais registros de roubos de carga no Brasil, com mais de 4.711 casos. Na sequência, vem o Rio de Janeiro com 3.974 ocorrências.
Neste relatório, Minas aparece em 4º lugar com 214 ocorrências, atrás de Pernambuco com 314 roubos. No entanto, os roubos registrados em Minas, Rio e São Paulo, somados, atingem a marca de 8.899 casos - ou seja, os três estados da região sudeste são responsáveis por 90% dos roubos de carga registrados em todo país.
A evolução do crime
Os setores de inteligência das forças de segurança já identificaram vários elementos que comprovam a participação de facções criminosas como Comando Vermelho, no Rio de Janeiro, e PCC, em São Paulo, nos roubos nas rodovias brasileiras.
O superintendente de atividades especiais da Secretaria de Segurança Pública do Rio e ex-integrante do Bope, major Leonardo Novo, afirma que o roubo de cargas é lucrativo para as organizações criminosas.
“A região Sudeste tem os grandes centros do país, as maiores malhas viárias e isso então é um fator importante no impacto dessa criminalidade. No Rio de Janeiro, especificamente, temos uma questão que preocupa bastante, que é a diversidade de facções criminosas. Essas facções — que há pouco tempo atrás tinham praticamente uma exclusividade criminal, que era o tráfico de drogas — e a milícia ampliaram as suas atividades de obtenção de recursos ilícitos.
E o roubo de carga, pela sua lucratividade, acabou sendo mais uma modalidade utilizada por essas facções criminosas tradicionais. Então, hoje, o criminoso é polivalente. Ele não atua somente no tráfico, ele atua no tráfico, no roubo de cargas e de veículos. Assim, acaba obtendo cada vez mais recursos. Com esses recursos, obtém mais armas e acaba buscando outros territórios. Então, a criminalidade do Rio de Janeiro acaba extrapolando as divisas do Estado e hoje está no Brasil como um todo”, explicou o major Leonardo.
Facções de Rio e São Paulo atuam em Minas Gerais
Em Minas Gerais, as forças de segurança também já identificaram o envolvimentos das facções criminosas, como destaca o delegado Thiago Rocha Ferreira, responsável pela Delegacia Especializada em Investigação e Repressão ao Furto, Roubo e Desvio de Carga.
“Sim, as facções, tanto que tiveram origem no estado de São Paulo, como as que têm origem no estado do Rio de Janeiro, fomentam essa prática criminosa. Não somente na execução do crime propriamente dito, cooptando autores contumazes, que têm uma certa expertise na execução do crime de roubo, de furto propriamente dito, mas também na receptação. Então eles fomentam: ‘Olha, se você conseguir determinada carga pra mim, eu tenho interesse, eu compro’, então já é algo encomendado”, apontou o delegado.
Amanhã, no quinto capítulo da série “Os Piratas das Estradas: o mercado do roubo nas rodovias brasileiras”, a Itatiaia irá mostrar que mostrar o crime está por trás do roubo de cargas e tem envolvimento de uma parcela da sociedade brasileira: a receptação de mercadorias roubadas.