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Preço do milho despenca e alivia bolso do produtor de leite mas especialista alerta para reviravolta

Desvalorização do grão, impulsionada pela segunda safra e pelo câmbio, pressiona os preços para baixo no mercado interno

Milho é uma boa alternativa de alimentação para o gado

A queda do preço do milho nos últimos dois meses acendeu um sinal verde e trouxe alívio para o setor leiteiro do Brasil. Segundo dados monitorados pela JPA Inteligência – frente de análise de mercado da empresa mineira JPA Agro –, o valor da saca do grão recuou de R$ 89,12 em março para R$ 75,47 em meados de maio, uma redução de mais de 15% que impacta diretamente os custos de produção de leite no país.

“O preço do leite tem uma correlação muito direta com o preço do milho. Quando o milho sobe, o leite tende a subir, e quando ele cai, o custo de produção do leite também recua. Essa queda atual representa um fôlego importante, principalmente porque estamos entrando no período seco do ano, quando o produtor precisa gastar mais com ração”, analisa Marcelo Teixeira, especialista em mercado da JPA Agro e um dos fundadores da JPA Inteligência.

Milho para o gado de leite

O milho é uma boa alternativa de alimentação para o gado e pode ser servido de várias maneiras em diferentes fases da vida. No caso do gado de leite, o fubá de milho é uma das melhores formas para aumentar a produção, podendo render até 15 litros por dia.

Oferta pressiona o milho, mas exportações podem mudar o jogo

O atual momento de baixa nos preços é reflexo do início de uma colheita robusta da segunda safra brasileira — estimada entre 95 e 100 milhões de toneladas — somada à estabilidade cambial, a safra recorde norte-americana (que enfraquece a demanda externa) e a postura cautelosa dos compradores. Tudo isso tem deixado o mercado de milho com oferta interna bastante folgada, favorecendo o consumidor nacional, principalmente o produtor de leite, que depende do milho e do farelo de soja para compor a dieta animal.

Segundo Marcelo, a tendência de preços baixos deve se manter entre junho e agosto: “além do milho, o farelo de soja também está com preços historicamente baixos. E embora estejamos em período de entressafra, a torta de algodão, que é outro proteico importante na alimentação do gado leiteiro, também deve ficar barata com o avanço da safra a partir de agosto. Tudo isso ajuda a compor uma ração mais acessível e, portanto, barateia o custo final do litro de leite produzido”, comenta o especialista.

Entretanto, apesar do momento favorável, a empresa alerta para sinais de virada no comportamento de mercado caso as exportações brasileiras ganhem tração.

“O ponto de atenção agora é a exportação. A oferta está folgada, mas se os embarques brasileiros começarem a crescer rapidamente, o que pode acontecer se compradores externos buscarem milho aqui, a demanda internacional pode apertar o mercado interno e empurrar os preços para cima de novo, pois a oferta doméstica começa a se contrair”, explica Teixeira.

O alerta se baseia em dois pontos estratégicos. O primeiro deles, o comportamento dos compradores internacionais diante dos estoques globais apertados de milho. O outro, ainda pouco precificado pelo mercado, é uma resolução tarifária dos Estados Unidos, prevista para entrar em vigor em outubro de 2025.

A nova regra estabelece taxas extras para navios fabricados na China ao atracarem em portos dos EUA — o que encarece fretes e afeta principalmente os grãos, produtos de baixo valor agregado por tonelada. Sendo assim, pode influenciar diretamente a competitividade do milho brasileiro.

“A partir de outubro, qualquer navio chinês ou construído na China que atracar em portos americanos será taxado por tonelada. E milho é uma commodity barata. Essa taxa, proporcionalmente, encarece muito o produto. Como a maior parte da frota de granelheiros chineses será afetada, isso pode fazer com que países que compram dos EUA passem a buscar milho aqui no Brasil ou na Argentina. Se isso acontecer, muda o jogo e nós passamos a atrair forte demanda de fora”, destaca o especialista da JPA.

Mercado do leite

No mercado do leite, a desvalorização do milho reduziu o custo de produção em um momento estratégico: a transição para o período seco, que exige mais suplementação na alimentação animal.

De acordo com o relatório da JPA, o preço do leite pago ao produtor mineiro caiu 2,1% entre março e abril, fechando o mês em R$ 2,93/litro, mesmo com uma entressafra tecnicamente iniciada.

“Apesar da expectativa de menor oferta de leite na seca, a demanda interna e industrial ainda está fraca. Isso limita os repasses e explica a resistência dos preços em subir, mesmo com custo reduzido”, explica Teixeira.

A média dos preços spot do leite caiu 6,04% em Minas Gerais e 4,72% em São Paulo entre março e abril. Ainda assim, Minas acumula alta de 12,41% em relação a abril de 2024. Na correlação entre os preços futuros do milho - segundo o indicador Cepea/ESALQ - e o valor pago ao produtor, a trajetória descendente do grão coincide com a desaceleração dos preços do leite, um padrão histórico que se repete agora.

“Para o produtor de leite, o momento é ideal para controlar estoques e pensar em compras inteligentes de insumos, especialmente milho e farelo de soja. No caso do farelo de soja, seria bom fazer um estoque pequeno, que aguente as turbulências momentâneas no curto prazo. Já no caso do milho, a dica é mesmo comprar de acordo com a necessidade, sem estocar muito, e ficar bem atento. Volume de exportações, tarifas internacionais e os próximos passos da demanda global vão definir se esse milho barato permanece ou se o cenário vira. O mercado está muito sensível a essas variáveis”, conclui.

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Formada em jornalismo pelo Centro Universitário de Belo Horizonte (UniBH), Giullia Gurgel é repórter multimídia da Itatiaia. Atualmente escreve para as editorias de cidades, agro e saúde