Pesquisadores descobriram que usar a bicicleta como meio de transporte está associado a um risco menor de desenvolver demência e a um hipocampo maior (região cerebral fundamental para memória e aprendizado). A conclusão é de um estudo publicado na revista científica JAMA Network Open, que analisou dados de quase meio milhão de pessoas cadastradas no UK Biobank, banco de dados da Inglaterra.
O acompanhamento dos participantes durou mais de 13 anos. Entre aqueles que relataram deslocamentos ativos envolvendo ciclismo, sozinho ou combinado a outros meios, o risco de desenvolver diferentes formas de demência foi de 17% a 40% menor. O efeito foi mais pronunciado em pessoas sem o alelo APOE ε4, variante genética associada a maior risco da doença.
Resultados principais
Comparado ao uso de transporte não ativo, o ciclismo ou deslocamento misto apresentou:
- 19% menos risco de demência de qualquer causa (HR 0,81; IC95% 0,73–0,91);
- 22% menos risco de Alzheimer (HR 0,78; IC95% 0,66–0,92);
- 40% menos risco de demência de início jovem (antes dos 65 anos);
- 17% menos risco de demência tardia (após os 65 anos).
Os autores destacam que “promover modos ativos de deslocamento, especialmente o ciclismo, pode estar associado a melhor saúde cerebral e menor risco de demência”.
Estima-se que o número de pessoas com demência no mundo salte de 55 milhões, em 2019, para 139 milhões até 2050. Medidas simples de atividade física, como deslocamento ativo, podem integrar estratégias de prevenção, sobretudo na meia-idade, quando é mais fácil modificar fatores de risco.
Caminhada x pedal
O estudo não encontrou efeito protetor significativo da caminhada isolada em casos de Alzheimer. Já a caminhada combinada a outros meios mostrou redução modesta do risco. Os pesquisadores levantam a hipótese de que a prática do ciclismo envolva maior demanda cognitiva, como navegação espacial e atenção ao trajeto, além da intensidade física.
Há um mínimo necessário para obter benefícios?
O estudo não define um limiar mínimo de prática. A exposição foi medida por meio de uma pergunta única sobre o principal meio de transporte utilizado nas últimas quatro semanas (excluindo trajetos casa-trabalho), sem contabilizar frequência, duração ou distância percorrida.
Metodologia e limitações
Trata-se de um estudo observacional de coorte, com 479.723 adultos (média de idade de 56,5 anos). Entre seus pontos fortes estão o tamanho da amostra e o longo período de acompanhamento. Entre as limitações, destacam-se a coleta de dados auto-relatados, medida única do modo de deslocamento e baixa diversidade racial/étnica da amostra, o que pode comprometer a generalização dos resultados. Além disso, o número reduzido de casos de demência precoce limita o poder estatístico para esse tipo de análise.
Incertezas
Ainda não é possível afirmar com certeza que incentivar o uso da bicicleta no dia a dia reduz casos de demência. São necessários estudos mais longos, com medições repetidas, intervenções específicas e amostras mais diversas para confirmar a relação e identificar a quantidade mínima de prática necessária. Também é preciso compreender se os benefícios se devem ao exercício físico, ao estímulo cognitivo do pedal ou a outros fatores ligados ao estilo de vida e ao ambiente.
Apesar das limitações, o estudo evidencia uma associação consistente: pessoas que pedalam regularmente apresentaram menor risco de desenvolver demência, reforçando a relevância de políticas públicas e hábitos individuais que incentivem o deslocamento ativo.
O trabalho foi conduzido por pesquisadores da Huazhong University of Science and Technology, na China, e publicado em 9 de junho de 2025 na JAMA Network Open.