Moradores de doze comunidades de Belo Horizonte lutam contra ações de reintegração de posse solicitadas pela Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) em áreas onde há casas e torres de transmissão da empresa na capital mineira. O caso se arrasta na Justiça desde 2015.
Entre as comunidades que podem ser impactadas pelas ações da estatal estão o Morro do Papagaio, a Vila Pinho, a Vila Ecológica e a Vila Independência. Na lista estão, também, os bairros Jardim Liberdade e Montes Claros, bem como o Conjunto Paulo Sexto, o Morro das Pedras, a Vila Cemig e o Alto das Antenas. O tema foi debatido nessa quarta-feira (7) na Assembleia Legislativa, durante audiência da Comissão de Direitos Humanos.
A líder do movimento, Maristela Paloma, moradora do Morro do Papagaio, afirma que a Cemig está processando famílias que moram nestas áreas e entrando com ações para que elas sejam retiradas das casas.
“O poder público estava ciente de que essas casas estavam sendo construídas. Essas famílias moram ali há 20 ou 30 anos — e o Morro do Papagaio é uma comunidade centenária. A gente vem lutando pelo direito à moradia”, diz. “Se, realmente, é uma área de risco e tem de tirar, que reassentem as famílias, ou no mínimo, as indenizem. Colocar na rua, como querem fazer, não vamos aceitar,” garante.
O taxista Renan Lopes também é do Morro do Papagaio. A casa dele está em uma área que Cemig está solicitando reintegração de posse. Ele já virou réu em um processo e foi notificado pela Justiça para deixar a casa onde mora. À Itatiaia, Renan conta que, por causa do crescimento do número de integrantes de sua família, precisou crescer a residência.
“Da notificação, montaram um processo pedindo para demolir minha casa. Eu, sem entender nada, parei a construção”, lamenta ele, afirmando que não tem para onde ir em caso de desapropriação.
‘Não quero que meus filhos sejam moradores de rua’
Mãe solo de três crianças, a auxiliar de cozinha Franciele Matos, moradora no conjunto Paulo VI há quase 30 anos, também foi acionada na justiça.
“A gente não invade porque quer, mas porque é o que temos para oferecer. Não quero que meus filhos entrem para a estatística dos moradores de rua. Onde eu moro, quem cuida é a gente, pois a Cemig não vai lá”, protesta.
A estudante Nataly Ribeiro e a avó moram no bairro Jardim Liberdade. Ela conta que a Cemig está entrando com ordens de despejo individuais. A família da jovem já recebeu uma ordem de despejo. Segundo ela, não houve a possibilidade de recorrer.
“A Cemig está indo nas casas de forma individual e tirando fotos sem que as pessoas saibam. Muitas vezes, os moradores saem para trabalhar e não conseguem saber (das visitas). E, aí, a intimação e a ordem de despejo chegam”, denuncia.
Presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia, a deputada estadual Andréia de Jesus, do PT, aponta relação entre os casos e a ausência de políticas públicas de oferta de moradias.
“A gente espera que o governo do estado apresente alternativas (às populações afetadas). As famílias cresceram e estão construindo uma casa em cima da outra. E a Cemig faz pressão para retirá-las”, avalia.
O que a Cemig diz?
Procurada pela Itatiaia, a Cemig informou que, desde 2008, fiscaliza ocupações irregulares próximas as linhas transmissão da empresa e notifica as famílias sobre que as construções são irregulares e perigosas.
A empresa afirma que essas irregularidades têm alto risco de acidentes elétricos, que podem causar ferimentos gravíssimos e até mesmo fatalidades.
A companhia ressalta que não move ações de desapropriação, e sim de reintegração de posse, já que se trata de faixas de servidão sob as linhas de transmissão, locais que não podem ser comercializados entre terceiros e com proibição para construção de edificações.
Por fim, a energética informa que as ações de reintegração de posse são sempre individuais e acionadas caso a caso, na medida em que essas situações de irregularidade são identificadas durante as ações de fiscalização.
A companhia diz que está disponível para buscar soluções em conjunto com o poder público municipal.