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Saberes do Rosário conquistam o título de Patrimônio Cultural do Brasil

Grupos de congados, moçambiques e reinados recebem reconhecimento nacional

Em um momento histórico para a cultura afro-brasileira, os Saberes do Rosário — entre eles os Reinados, Congados, Congadas e Moçambiques — foram oficialmente inscritos como Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil. A homenagem foi formalizada neste domingo durante o Festejo do Tambor Mineiro, realizado no Parque Municipal Américo Renné Giannetti, integrando a programação da Virada Cultural de Belo Horizonte. A cerimônia contou com a presença da ministra dos Direitos Humanos e da Cidadania, Macaé Evaristo, que entregou o certificado emitido pelo IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional).

A aprovação já havia sido votada com unanimidade pelo Conselho Consultivo do IPHAN em 17 de junho, após quase duas décadas de esforços técnicos, de pesquisa e de mobilização junto às comunidades detentoras (especialmente em Minas Gerais, Goiás e São Paulo).

Tradição viva e ancestralidade preservada

Essas expressões culturais envolvem ritos religiosos, coroações, danças, cortejos, rezas e cantos — práticas transmitidas por gerações e profundamente ligadas à devoção ao Rosário e à religiosidade afro-brasileira. A amplitude territorial é impressionante: em Minas Gerais, estão ativos mais de 1.100 grupos em cerca de 330 municípios, revelando a força e vitalidade dessas manifestações.

Discursos que ecoam ancestralidade e futuro

Leandro Grass, presidente do IPHAN, celebrou o reconhecimento como um gesto de reparação histórica, ressaltando que, após 17 anos de espera, “teremos o registro desse bem… que representa nossa ancestralidade africana”. A conselheira e historiadora Alessandra Ribeiro Martins, que acompanhou o processo, destacou o papel das tradições como formas de resistência cultural e criação de identidades fortes.

Para o secretário Leônidas Oliveira, este registro é um tributo à beleza, humanidade e história do povo negro mineiro e brasileiro. A Rainha Conga de Minas Gerais, Isabel Casimira Gasparino, um dos nomes que colaboraram com o dossiê, afirmou que a outorga é um reconhecimento não só para eles, mas para os antepassados e futuras gerações.

Celebração e fortalecimento

No Festejo do Tambor Mineiro, além do momento oficializado com o IPHAN, várias guardas culturais desfilaram como parte das homenagens. Entre os grupos representados estiveram guardas tradicionais de Belo Horizonte, Contagem, Oliveira, Timóteo, Pedro Leopoldo e Ouro Preto — totalizando 15 irmandades.

A ministra Macaé Evaristo aproveitou para defender que, reconhecido o valor cultural, é indispensável que o Estado avance no apoio financeiro. “Reconhecer as guardas de congado e reinado no livro do patrimônio imaterial é fundamental. Mas precisamos também investir para que essas tradições se fortaleçam”, declarou, reforçando que cultura é também economia criativa para comunidades rurais e tradicionais.

Para o capitão e diretor de Igualdade Racial de Ouro Preto, Kedison Guimarães, a outorga “valoriza cada vez mais nossos congados, moçambiques e reinados”, e representa “o fruto de muito trabalho do IPHAN junto aos grupos”, impulsionando a formulação de políticas públicas de salvaguarda.

Um marco para a cultura brasileira

Com esse reconhecimento, o Estado assume o dever de proteger essas expressões, que já constavam como patrimônio cultural imaterial de Ouro Preto desde 2019 (no caso da Festa do Reinado de Nossa Senhora do Rosário, Santa Efigênia e São Benedito).

Laura Gorino é graduanda em Jornalismo na UFOP e atua como Assistente de Comunicação na rádio Itatiaia Ouro Preto. Ela trabalha na cobertura de pautas de diversos nichos, com um interesse especial em jornalismo cultural.