Há cerca de dois meses, estive em um evento sobre negócios de impacto e quem me acompanha nessa coluna sabe o quanto eu adoro contar por aqui histórias sobre pessoas, projetos e iniciativas que acho diferenciadas. Nesse dia assisti a palestra da empreendedora e dentista, Dra. Priscilla Barbosa, falando sobre seu projeto “Odonto Por Toda Parte”, que tem como objetivo atender e cuidar da saúde bucal de pessoas mais vulneráveis.
Priscilla abordou o fato de que a saúde bucal vai muito além de um sorriso bonito; ela é um pilar fundamental para o bem-estar geral de uma pessoa. Infelizmente, a má saúde bucal é um problema comum que acarreta uma série de prejuízos significativos, tanto físicos quanto psicossociais, impactando a qualidade de vida e a saúde sistêmica.
Quando a higiene bucal é negligenciada, o acúmulo de bactérias na boca pode levar a problemas como cáries, gengivite e periodontite. Essas condições, se não tratadas, podem causar dor intensa, dificuldade para mastigar e falar, e até mesmo a perda de dentes. Mas os impactos não se limitam à boca. As bactérias presentes em infecções bucais podem entrar na corrente sanguínea e se espalhar para outras partes do corpo, contribuindo para o desenvolvimento ou agravamento de doenças graves como problemas cardíacos, derrames, diabetes descompensada e complicações na gravidez. Em crianças, a má saúde bucal pode afetar o aprendizado e o desenvolvimento, devido à dor e à dificuldade de concentração.
Além dos problemas físicos, a má saúde bucal também tem um forte impacto psicossocial. Dentes danificados ou perdidos, mau hálito e dor crônica podem gerar baixa autoestima, ansiedade e isolamento social. A vergonha de sorrir ou de interagir pode afetar as relações pessoais e profissionais, limitando oportunidades e diminuindo a qualidade de vida.
É nesse cenário que projetos sociais de incentivo ao cuidado odontológico como o da Priscilla surgem como ferramentas transformadoras. Eles desempenham um papel crucial ao levar acesso e informação sobre saúde bucal a populações que, de outra forma, teriam grande dificuldade em obtê-los. Por isso, escutar a Priscilla falar sobre sua iniciativa, uma clínica itinerante e com preços acessíveis, me trouxe tanta alegria!
“Num Brasil onde as estatísticas de saúde bucal ainda escancaram desigualdades históricas e onde a dor de dente é a segunda maior causa de evasão escolar, criei um projeto que visa reescrever o acesso ao cuidado com a boca, com o rosto e com a dignidade. Com mais de 25 anos de experiência em clínica e social, o Instituto Odonto por Toda Parte já atendeu centenas de pessoas em situação de vulnerabilidade social em escolas públicas, Instituição de Longa Permanência para Idosos (ILPIs) e hospitais, sem cadeira fixa, nem paredes, mas com acolhimento, técnica e impacto real”, diz a Dra. Priscilla.
Para mim, o mais interessante é pensar em uma odontologia itinerante, portátil e com alma. Em campo com consultórios 100% portáteis, o Instituto desenvolveu dois projetos estruturantes que conectam saúde, arte, educação e inclusão produtiva.
1. Arte do Sorriso – a estética que denuncia e reintegra
Muito além do esmalte ou da gengiva, o Arte do Sorriso é uma proposta potente de saúde bucal como direito humano e autoimagem cidadã. A cada edição, moradores de territórios vulneráveis passam por triagens, profilaxias, restaurações simples e ações de autocuidado, tudo documentado por imagens que contam histórias de coragem e reconstrução emocional.
Sorrisos antes e depois viram exposições fotográficas itinerantes, que ocupam escolas, centros culturais e redes sociais com mensagens de empoderamento coletivo. O projeto vem ganhando corpo como uma metodologia de denúncia visual da invisibilidade social.
2. ‘Odonto por Toda Parte’ – Formação, clínica e cidadania em movimento
Imagine jovens de locais de vulnerabilidade social que se tornam auxiliares ou técnicos em saúde bucal (ASB/TSB) após participarem de ações clínicas em suas próprias comunidades. Agora junte isso com rodas de conversa, oficinas, cuidado clínico e geração de renda.
No Brasil, os fatores socioeconômicos influenciam diretamente a saúde bucal, acentuando desigualdades. Por exemplo, crianças pardas apresentam maior prevalência de cáries (58,9%) do que brancas (29,1%). A renda familiar baixa pode ser um fator indireto para a susceptibilidade à cárie. Indivíduos que vivenciaram pobreza em vários momentos da vida apresentam um risco significativamente maior de perda de dentes do que pessoas mais afortunadas.
Projetos como os da Dra. Priscilla trazem uma luz para que empresas possam cuidar melhor dos seus funcionários de baixa renda e que políticas públicas tornem o acesso aos cuidados bucais mais efetivo para a população carente.
Porque a saúde começa pela boca, mas a transformação começa pelo olhar. Esses projetos não apenas tratam dentes, eles tratam a invisibilidade. E num país onde mais de 11 milhões de pessoas vivem em vulnerabilidade social, iniciativas como essas não são luxo, são infraestrutura emocional, educativa e de bem viver.