Ele não se chamava Luca até poucos anos atrás. Era uma menina de uma família tradicional, herdeira de um considerável patrimônio. Ela escolheu mudar seu destino.
Aquela criança meiga chegou em casa um dia e ditou novas regras aos seus pais:
- Agora terei um novo nome, não sou mais menina, me sinto como menino e, por favor, me chamem de Luca.
Se o caminho era aparentemente fácil para aquela criança, ela escolheu um bem mais difícil. A crise começou em casa, com os pais, em meio aos seus problemas, tendo dificuldade para compreender o que estava acontecendo com a filha. No mesmo lar das primeiras crises, vieram também os primeiros sinais de afeto. Os pais ora se questionavam, ora se culpavam mas compreenderam que o melhor para todos, naquele momento, era acatar a vontade do pré-adolescente. Luca foi aceito em casa tal como queria que fosse reconhecido pelo mundo.
O mundo de um pré-adolescente não é muito amplo. Tem a escola, alguns amigos e a família para além da casa onde vive. E assim continuaram os desafios e a necessidade de afirmação de Luca.
Matriculado em uma escola tradicional de Belo Horizonte, Luca teve que enfrentar a dificuldade de usar o banheiro. Não se reconhecia como menina para usar o banheiro feminino e não ficava à vontade no banheiro masculino. Acabou por usar o banheiro de funcionários, onde podia ficar em paz. Luca ensinou à escola que era necessário compreender que a sua vontade deveria ser respeitada e que a instituição precisava se adaptar às novas realidades.
Paz não é uma palavra tão presente ao escolher o caminho que Luca quis. Em família, também teve muito confronto. Tios, primos e avós não aceitavam naturalmente as mudanças que Luca queria para si. Os primeiros natais eram de questionamento e isolamento, depois veio um tempo de aproximação com quase todos daquela família tradicional. Ao voltar a conviver com o parente que estava se desgarrando, passaram a ver nele as qualidades de perseverança e autonomia que foram fundamentais para estruturar tão bem uma empresa familiar de sucesso. Luca foi conquistando, de novo, quase todos da família.
Passado algum tempo, Luca tem seu espaço em casa, na escola, com os amigos e com a família. Todos esses lugares antes dele eram fechados e, mais do que isso, viam com preconceito escolha iguais à que ele fez.
Luca vem para mostrar que o indivíduo tem que ser amado e que suas escolhas precisam ser respeitadas, afinal, ele veio ao mundo para romper barreiras. Veio para mostrar que pode ter escolhas, veio para mostrar que o amor supera o preconceito. Luca veio ao mundo por escolha de quem, por ser diferente, quis fazer diferente e vai construindo uma nova história para si e para aqueles que têm o privilégio de conviver com ele. Luca veio para mudar o mundo.