É importante colocar as dúvidas em primeiro lugar. Isso mesmo... Costumamos temer a suspeita, como se ela fosse algo ruim ou criminoso. Mas é muito importante duvidar. Ainda mais nestes tempos que são os nossos, nos quais a internet forma juízes prematuros, é preciso recuperar a lucidez que consiste em: saber que não se sabe (aludindo a Sócrates) e a dúvida como método (pensando em Descartes).
Ajuda muito duvidar de si! Há gente que confunde os próprios sentimentos, emoções, sensações com a realidade. Não! As coisas, geralmente, não são exatamente como suspeitamos que sejam num primeiro momento...
Adultos sabem que é preciso sempre confiar nos próprios afetos - a razão é um tipo de afeto! -, mas sabem também que é muita burrice agir por eles! Em termos práticos: as vezes até o ódio é um amor invertido. Se a simples presença de alguém nos angústia, não é que essa pessoa seja “ruim”! Pode ser até que não, pode ser que sim... Se, afinal, como o filósofo Pabllo Vittar ensina, “P* também ama”, faz bem pensar que, aquilo que nos ofende “naquela” pessoa, pode ter muito mais a ver conosco do que com ela.
Sentimentos colocados sob suspeita ajudam a perceber que a gente mente, especialmente para nós mesmos; que ninguém é a exata soma do que se vê; que ajuda muito - sobretudo quanto estamos bravos - a: acreditar em metade do que se vê e em nada do que ouve (Allan Poe).
Somos feitos, todos nós de meias verdades... Compreender isso deixa a vida mais leve. É menos ansiogênico se saber duvidoso. Poderíamos dizer que: só os loucos têm sempre certeza. No falatório das redes sociais, em que as afirmações profanam, é muito importante fazer da suspeita e da escuta um “sacrifício”, um “sacro” (sagrado) “ofício” (ofício), um fazer sagrado.
É ato reverente e sagrado suspeitar... É bom não se esquecer disso! Tanto é verdade que no Sermão da Montanha, Jesus disse, que com a mesma medida com que medimos, nós seremos medidos (MT 7, 1-2). É preciso estar atento, pois se o nosso julgamento, a nossa interpretação, a nossa medida estiver muito justa, muito calçada, muito sacudida, há pouco espaço para caber nossos próprios equívocos.
Não se trata, é claro aqui, de ser conivente com o erro! Muito pelo contrário, a vida exige e responsabiliza. A questão é não se colocar o peso de ser juiz dos outros e da história. Quem assume este lugar pode jogar muita gente boa, em processo, fora! Quem age assim está à mercê de querer o “lugar” de Deus. Bom, vale lembrar que até Deus, que tudo conhece, não costuma ser muito apressado em julgamento, mas indulgente, favorável, cheio de misericórdia Sl 102(103).