‘O orelhão foi a ponte que me fez reencontrar com o meu pai’. A frase da catadora de recicláveis Jaqueline Mota dos Santos, 36 anos, retrata bem a importância dos orelhões para milhares de brasileiros.
Moradora de Belo Horizonte, Jaqueline é natural da Bahia e tinha 14 anos quando usou o telefone público pela última vez.
Com a ajuda do Conselho Tutelar, conseguiu o número do pai e correu até um aparelho em Jiquié, Sudoeste da Bahia, para ligar. Do outro lado da linha, descobriu que ele vivia na capital mineira. A conversa, feita às pressas com um cartão de 20 unidades, marcou a mudança definitiva de sua vida.
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“Na primeira vez perguntei como ele estava, por que tinha vindo para cá e como tinha chegado aqui”, relembra.
Depois da ligação, Jaqueline embarcou para Belo Horizonte, onde reencontrou o pai e os irmãos — e onde permanece até hoje.
Na semana passada, em frente à carcaça de um orelhão no Centro de Saúde Vila Leonina, na Praça do Ensino, no bairro Alpes, Região Oeste da capital mineira, ela disse que não tem celular e que, sem orelhões funcionando na cidade, precisa da ajuda de parentes para se comumicar com familiares.
“Minha mãe mora lá em Salvador, na Bahia. Aí a gente conversa pelo WhatsApp”, contou, ressaltando que a troca de mensagens ocorre por meio dos aparelhos da filha ou do marido.
Orelhões pelo Brasil
Levantamento da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), feito a pedido da Itatiaia, mostra que o número de orelhões no Brasil caiu de 1,1 milhão, em 2007, para apenas 39,2 mil atualmente.
Mudança
A Oi promoveu, junto à Anatel, a mudança das concessões de telefonia fixa para autorizações do mesmo serviço, conforme previsto na Resolução nº 741/2021. Com isso, a empresa não é mais obrigada a oferecer o telefone fixo em regime público, exceto nos locais que ainda não contam com outro serviço de voz substituto, conforme acordo firmado.
Minas Gerais tem, atualmente, 837 orelhões cadastrados, segundo a Anatel — 534 em funcionamento e 303 em manutenção.
Já a Bahia aparece com 1.669 aparelhos, sendo 1.138 ativos e 531 em manutenção, ocupando a segunda posição no país em número de telefones públicos, atrás apenas de São Paulo.
Sem linha
A capital mineira, que chegou a ter 15.186 terminais em 2007, já não conta mais com nenhum telefone público. O último foi desativado em março de 2025. Em 2017, esse número já havia caído para 9.816.
Sem celular, Jaqueline é um exemplo de como o orelhão ainda faz falta nos dias de hoje. “As pessoas acham que todo mundo tem celular, mas não é assim. Eu estou sem celular, muita gente também não tem. O orelhão ajudava bastante. Se voltasse, ajudaria muito”, concluiu.