BH 128 anos: capital se divide em bairros ‘quase sem crimes’ e avanço de facções

Órgãos de segurança apontam principais desafios e revelam planejamento para aumento da segurança em Belo Horizonte

Traficantes do Comando Vermelho (CV) cobrem pichação feita por união de grupos criminosos rivais no Conjunto Santa Maria, Região Centro-Sul de Belo Horizonte

A segurança pública ocupa a posição mais alta na lista de preocupações do brasileiro, segundo pesquisa da Genial/Quaest que apontou uma considerável subida no ranking de importância do assunto para a população do país, saindo de 30% e indo para 38% entre outubro e novembro. E quando se trata de grandes cidades, o contexto se mostra desafiador.

Ultrapassando a marca de 2,4 milhões de habitantes, divididos em 487 bairros organizados em nove regionais administrativas, Belo Horizonte é uma cidade de grandes proporções e contextos diversos. Isso faz com que os órgãos de segurança precisem adotar abordagens específicas.

Bacurau: o bairro da paz

O pequeno bairro Bacurau é um exemplo importante de como a cidade apresenta realidades distintas. A Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG) informou que foram registradas apenas três ocorrências no local durante o ano, com os dados contabilizados até 23 de novembro.

Nos anos anteriores, o número de registros foi maior: seis ocorrências em 2024 e dez em 2023. Porém, não há uma natureza criminal predominante na região, já que os registros se distribuem de forma estatística entre diferentes tipos de crimes. Em 2025, as ocorrências registradas no local se dividiram em furto, estelionato e lesão corporal.

Porém, o tamanho do Bacurau explica muita coisa, sendo ele um dos menores da capital mineira e o menor da Região Norte de BH, ocupando um quarteirão onde vivem apenas 64 moradores (IBGE, 2022) e apenas 0,004 km².

“As estratégias de policiamento adotadas pela PMMG são planejadas por setores, o que naturalmente inclui o atendimento ao bairro Bacurau, sempre que surgem necessidades específicas, a PMMG realiza o atendimento normalmente, garantindo presença e resposta efetiva à comunidade”, apontou a PM.

Rua Bacurau, no bairro Bacurau, Região Norte de Belo Horizonte

Guerra de facções se intensifica em BH

Se em algumas localidades de BH há maior sensação de segurança, em outras a realidade é o avanço de facções criminosas, que já dominam grandes bairros e aglomerados, inclusive formando alianças.

Em outubro, as facções Primeiro Comando da Capital (PCC), Terceiro Comando Puro (TCP), Família Anjo Rebelde (Família A-R) e Tropa do Douglas ou Tropa da Doideira (TDD), anunciaram união. Posteriormente, o PCC absorveu a TDD.

A coligação visa a expansão do poder dos grupos pela cidade e isso resulta em embate com outra organização criminosa, o Comando Vermelho (CV), rival nacional do PCC e estadual do TCP. Itatiaia trouxe detalhes exclusivos sobre a situação.

Comunicado divulgado por PCC, TCP, Família A-R e TDD anunciando a união das facções em Minas Gerais

A atuação das facções em BH tem resultado em confrontos armados. Em novembro, um intenso tiroteio rasgou a madrugada no Morro das Pedras, aglomerado dominado pelo CV, na Região Oeste da capital mineira, em ataque de membros do TCP.

Mais recentemente, no dia 4 de dezembro, um ataque do CV que teria como alvos membros do TCP que participavam de um churrasco no bairro Flávio Marques Lisboa, na Região do Barreiro, deixou dois mortos e nove feridos.

BH tem que lidar, ainda, com grupos criminosos locais que não possuem união com as grandes facções que atuam em território nacional, denominadas “gangues” ou “bondes”.

Mateus Simões (PSD), vice-governador de Minas Gerais, reforçou a realização de operações policiais nos aglomerados com presença de facções.

“Nós temos, em alguns aglomerados, a presença de facções tentando estabelecer o domínio de território. Isso nos tem levado a fazer operações para garantir que as comunidades tenham tranquilidade para continuarem vivendo suas vidas”.

Responsável por órgãos policiais, como as polícias Militar e Civil, o estado entende que BH vive um cenário complexo e, por isso, tem adotado, na capital mineira, a postura do policiamento comunitário, onde os policiais atuam sempre nas mesmas regiões, visando conhecer mais as áreas, as pessoas e assim realizarem melhor monitoramento.

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Moradores vivem sob terror

Uma moradora do Aglomerado do Buraco Quente, na Região Noroeste de Belo Horizonte, revelou à Itatiaia que foi obrigada a deixar a própria casa após sofrer represálias de traficantes e ter a residência atacada a tiros no dia 13 de novembro.

Em depoimento à Polícia Militar (PM), a mulher contou que o atentado pode ter sido uma retaliação à prisão do sobrinho, detido durante um confronto entre facções na Vila Senhor dos Passos, próxima à Pedreira Prado Lopes, também na mesma região.

Segundo a corporação, o sobrinho da moradora foi preso com uma pistola, na garupa de uma moto. Desde então, comparsas de um traficante morto durante a ação policial passaram a ameaçar a família.

Os caminhos da segurança

Márcio Lobato, Secretário Municipal de Segurança e Prevenção da Prefeitura de Belo Horizonte, conversou com a Itatiaia sobre os desafios e planos da Guarda Civil Municipal de Belo Horizonte (GCM), órgão que exerce o policiamento comunitário preventivo no município.

Segundo ele, o grande desafio para a GCM é trazer sensação de segurança para todas as regionais de BH, tendo como exemplo o trabalho realizado em áreas turísticas da cidade, como a Feira Hippie, a orla da Lagoa da Pampulha, a Praça da Liberdade e o Mercado Central, considerados cases de sucesso.

A Guarda Civil Municipal de Belo Horizonte vê o Muralha BH como grande trunfo da segurança pública em BH

Reforçando a importância da fiscalização como meio para coibir crimes, Lobato revelou planos de expandir pela cidade o que vem sendo feito na Região de Venda Nova.

“Em Venda Nova, temos equipes de bicicleta, equipes a pé, circulando, sobretudo em regiões próximas a comércios. Aquilo gerou uma diminuição enorme do índice de furtos e roubos naquela região, então a gente já está pensando em expandir esse modelo. O Barreiro talvez seja um dos próximos a ser contemplados.

Outro projeto que a gente pretende implantar no próximo ano é o SIAC, que é o Serviço Itinerante nas Áreas Comerciais, que é uma van da GCM, que estará acompanhada de bicicletas e também motocicletas para uma atuação itinerante, principalmente nas áreas comerciais, onde tem um fluxo maior de pessoas”, explicou.

Muralha BH

Para além da atuação constante da Guarda Municipal e suas estratégias, Lobato demonstrou expectativa pela implementação do “Muralha BH”, um sistema integrado de segurança que vai contar com 12 mil câmeras inteligentes capazes de realizar a identificação facial de criminosos e infratores em espaços públicos, além de monitorar a passagem de veículos furtados, roubados e clonados. O sistema deve ser implantado totalmente até dezembro de 2026.

Prefeito de Belo Horizonte, Álvaro Damião, durante anúncio do projeto ‘Muralha BH’

As áreas mapeadas devem englobar por toda a cidade com a criação da Rede de Vigilância Inteligente, que terá câmeras instaladas em praças, parques, centros de saúde municipais, escolas municipais, principais vias, além de entradas e saídas dos corredores da cidade.

“São câmeras de diversas espécies, com diversas capacidades, de reconhecimento facial, leitura de placas, monitoramento de ambientes urbanos, tudo isso vinculado a uma nova estruturação, uma nova forma de trabalho, novos softwares, inteligência artificial. No nosso Centro de Operações, uma nova política de atuação.

A gente quer gerar essa sensação de segurança, e que o belo-horizontino possa viver na cidade como viveu anos atrás. Quando eu cheguei em Belo Horizonte era uma cidade muito mais tranquila do que hoje”, completou o secretário.

Maic Costa é jornalista, formado pela UFOP em 2019 e um filho do interior de Minas Gerais. Atuou em diversos veículos, especialmente nas editorias de cidades e esportes, mas com trabalhos também em política, alimentação, cultura e entretenimento. Agraciado com o Prêmio Amagis de Jornalismo, em 2022. Atualmente é repórter de cidades na Itatiaia.

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