As habitações populares no
Em Manaus (AM), o principal problema será a frequência do calor: até 88% das horas dentro de casa poderão ocorrer em condições de emergência térmica até 2080. Já em Florianópolis (SC), o risco está na intensidade das ondas de calor, que podem se tornar três vezes mais severas do que hoje.
A temperatura média anual dentro das residências deve subir 2,45 °C até 2050 e 4,8 °C até 2080, enquanto a umidade relativa do ar pode cair até 11,2% em comparação às médias históricas.
Os dados fazem parte de uma pesquisa de arquitetura e urbanismo com participação da USP, publicada no Journal of Building Engineering. O estudo usou projeções climáticas do
O professor Alberto Hernandez Neto, da Escola Politécnica da USP, explica que medidas pontuais, como sombreamento de janelas e isolamento de telhados, ajudam, mas não eliminam o desconforto térmico.
“Nestas condições, os moradores teriam que recorrer a climatizações mecânicas, como ar-condicionado, cujo custo dificilmente seria acessível às famílias de baixa renda”, afirma.
A pesquisa foi desenvolvida pela arquiteta Emeli Lalesca Aparecida da Guarda, que analisou como o aquecimento global afetará as condições internas das habitações sociais. Ela relata que seu interesse pelo tema surgiu da convivência com comunidades de baixa renda e das dificuldades enfrentadas por famílias em climas extremos.
As cidades de Manaus e Florianópolis foram escolhidas por representarem realidades climáticas opostas. “A pesquisa conseguiu avaliar como diferentes condições climáticas afetariam o conforto térmico das habitações populares frente ao aquecimento global, um retrato que pode ser expandido para outras regiões do País”, explica Hernandez Neto.
Os resultados indicam aumento significativo da temperatura e redução da umidade nas duas cidades. Em Manaus, onde a média anual é de 26,8 °C, a previsão é de elevação de 2,45 °C até 2050 e 4,81 °C até 2080. Em Florianópolis, com média de 20,75 °C, o aumento será semelhante.
Em Manaus, outubro deve se tornar o mês mais quente, com média de 37,3 °C e umidade em torno de 43,7%. Em Florianópolis, as temperaturas podem chegar a 28,2 °C, com umidade de 40,4%.
Para Emeli, os dados mostram que o superaquecimento das habitações populares pode agravar desigualdades sociais.
“O calor extremo compromete a saúde, o bem-estar e até a produtividade, e afeta justamente quem tem menos acesso a climatização artificial”, destaca.
Entre as soluções sugeridas estão estratégias de conforto térmico passivo, como ventilação cruzada, sombreamento com vegetação, isolamento térmico de telhados e orientação correta das edificações em relação ao sol e aos ventos.
A arquiteta defende ainda que as políticas habitacionais brasileiras sejam atualizadas para considerar o aquecimento global, incluindo novas normas técnicas, requisitos de desempenho térmico e subsídios para reformas em habitações de interesse social.
O estudo também alerta para a pobreza energética, que deixa famílias de baixa renda vulneráveis por não conseguirem arcar com os custos de refrigeração. A proposta é integrar habitação, energia e urbanismo para garantir conforto térmico e reduzir desigualdades.
Segundo o IPCC, as mudanças climáticas ampliam os riscos à saúde humana, especialmente entre crianças, idosos e populações vulneráveis. As ondas de calor intensas estão entre os efeitos mais graves, como as que causaram 71 mil mortes no verão europeu de 2003.
(Sob supervisão de Aline Campolina)