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Trigo forrageiro mostra maior tolerância às geadas no Sul do país

Pesquisa da Embrapa destaca vantagens do trigo frente à aveia no inverno

A oferta de forragens para a produção pecuária no Sul foi afetada pelas geadas que atingiram o estado entre os meses de junho e julho. No campo, as pastagens de trigo têm mostrado melhor tolerância às geadas. Na região, a base forrageira no inverno está concentrada em aveia, trigo e azevém na maioria das propriedades rurais dedicadas à produção bovina.

De acordo com o pesquisador Renato Serena Fontaneli, da Embrapa Trigo, a cultura de inverno mais sensível à geada é a aveia preta, seguida da cevada e da aveia branca. “A geada costuma afetar a aveia, causando o crestamento das plantas. Quando a geada é seguida de dias ensolarados, a planta pode se recuperar entre quatro a sete dias, mas o crescimento é mais lento, devido às baixas temperaturas e dias curtos, até a plena oferta de forragem de aveia”, explica Fontaneli. “Por outro lado, o azevém, muitas vezes semeado junto com a aveia em março/abril, vai produzir forragem somente no final do inverno”.

A recomendação do pesquisador é investir no planejamento forrageiro com uma boa diversificação de espécies: “O produtor das regiões frias do Sul do País tem muitas opções de forrageiras no inverno, desde o campo nativo, melhorado com espécies anuais e perenes de inverno, incluindo entre elas a festuca e as leguminosas como as ervilhacas, os trevos e o cornichão”.

Enfatizando o planejamento anual de pastagens, o pesquisador explica que a rotação de culturas deve incluir as forrageiras anuais, com gramíneas e leguminosas, com as tradicionais aveia preta e azevém, e os cereais de inverno como o trigo, aveia branca, centeio, triticale e cevada que podem ser pastejados, conservados como silagem, pré-secados e feno.

Trigo como forragem animal

A Embrapa desenvolve cultivares de trigo forrageiro desde a década de 1980. A base do programa de melhoramento foi o cruzamento de trigos de primavera e trigos de inverno, com desenvolvimento vegetativo mais longo em plantas que podem ficar meses cobertas por neve e rebrotar após o degelo. Essa combinação resultou em trigos chamados de “alternativos”, com maior necessidade de vernalização (frio), que define a necessidade de um tempo de exposição das plantas a temperaturas relativamente baixas.

Como o objetivo do trigo forrageiro é oferecer pasto, as cultivares foram desenvolvidas para crescer de forma mais lenta, ampliando o período do desenvolvimento vegetativo, que pode levar até 112 dias da emergência à elongação, quase o dobro do período dos trigos destinados somente à produção de grãos. A semeadura antecipada do trigo forrageiro, em março e abril, permite vários ciclos de pastejo até outubro e, em alguns casos, até novembro. A cada corte (ou pastejo), a planta rebrota com ainda mais vigor, estimulada pela adição de adubos nitrogenados, situação que também pode se repetir quando há incidência de geadas.

Segundo o pesquisador Ricardo Lima de Castro, da Embrapa Trigo, geralmente as geadas não causam danos em trigo quando ocorrem antes do emborrachamento (cerca de 70 dias após a emergência): “A sensibilidade do trigo à geada começa a aumentar depois do início do emborrachamento. Os danos dependem da intensidade da geada e da sensibilidade da cultivar, já que existe diferença genética bem acentuada entre as cultivares”. Ele lembra que os prejuízos com geadas de forte intensidade podem ser grandes em cultivares mais sensíveis, causando a queima de folhas, estrangulamento de colmos e até a morte de plantas.

Contudo, os danos no trigo forrageiro tendem a ser menores porque o melhoramento genético destas espécies trabalhou para a aclimatação do trigo à geada, aumentando a capacidade das plantas tolerarem temperaturas baixas.

Aveia preta como opção

Apesar da sensibilidade ao frio, a aveia preta continua sendo preferência de muitos produtores devido ao menor custo na semente. O preço da semente de trigo representa quase o dobro do valor da semente de aveia preta. Contudo, a oferta de forragem é quase 70% menor na aveia preta em comparação ao trigo.

“A aveia preta tem o desenvolvimento inicial rápido, mas atinge o pico de produção de pasto em dois a três meses, quando entra em declínio, exigindo uma segunda semeadura para garantir forragem durante todo o inverno. O trigo, por outro lado, mantém a oferta constante de forragem, com rebrote vigoroso a cada pastejo”, explica o engenheiro agrônomo Marcelo Klein, da Embrapa Trigo.

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Um experimento comparando trigo e aveia foi instalado na Embrapa Trigo para avaliar o volume de forragem produzida. Foram realizados nove cortes, simulando ciclos de pastejo, de março a novembro. No balanço final, o trigo forrageiro produziu, em média, 900 kg de matéria seca por corte, enquanto a aveia produziu 533 kg MS/corte. No manejo fitossanitário (controle de pragas e doenças), trigo e aveia mostraram a mesma exigência nos cuidados, mas na adubação o trigo necessitou maior número de reposições (uma aplicação de ureia após cada pastejo), porque a cultura ficou mais tempo produzindo biomassa.

*Giulia Di Napoli colabora com reportagens para o portal da Itatiaia. Jornalista graduada pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), participou de reportagem premiada pela CDL/BH em 2022.