Considerado um dos principais empresários do transporte público de Minas Gerais, Rubens Lessa, dono da empresa Saritur, prestou depoimento por mais de duas horas, nesta quinta-feira (28), na Câmara Municipal de Belo Horizonte (CMBH). A oitiva foi em sessão da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Ônibus sem Qualidade, criada neste ano para investigar supostas irregularidades no sistema de transporte público da capital mineira.
Lessa participou da reunião por meio de chamada de vídeo e durante toda a sessão esteve acompanhado de um advogado. O depoimento do empresário foi marcado inicialmente para 21 de dezembro, mas ele não compareceu. Ao explicar a ausência, Lessa disse ter tido imprevistos pessoais.
O empresário afirmou não saber que a falta dele “causaria tantos transtornos”, fazendo referência indireta ao fato de que os vereadores aprovaram requerimento que possibilitava que ele fosse conduzido coercitivamente, caso não comparecesse novamente para depor.
Nos primeiros minutos da sessão, a defesa do empresário disse que Rubens Lessa tem, por lei, o direito de permanecer em silêncio quando fosse perguntado sobre questões pessoais que pudessem, eventualmente, prejudicá-lo.
Por lei, nenhuma pessoa é obrigada a gerar provas contra si em depoimentos. Apesar dessa prerrogativa, Lessa não se negou a responder nenhuma pergunta.
Troca-troca de empresas
Um dos questionamentos mais importantes para os vereadores era para saber como se deu a entrada da empresa BH Leste entrar no consórcio que opera o sistema de coletivos, mesmo sem autorização da prefeitura.
Um dos integrantes da comissão, vereador Bráulio Lara (Novo), que presidiu a reunião, disse que isso não poderia ter ocorrido, principalmente em se tratando de um sistema que recebe dinheiro público. Parte dos recursos que mantém a operação dos consórcios saiu de um subsídio de mais de R$ 500 milhões aprovado pela Câmara e sancionado pela Prefeitura de Belo Horizonte.
“Para uma empresa operar, ela tem que ter uma carta de anuência prévia da Sumob [Superintendência de Mobilidade Urbana]. Prévia. E essa licença foi sair agora, no final do ano. É um absurdo. Então, balizou-se decisões falando que o sistema não podia parar e que havia uma situação emergencial. Mas, por mais que fosse emergencial, esses passos não poderiam ser dados da forma como aconteceram”, critica.
A BH Leste entrou no consórcio também chamado BH Leste, no lugar da Viação Torres. A segunda empresa estava enfrentando graves problemas financeiros e disse que não tinha mais condições de operar. Neste cenário, Lessa disse que nenhuma outra empresa estava interessada em comprar a antiga Viação Torres.
No entanto, em meio à crise, ela foi comprada pela família do empresário Nilo Júnior, filho de Nilo Gonçalves Simão, responsável pelo Grupo Transimão, que tem grande participação no transporte público da Grande BH. Após incorporar toda a estrutura da Viação Torres, a BHLeste passou a integrar o consórcio homônimo, mas sem passar pelos trâmites prévios legais.
Empresários deram aval para empresa operar irregularmente
Questionado na CPI, Rubens Lessa, que preside o Consórcio BH Leste, afirmou que tomou a decisão em conjunto com os demais empresários. A CPI apontou que, mesmo sem autorização da prefeitura para operar, a viação BH Leste recebeu subsídios da prefeitura. Rubens Lessa alegou que o 94% das empresas do consórcio aceitaram a entrada da empresa. O motivação era não prejudicar o transporte público da cidade.
“Não foi um negócio de concessão. Foi um negócio de ativos que tivemos que fazer e correr o risco. Até sair a anuência, que saiu agora, como é que ficaria o transporte? Nenhum de nós tinha condição de comprar 104 ônibus novos, nem crédito para isso. O consórcio votou e, no dia da votação, 94% da participação do consórcio autorizou de imediato e o restante pediu prazo para analisar a documentação”, afirmou em depoimento.
Representando a população na reunião, o Presidente da Associação dos Usuários de Transporte Coletivo da Grande BH, Francisco Maciel, ficou indignado com o tratamento dispensado ao empresário, que, segundo ele, não foi questionado como deveria.
“A realidade do transporte coletivo é uma calamidade: superlotação, descumprimento do quadro de horários, maus-tratos aos usuários. E, hoje, mais uma triste cena, tenebrosas transações foram relatadas pela principal figura do empresariado que gesta esse caos do transporte coletivo no Belo Horizonte. E a Câmara Municipal, com 41 vereadores, 39 se omitiram, não fizeram rpesença e sequer fizeram perguntas. Os dois vereadores [que estavam na reunião, Bráulio Lara e Loíde Gonçalves] tiveram todo o cuidado para não estranharem o convidado. Ele transitou em um céu de brigadeiro”, criticou.
A relatora da CPI, vereadora Loide Gonçalves (Podemos), disse que irá apresentar o relatório final da CPI no dia 1° de fevereiro.