Gatos são dorminhocos, mas tutores devem ter atenção para sonolência excessiva

Existe uma linha tênue entre o repouso fisiológico e a apatia patológica; sono excessivo, quando acompanhado de mudanças de comportamento, é um alerta

Filhotes e gatos idosos podem ter padrões de sono diferentes: filhotes dormem ainda mais, idosos podem ter sono fragmentado

O que muitos tutores interpretam como preguiça ou puro tédio ao ver um gato dormindo é, na verdade, uma complexa estratégia evolutiva de sobrevivência. Para os felinos domésticos, o sono é a ferramenta principal para recarregar baterias de caça, mesmo que essa “caça” seja apenas um brinquedo.

Para entender o que é normal, é preciso olhar para os números fisiológicos. A quantidade de horas que um gato passa dormindo pode assustar tutores de primeira viagem, mas raramente indica um problema por si só.

Em entrevista à Itatiaia, a médica-veterinária e coordenadora do time de Credibilidade de Optimum, Jéssica Yoshida, explica a média esperada para a espécie.

“Adultos saudáveis dormem, em média, 12 a 16 horas por dia, podendo chegar a 18 horas em fases de descanso profundo. Esse padrão é fisiológico, o felino alterna sono leve, sono REM (quando processa informações) e períodos curtos de atividade, seguindo seu ritmo natural de predador crepuscular”, diz.

Ela lembra ainda que filhotes e gatos idosos podem ter padrões de sono diferentes: “Filhotes dormem ainda mais, idosos podem ter sono fragmentado”.

A menção ao “predador crepuscular” é a chave para compreender a rotina da casa. Estudos de comportamento animal da Universidade de São Paulo (USP) e diretrizes da American Association of Feline Practitioners (AAFP) reforçam que o relógio biológico dos gatos os desperta nos momentos de transição de luz: o amanhecer e o anoitecer.

Contudo, existe uma linha tênue entre o repouso fisiológico e a apatia patológica. O sono excessivo, quando acompanhado de mudanças de comportamento, torna-se um indicador clínico importante.

Doenças renais crônicas, diabetes ou dores articulares (como osteoartrites, comuns em gatos idosos) frequentemente se manifestam através do isolamento e do aumento das horas de sono.

Yoshida alerta para os sinais que devem acender o sinal vermelho para o tutor:

“Sonolência excessiva, falta de resposta a estímulos, redução de brincadeiras e apetite podem indicar dor, doenças metabólicas, infecções, alterações comportamentais como estresse ou envelhecimento. Mudanças persistentes no ‘padrão de vigília’ justificam avaliação veterinária”.

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Para diferenciar o descanso saudável de um possível quadro clínico, a Itatiaia listou alguns pontos de atenção:

- É normal que o gato acorde facilmente ao ouvir um barulho de pacote de ração ou brinquedo. Se o animal não reage a estímulos auditivos fortes ou táteis enquanto dorme, isso sugere prostração, não sono.

- Gatos relaxados e sem dor tendem a dormir esticados ou enrolados confortavelmente. Animais com dor abdominal ou articular podem adotar a posição de “esfinge” (agachados, com as patas recolhidas sob o peito e cabeça baixa) por longos períodos, sem de fato relaxar para o sono profundo.

- Ao acordar, o comportamento padrão de um gato saudável é o espreguiçamento seguido do grooming (banho de língua). A falta de auto-higiene após os cochilos, e que resulta em pelagem opaca ou embaraçada, é um dos primeiros indicadores de mal-estar físico ou psicológico (como depressão).

Jessica de Almeida é repórter multimídia e colabora com reportagens para a Itatiaia. Tem experiência em reportagem, checagem de fatos, produção audiovisual e trabalhos publicados em veículos como o jornal O Globo e as rádios alemãs Deutschlandfunk Kultur e SWR. Foi bolsista do International Center for Journalists.

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