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‘Adoção forçada’: entenda denúncia de família mineira contra assistência social britânica

Além deles, milhares de pessoas denunciam o Governo Britânico por supostas adoções forçadas

Família mineira denúncia assistência social britânica de perseguição e adoção forçada

Milhares de pessoas que vivem no Reino Unido estão denunciando o que chamam de “adoção forçada”, entre elas uma família de mineiros que perdeu a guarda de um bebê nascido em junho de 2021.

Diferentemente do Brasil, na Inglaterra o juiz pode decidir pela retirada da guarda da criança da família sem maiores investigações. Alguns ingleses chamam isso de “adoção forçada” e “bola de cristal”. Por lei, caso o juiz decida que aquela família pode representar um risco à criança no futuro, ele já tem permissão para enviar a criança a um abrigo.

Atualmente, milhares de famílias protestam no Reino Unido contra o sistema de adoção britânico. Glenda, mineira que luta na Justiça pela guarda do neto que foi levado pela assistência social logo após o nascimento, conta que está em um grupo com mais de 14 mil pessoas que se apoiam e compartilham suas experiências com o que consideram abusos da assistência social.

O problema com adoções forçadas no Reino Unido é antigo e, em 2022, grupos sociais demandaram que o Governo Britânico se desculpasse para as famílias que tiveram seus filhos levados entre 1949 e 1976. Nesta época, uma lei permitia que filhos de mulheres solteiras fossem levados pela assistência social. O Comitê Conjunto dos Direitos Humanos (JCHR) estima que, neste período, 185.000 crianças foram retiradas de suas famílias.

A lei de adoção britânica passou por várias mudanças desde 1979, mas ainda influencia a forma que o Reino Unido lida com a retirada de crianças das famílias biológicas. Ainda hoje, muitas pessoas continuam denunciando adoção forçada, abuso de poder e perseguição por parte da assistência social.

Em um artigo publicado em outubro de 2022, a revista britânica Prospect divulgou que dados de 2014 sugerem que quase metade das 5.050 crianças adotadas naquele ano teriam sido entregues a novos lares sem a permissão dos pais. A revista ainda afirma que a Inglaterra removeu mais de 80 mil crianças da casa de seus pais em março de 2021. Dessas, 4.600 teriam tido permissão judicial clara para a adoção, mas os outros 76 mil casos seriam “menos claros”, segundo a revista.

Em fevereiro de 2008, um caso de adoção forçada ocorrido em Nottingham chamou a atenção dos britânicos. Na época, a justiça concordou que a assistência social do país deveria pagar danos morais à mãe da criança, após admitirem que agiram ilegalmente ao levar o bebê dela de forma forçada. Assim como o neto de Glenda, na época o bebê foi levado para um abrigo horas depois do nascimento e sem uma decisão judicial permitindo a adoção.

Saúde mental e lei britânica

A lei britânica afirma que “o tribunal não pode dispensar o consentimento de qualquer dos pais ou tutores de uma criança para que a criança seja colocada para adoção ou para que seja emitida uma ordem de adoção em relação à criança, a menos que o tribunal esteja convencido de que o pai ou tutor não pode ser encontrado ou ter capacidade mental para dar o consentimento ou se o bem-estar da criança exige que o consentimento seja dispensado”.

É por este motivo que David, filho de Glenda, e sua namorada, a britânica Natalie, perderam a guarda do filho. O juiz concluiu que, pelo histórico de saúde do casal, eles não teriam condições de criar o filho. A professora de educação e adoção da Universidade de Oxford, doutora Julie Selwyn, explica que um parente deve ser considerado como guardião antes que a criança vá para um abrigo.

“Os serviços sociais têm que provar que a criança sofreu ou vai sofrer danos significativos se não for removida. Têm também que demonstrar que ninguém mais na família da mãe ou do pai é capaz e está disposto a cuidar da criança. Os tribunais vão querer ter a certeza de que a avó cuidará da criança até à idade adulta e não a devolverá imediatamente à mãe”.

Entretanto, Glenda nega que tenha tido assistência jurídica e afirma que foi manipulada pelas assistentes sociais. Segundo ela, Natalie foi constantemente dopada após o parto e, somente por isso, não teve condições de ficar com o bebê. Meses depois, de acordo com Glenda, a nora já estava melhor e, ainda assim, não recebeu a guarda do filho.

Em março de 2022, ao perceber que realmente não conseguiriam reaver a guarda do bebê para David e Natalie, a família propôs que Glenda fosse a guardiã. Entretanto, quando Glenda apresentou a intenção de firmar um acordo com a justiça para que David e Natalie visitassem o filho, a guarda foi negada.

Histórico de denúncias

A família de Glenda não é a única que sofre com o sistema de adoção britânico e pede auxílio ao seu país de origem. Famílias britânicas e de outros países europeus denunciam que algumas pessoas podem lucrar com a adoção, já que o sistema britânico tem uma parceria público privada e, para evitar a institucionalização de crianças, paga cerca de 700 libras (R$4.516,45 na cotação atual) por semana para quem acolher uma criança.

O portal de notícias português, TVI, fez uma série de reportagens relatando a história de dezenas de mulheres portuguesas que perderam a guarda de seus filhos enquanto moravam na Inglaterra.

Em 2012, o governo da Eslováquia ameaçou levar um caso ao Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, depois que um casal eslovaco perdeu a guarda dos filhos enquanto moravam no Reino Unido, sem que os avós fossem considerados como guardiões. Pouco tempo depois, entretanto, a Justiça Britânica devolveu as crianças à família.