Hoje, 13 de maio, o Brasil recorda um dos marcos mais simbólicos da sua história: a assinatura da Lei Áurea, em 1888, que pôs fim legal à escravidão no país (o último da América a assinar um tratado abolindo o trabalho escravo). Mas, como lembra o professor Alysson Luiz Freitas — historiador, doutor pela Universidade de São Paulo (USP) e referência nos estudos sobre escravidão, cultura e desigualdade racial —, esta data vai além de uma celebração. Ela precisa ser um convite à reflexão crítica: “A história do negro no Brasil não pode morrer no 13 de maio”.
Em entrevista à Rádio Itatiaia, o professor do Departamento de História da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes) destacou que a abolição marcou, sim, uma nova etapa na história nacional, mas veio “com um atraso muito grande” e sem nenhuma política de inclusão ou reparação para os ex-escravizados. “O país não se preparou para absorver essa nova realidade social, e isso gerou consequências perversas, como o encarceramento em massa da população negra e a sua associação forçada à criminalidade”, destacou.

Freitas também questiona a imagem da princesa Isabel como “redentora dos escravos”, frequentemente exaltada na memória oficial. Para ele, “os verdadeiros protagonistas da abolição foram os próprios negros, que lutaram individual e coletivamente, muitas vezes com o uso necessário da força, para conquistar sua liberdade”.
O impacto da escravidão e da abolição incompleta ainda é sentido hoje. “Talvez o maior marco da história do Brasil seja o fim da escravidão e o início de um processo racialista gravíssimo”, afirma. Ele explica que o racismo estrutural consolidou-se a partir do século XIX, com teorias que buscavam justificar uma suposta inferioridade do negro, excluindo-os do projeto de desenvolvimento nacional. E essa exclusão, segundo o professor, é perpetuada também na educação: “A história do negro é tratada nas escolas apenas até a abolição. Fala-se da escravidão, das leis, mas não do legado cultural africano, nem da importância social dos negros na construção do Brasil”. Para ele, a mudança passa pela valorização da cultura negra no currículo, com professores preparados e escolas comprometidas com uma educação antirracista.
Encerrando a conversa, Freitas reforçou que transformar o 13 de maio em um dia de consciência racial e social exige coragem e lucidez: “Negar a questão racial no Brasil é um dos nossos maiores erros. A pobreza tem cor. E sem políticas de reparação, como as cotas e a inclusão efetiva, nunca teremos justiça de verdade”.
A entrevista é um convite à reflexão crítica e ao compromisso com uma memória mais justa, que valorize a luta dos que resistiram — e ainda resistem — contra o racismo estrutural no país.