Dois grupos concorrerão na eleição à presidência do Comitê Olímpico do Brasil (COB) marcada para o dia 3 de outubro (quinta-feira). Uma chapa será encabeçada por Marco La Porta (ex-vice-presidente do COB) e Yana Marques (medalhista olímpica) e a outra com Paulo Wanderley (atual presidente) e Alberto Maciel Júnior. A candidatura do atual presidente é alvo de questionamento por parte de alguns atletas e de análise por parte do Ministério do Esporte.
Entidades ligadas ao esporte e aos esportistas contestam a participação de Paulo Wanderley, que teria um terceiro mandato em caso de eleição.
Paulo Wanderley era vice-presidente da gestão de Carlos Arthur Nuzman. Depois de 22 anos no comando, Nuzman foi preso e afastado durante as investigações de uma suposta compra de votos a membros do Comitê Olímpico Internacional (COI) para selecionar o Rio de Janeiro como sede da Olimpíada em 2016.
Com o afastamento de Nuzman, Paulo Wanderley assumiu o posto de presidente em 2017. Em 2020, foi reeleito e exerceu novo mandato à frente do COB.
Em contato com a reportagem, o Ministério do Esporte afirma que recebeu recentemente uma consulta do COB sobre o processo eleitoral da entidade e analisa o conteúdo da consulta.
“Assim que a análise for concluída, o resultado se tornará público. Importante ressaltar que o Ministério do Esporte irá acompanhar com isenção e imparcialidade todo o processo, cumprindo rigorosamente o que determina a lei”, completou a assessoria.
Contestação
Duas entidades se manifestaram publicamente sobre a candidatura de Paulo Wanderley. O Atletas pelo Brasil e a Comissão de Atletas do COB defendem que a candidatura do atual presidente representa a busca por um terceiro mandato, que é irregular.
O artigo 36 da Lei Geral do Esporte fala sobre repasse de recursos públicos federais para entidades esportivas e da sucessão presidencial em entidades esportivas. No texto, é explícito que o permitido, num mandato de quatro anos, uma única recondução consecutiva.
As duas entidades publicaram uma nota pública contestando a candidatura. “Terceiro mandato de presidentes em Comitês e Confederações esportivas é retrocesso e coloca o esporte em risco”, diz parte da nota (leia na íntegra no final)
Posicionamento de Paulo Wanderley
A reportagem também buscou a assessoria pessoal do atual presidente do COB. Segundo comunicado enviado à reportagem, a candidatura não é ilegal.
“O advogado Marcelo Jucá, que assessora Paulo Wanderley, explica que não se trata de um terceiro mandato. A legislação esportiva brasileira não veda a reeleição quando o primeiro período é um chamado “mandato tampão”. Além disso, essa matéria já foi objeto de demandas judiciais de outras entidades e todas as ações que transitaram em julgado não entenderam pela existência de um terceiro mandato”, diz a nota.
Eleição
A eleição será no auditório do Centro de Treinamentos do Time Brasil, no Parque Aquático Maria Lenk, no Rio de Janeiro. A votação vai escolher presidente, vice, sete membros do Conselho de Administração, um membro independente do Conselho entre outras posições.
A Assembleia Geral é composta pelos presidentes das Confederações Olímpicas dos esportes de Verão e Inverno filiadaos ao COB (34 no total). Além deles, dois membros brasileiros no COI (Andrew Parsons e Bernard Rajzman) e 19 representantes da Comissão de Atletas também integram a Assembleia.
ATLETAS PELO BRASIL E COMISSÃO DE ATLETAS DO COB - NOTA PÚBLICA
Terceiro mandato de presidentes em Comitês e Confederações esportivas é retrocesso e coloca o esporte em risco.
Recebemos com preocupação o anúncio da candidatura do Presidente do Comitê Olímpico do Brasil (COB), Paulo Wanderley Teixeira, para um terceiro mandato à frente da instituição.
Paulo Wanderley é mais um dirigente de entidade esportiva que não respeita a legislação brasileira. O Artigo 18-A da Lei Pelé, ratificado pela Lei Geral do Esporte, que garante melhores práticas de governança e transparência em Comitês e Confederações esportivas, é claro: somente poderão receber recursos públicos federais, inclusive o repasse de loterias, as entidades que adotarem determinadas medidas, dentre elas o limite de mandato de até 4 anos, permitida uma única recondução por igual período, aos seus presidentes ou dirigentes máximos. O próprio estatuto do COB também prevê apenas dois mandatos a seu presidente.
Paulo Wanderley assumiu a presidência da entidade em caráter efetivo em outubro de 2017, após renúncia de Carlos Arthur Nuzman, de quem era vice-presidente e com quem havia formado chapa conjunta na eleição anterior, e concluiu o primeiro mandato em 2020. Reconduzido ao cargo para um segundo mandato, entre 2021 e 2024, tem agora a obrigação de deixar a presidência do COB ao final deste ano.
Todos os presidentes de Comitês e Confederações estão cientes da necessidade de cumprimento do Artigo 18-A da Lei Pelé, em vigor há uma década. Apesar disso, por vezes, alguns deles ignoram a legislação brasileira em benefício próprio. E, nesse sentido, a candidatura de Paulo Wanderley a um terceiro mandato no COB representa um retrocesso na governança do esporte olímpico nacional.
Além disso, na medida em que os recursos de loterias são fundamentais para a manutenção das atividades tanto do COB quanto de diversas confederações, a candidatura do atual presidente também coloca em risco todo esse ecossistema pois, ao descumprir a lei, o COB não poderá mais receber recursos públicos.
Nunca é demais ressaltar: qualquer presidente de comitê ou confederação que tente buscar um terceiro mandato contra as regras da lei, coloca em risco todo o movimento esportivo que representa, já que estas entidades só sobrevivem com base no recebimento de verbas públicas e das loterias.
Como cabe ao poder público nada menos do que seguir a lei, haverá a interrupção do repasse destas verbas às entidades infratoras, consequência direta da mera decisão e capricho de mandatários no poder em tentar um terceiro mandato. Sem as verbas, desestrutura-se toda a preparação de atletas e o desenvolvimento do esporte de alto rendimento no país.
O próprio Paulo Wanderley já se manifestou publicamente a favor do cumprimento do Artigo 18-A da Lei Pelé. Em entrevista publicada pelo jornal O Globo, em 30 de outubro de 2017, o Presidente do COB afirmou: “Fui eleito para a presidência e isso envolve o presidente e vice. Então, estou no meu primeiro mandato e teria direito a uma reeleição.”