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Entidades denunciam que centros de migração no México são ‘prisões’

Pelo menos 39 migrantes morreram nas instalações

Por suspeita de homicídio, o tribunal emitiu mandados de prisão contra três funcionários do Instituto Nacional de Migração

Luisa pensou que estava entrando em um escritório para regularizar sua permanência no México, mas de repente se viu presa. A morte de 39 migrantes em uma dessas instalações revelou mais um descaso contra aqueles que buscam chegar aos Estados Unidos.

“Isso é uma masmorra, um centro de detenção, como se fôssemos criminosos”, disse à AFP a venezuelana Luisa Jiménez em Ciudad Juárez, na fronteira com o país americano.

A migrante se refere ao local onde ficou detida por meses em Tuxtla Gutiérrez (Chiapas, sul), onde segundo ela foi levada com a promessa de obter uma permissão para estar no México antes de pedir asilo nos Estados Unidos. Na verdade, eles a notificaram de que deveria deixar o país.

"É um lugar nojento”, acrescenta a mulher de 56 anos, descrevendo condições semelhantes às do centro de Ciudad Juárez, onde um incêndio matou 39 migrantes detidos em uma cela que, segundo a promotoria, não tiveram ajuda de nenhum agente.

O incidente ocorreu na noite da última segunda-feira (27), após um migrante incendiar colchões no meio de um protesto contra uma possível deportação, de acordo com as autoridades.

“Não há extintores de incêndio, detectores de fumaça. Mas sim câmeras”, disse à AFP o nicaraguense Moisés Chávez, que há uma semana estava detido na mesma cela de 84 metros quadrados onde, segundo ele, os agentes tratam os migrantes com descaso.

Por suspeita de homicídio, o tribunal emitiu mandados de prisão contra três funcionários do Instituto Nacional de Migração (INM), dois seguranças executivos e o migrante que teria iniciado o incêndio.

Tratamento precário

Imagens de câmeras de segurança do local revelaram que os agentes do INM e seguranças executivos não liberaram a cela no momento em que o incêndio começou.

Na teoria, esses tipos de instalações são centros de serviços e acomodações para estrangeiros que não possuem documentação para uma permanência legal no México. No entanto, “lá te tratam como um prisioneiro”, diz a venezuelana Yusleidy García, detida no centro de Ciudad Juárez, uma instalação de permanência provisória onde os migrantes não podem permanecer mais de sete dias.

“Passei a noite com frio, levaram todos os seus pertences. Na cela onde estava estavam 150 pessoas” de várias nacionalidades, denuncia.

As condições contrastam com as regras determinadas pelo governo mexicano em 2012, que exigem uma alimentação adequada, protocolos de higiene, assim como “segurança e proteção de pessoas e bens” em caso de rebeliões.

Alguns dos migrantes são transferidos para postos de imigração, onde a permanência não deve ultrapassar 15 dias para regularizar sua situação e receber assistência jurídica, podendo até ser deportados.

Embora sejam levados a estes locais com a promessa de receberem autorizações para residência, os migrantes entrevistados pela AFP dizem que na verdade recebem as notificações para deixar o México dentro de 10 a 30 dias.

Luisa ficou detida por dois dias, após uma longa jornada na qual conta que dormiu ao lado de cadáveres de migrantes na região de Darién, entre a Colômbia e o Panamá, e comeu o que outros jogaram fora.

“Não são abrigos”

De acordo com a Anistia Internacional, em 2022, as autoridades detiveram pelo menos 318.660 pessoas em centros de migração e expulsaram cerca de 106.000, incluindo menores.

Após o incêndio, a organização condenou a existência destes espaços, que têm “causado inúmeros prejuízos, e até tortura e tratamentos cruéis, desumanos e degradantes, a milhares” de migrantes.

“As estações de migração não são ‘abrigos’, mas centros de detenção, e as pessoas não são ‘abrigadas’ ali, mas privadas de sua liberdade”, acusou a ONG, aludindo às declarações do presidente mexicano, Andrés Manuel López Obrador.

Após o incidente, o escritório das Nações Unidas no México lembrou que o Pacto Global para uma Migração Segura, Ordenada e Regular proíbe detenções arbitrárias e pede que as detenções legais durem o mínimo possível.

Outros padrões internacionais defendem alternativas à prisão, lembrou a ONU.

AFP
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