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Da cruz ao concreto: o bairro Cruzeiro e a longa espera pela Catedral de BH

A história que deu nome ao bairro

O nome do bairro Cruzeiro, em Belo Horizonte, carrega consigo a memória fundadora da cidade. Em 1897, durante a Missa Campal que celebrou simbolicamente o nascimento da nova capital de Minas Gerais, uma grande cruz de madeira foi erguida no alto da Serra do Curral. O gesto foi tanto religioso quanto cívico: marcar espiritualmente o território recém-urbanizado. Ao redor daquele marco, o lugar ficou conhecido como Praça do Cruzeiro, e dele derivou o nome do bairro. Com o tempo, a cruz desapareceu, dando lugar à atual Praça Milton Campos, que homenageia o ex-governador mineiro.

Foi nesse mesmo espaço simbólico que se projetaram os dois primeiros esforços para erguer a Catedral de Belo Horizonte. Ainda na fase inicial da cidade, idealizava-se uma catedral monumental na Praça do Cruzeiro, que seria o centro espiritual da capital planejada. Um tempo com o pótico aberto para toda a cidade. O projeto, no entanto, não avançou, diante de dificuldades técnicas e orçamentárias da época.

Primeiro projeto de Catedral para a Praça do Cruzeiro, hoje Praça Milton Campos

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Décadas depois, uma nova proposta reacendeu a esperança. Em cerimônia solene presidida por Dom Antônio dos Santos Cabral, foi apresentado o projeto do arquiteto austríaco Clemens Holzmeister: um templo grandioso com capacidade para 12 mil pessoas. Embora a pedra fundamental tenha sido originalmente abençoada durante o II Congresso Eucarístico Nacional, em 1936, na Avenida Olegário Maciel, decidiu-se posteriormente trasladá-la para a Praça do Cruzeiro, em procissão solene ao fim da Semana Pró-Catedral.

Para viabilizar o projeto, foram criadas comissões de arrecadação. O próprio arcebispo deu o exemplo ao doar cem contos de réis. A artista Francelina Pires Furtado produziu uma maquete em gesso da futura catedral, que foi exibida na Companhia Força e Luz e, depois, na Feira Permanente de Amostras, onde hoje se localiza a rodoviária. A prefeitura autorizou as sondagens em 1942, que se iniciaram no ano seguinte. Em 1949, concluiu-se a cripta, com capacidade para 800 pessoas, celebrando-se a primeira missa ao ar livre no local. No entanto, após anúncio de nova concorrência para as fundações em 1953, as obras silenciaram. Em 1956, o adoecimento de Dom Cabral e a nomeação de Dom João de Resende Costa como coadjutor puseram fim, de forma velada, àquele segundo sonho.

O segundo projeto, desenhado pela artista Francelina Pires Furtado também não se concretizou

Sem catedral definitiva, a Sé ficou provisoriamente na Igreja São José e, depois, na Igreja da Boa Viagem, onde permanece até hoje. A ausência de um templo-símbolo acompanhou a capital por mais de um século, até que, já no século XXI, o projeto da Catedral Cristo Rei foi idealizado por Dom Walmor Oliveira de Azevedo e projetado por Oscar Niemeyer. Localizada em Venda Nova, a nova catedral promete, enfim, realizar o sonho acalentado desde os tempos da cruz inaugural: dar a Belo Horizonte um altar à altura de sua fé, de sua história e de sua vocação monumental.

Gabriel Sousa Marques de Azevedo é advogado, empresário, jornalista, professor, publicitário, pós-graduado em competitividade global pela Georgetown University e Mestre em Cidades pela London School Of Economics.

A opinião deste artigo é do articulista e não reflete, necessariamente, a posição da Itatiaia.