Ouvindo...

Atendimento a mulheres na delegacia de Caeté era restrito até em urgências, diz promotor

Allender Barreto Lima da Silva reconhece problemas estruturais na Polícia Civil, mas aponta necessidade de atendimento em tempo integral

Cláudio Freitas Utsch Moreira é o atual titular da delegacia de Caeté

O promotor de Justiça Allender Barreto Lima da Silva destacou nesta quinta-feira (21), em entrevista à Itatiaia, que mesmo demandas urgentes de mulheres vítimas de violência deixaram de ser atendidas na delegacia da Polícia Civil de Caeté, na Grande BH. O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) emitiu, neste mês, recomendação administrativa ao delegado Cláudio Freitas Utsch Moreira, pedindo prioridade e ampliação do atendimento a mulheres.

A manifestação do MP, encaminhada neste mês, ocorre após diversas denúncias sobre dificuldades para registro de ocorrências e obtenção de medidas protetivas de urgência. O órgão aponta como uma das restrições o horário de atendimento dessas vítimas, que ocorre apenas das 8h30 às 12h, de segunda a sexta-feira, e com agendamento prévio.

“Diversas vítimas não foram atendidas pela delegacia ou tiveram que voltar em outros dias, mesmo a demanda (de violência de gênero e violência doméstica) sendo urgente. Durante os últimos meses nós monitoramos a situação e verificamos que havia uma restrição de horário colocada administrativamente na delegacia de polícia. O Ministério Público também recebeu diversas vítimas de violência doméstica que, ao não serem atendidas pela delegacia, recorreram ao Ministério Público, que contou com o apoio muito importante da doutora Luciana Crawford, e teve que providenciar os pedidos de medida protetiva para essas mulheres”, disse Allender.

O próprio promotor diz ter constatado a restrição de horário para atendimento de mulheres. “Resolvemos emitir a recomendação administrativa, inclusive por respeito à grande parceira que é a Polícia Civil. A delegacia tem um papel fundamental na proteção das mulheres e, considerando isso, atuamos de forma preventiva, estabelecendo um fluxo de atendimento e a proteção integral à mulher”, disse.

Allender acredita que as recomendações serão acatadas, apesar de reconhecer problemas estruturais na Polícia Civil.

“Basicamente, o que a gente pretende é o atendimento da mulher de forma integral, para protegê-la e encaminhar as demandas dessas mulheres que chegam à delegacia à Justiça. Essa recomendação, como eu disse, tem um caráter preventivo de apontar os problemas, expor os gargalos e propor alterações. O próximo passo, em caso de não acatamento — o que a gente já não acredita que vá ocorrer — é a apuração concreta, tanto no âmbito de eventual inquérito civil, para apurar improbidade administrativa, quanto de procedimento investigatório criminal, para apurar a conduta da autoridade policial. Mas não é o que a gente espera”, ressaltou.

Recomendação

No documento, o MP ressalta que a média das taxas de violência doméstica e familiar contra a mulher nos municípios da comarca de Caeté é maior que a do estado, conforme dados da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública de Minas Gerais (Sejusp-MG). Por isso, a medida busca garantir que o serviço seja oferecido em todos os dias e horários de funcionamento da delegacia, independentemente de agendamento prévio, abrangendo também os municípios de Nova União e Taquaraçu de Minas.

O documento do MP cita, inclusive, um comunicado fixado na entrada da delegacia, informando que os expedientes relativos à Lei Maria da Penha seriam atendidos e despachados apenas no período da manhã.

Veja as recomendações do MP

  • Atendimento da mulher vítima de violência doméstica e familiar dos municípios de Caeté, Nova União e Taquaraçu de Minas, “independentemente de agendamento prévio, em todos os dias de expediente, por todo o horário de funcionamento da delegacia";
  • Treinamento da equipe da delegacia de polícia para um “atendimento humanizado e técnico”, atento às peculiaridades da legislação, “evitando que a mulher seja objeto de revitimização";
  • Atendimento imediato da vítima em “espaço reservado, preservando a intimidade, feito preferencialmente por servidora, sem impedir o atendimento por agente masculino devidamente capacitado";
  • Informar as vítimas sobre os direitos previstos na Lei Maria da Penha, colhendo o termo “Ciência dos direitos”, e cientificá-las quanto às Medidas Protetivas de Urgência. Havendo vontade de fixação, deverá ser confeccionado o Expediente Apartado de Medida Protetiva (EAMP), independentemente de representação quanto ao suposto crime;
  • Colhidas as declarações da vítima, a Medida Protetiva deverá ser encaminhada com urgência à 2ª Vara da Comarca de Caeté, com competência para julgar casos de Violência Doméstica e Familiar contra a mulher;
  • Em caso de ciência de violência doméstica e familiar por Boletim de Ocorrência lavrado pela PMMG, a diligência para oitiva da vítima deverá ser providenciada, incluindo-a na rota da equipe de investigação;
  • Em caso de necessidade, a autoridade policial poderá solicitar o apoio do serviço de prevenção à violência doméstica da Polícia Militar (PPVD/PMMG) para realizar a “revisitação tranquilizadora” da vítima, especialmente em crimes com violência real.

Delegado

Atual titular da delegacia de Caeté, Cláudio Freitas Utsch Moreira foi coordenador de Operações Policiais (COP) do Detran-MG, sendo exonerado do cargo em março de 2019.

Em nota, a Polícia Civil informou que há um estudo para viabilizar os atendimentos todos os dias úteis, dentro da capacidade operacional atual da delegacia, e que a Corregedoria-Geral acompanha as situações relacionadas.

“A PCMG reforça que, além da Delegacia de Caeté, as mulheres vítimas de violência contam com o suporte das 70 Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAMs), presentes tanto na capital quanto no interior do estado. Em Belo Horizonte, a DEAM funciona em regime de plantão 24 horas, todos os dias da semana. Nas demais regiões, os atendimentos ocorrem em horário comercial, de segunda a sexta-feira, e os casos registrados à noite ou nos fins de semana são encaminhados às delegacias de plantão, com funcionamento ininterrupto. Cumpre ressaltar que, próximo a Caeté, existe a Delegacia Especializada de Atendimento em Sabará, onde as vítimas também podem procurar por atendimento”, destaca o texto.

Leia também

Jornalista formado pela Newton Paiva. É repórter da rádio Itatiaia desde 2013, com atuação em todas editorias. Atualmente, está na editoria de cidades.
Jornalista graduada pelo Centro Universitário Newton Paiva em 2005. Atua como repórter de cidades na Rádio Itatiaia desde 2022