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Fim das boates em BH? Capital que já teve Swingers e Alambique vive realidade diferente com a geração Z

Tendência de menos consumo de bebida alcoólica na geração Z pode ser um dos fatores para mudança no perfil dos baladeiros

Swingers, Café Cancun, Alambique, Bwana e Três Lobos. Quem mora em Belo Horizonte e tem mais de 35 anos certamente já frequentou ou ouviu falar dessas boates e de tantas outras que embalavam as noites na capital mineira. No entanto, várias casas noturnas como esse perfil fecharam, e BH já não tem mais opções como em outras épocas. Mas qual o motivo para o fim das boates?

O cenário em Belo Horizonte reflete uma tendência mundial. Berlim, Londres e Nova York fecharam boates históricas nos últimos anos, como a Watergate, na Alemanha. Para entender esse novo momento, a reportagem passou uma noite na balada, iniciando pelo Mercado Novo, rua Sapucaí, e finalizando na A Obra e no Chalezinho, além de conversar com produtores de eventos da capital.

Fato é que a velha e boa balada, na qual as pessoas viravam a madrugada embaladas pelo consumo de álcool, pode estar se tornando uma prática de gente mais velha, da geração dos anos 90. Para essas pessoas, nascidas entre 1980 e 1990, passar madrugada na bebedeira era sinônimo de noite bem-sucedida. A mudança do perfil dos baladeiros é reforçada na geração Z, que são os nascidos de 95 a 2010, e pode ter vários fatores, entre eles a redução no consumo de álcool entre jovens de 18 a 24 anos.

Empresário e produtor de eventos, Cristiano Nenety acompanhou todas essas mudanças em mais de duas décadas de experiência nesse seguimento.

“Tivemos um boom de boates. A rua Sergipe, por exemplo, tinha três: Café Cancun, na frente tinha o Pop Rock Café e, na esquina, tinha o Bwana. Na Raja Gabaglia era a mesma coisa: a gente tinha a Swingers e o Alambique. Com a nova geração, as coisas foram mudando. A nova geração está muito preocupada com o bem-estar, com a qualidade do sono, está bebendo menos, tem outras formas de entretenimento, como viagens e bons restaurantes. Tem o ambiente em casa. Principalmente pós-pandemia, esse pessoal recebe mais os amigos em casa”, analisa Nenety, de 44 anos.

Nenetey tem razão. Relatório Covitel, que pesquisa hábitos de saúde dos brasileiros, aponta que jovens da geração Z que bebem três ou mais vezes por semana caiu desde o período pré-pandemia, de 10,7% para 8,1% em 2024. Além desses fatores, Nenety aponta que BH tem poucas opções de boates atualmente.

“São poucas boates consolidadas. Tem o grupo Chalezinho, que é muito forte, Major Lock, que nem considero boate, pois é um pub, a A Obra e tem o Observatório. Para você ver, falei o nome de quatro boates para uma cidade de 3 milhões de habitantes. É o contrário de tempos atrás, quando cada bairro tinha uma boate. Morava no Cidade Nova e tinha uma boate lá. Tinha boate no bairro Ouro Preto, Castelo e na Savassi tinha uma boate em cada esquina”, lembra.

Consumo de álcool

A pesquisa sobre hábitos de saúde da população mostra ainda que, pela primeira vez, o grupo dos mais jovens não teve a maior porcentagem no consumo regular de álcool, sendo superado pelas pessoas de 45 a 54 anos e de 55 a 64.

Além de beber menos, a geração Z prioriza a saúde, drinks diferentes e o bem-estar. Essas características são encontradas, por exemplo, em quem frequenta o Mercado Novo de Belo Horizonte, ponto de encontro de jovens que gostam dos rolês que terminam mais cedo. “Nesse horário, até meia-noite, vem uma moçada mais nova para tomar drinks e aproveita o final da noite”, diz Rômulo Guimarães Fonseca, 70 anos, síndico do espaço.

A estudante de direito Yasmin Silva Souto, 22 anos, reflete bem o perfil da geração Z. “Frequento bastante esse tipo de ambiente. Geralmente, fico no máximo até meia-noite. Às vezes, vou para uma balada e tal, mas no geral é mais barzinho mesmo”, diz Yasmin, enquanto tomava um drink com uma amiga no Mercado Novo.

Yasmin afirma que quase não frequenta boates e avalia que as poucas opções disponíveis atualmente são voltadas para públicos específicos, situação oposta à vivida por familiares dela. “Meus pais são mais velhos e falam bastante que, antigamente, era bem mais boêmio. Lembro que, quando era criança, minhas primas, que são um pouco mais velhas que eu, viravam a noite todo fim de semana na balada. Hoje em dia não é assim mais, inclusive as baladas tendem a fechar mais cedo”, disse.

Bernardo França Nogueira, 18 anos, auxiliar de TI, tem pensamento semelhante. Ele também aproveitava a sexta-feira no Mercado Novo e revelou que nunca virou uma madrugada em uma boate. “Não temos muitas boates e acho que a nossa geração gosta mais disso (barzinho). Eu, particularmente, prefiro sentar, tomar uma e conversar, o que não acontece na loucura da boate”, destaca Bernardo, que completou: “Hoje, muitos jovens trabalham na escala 6 x 1 e, por isso, não podem optar por uma jornada na noite”.

Sócio no bar Paralelo, Guilherme Drager, 28 anos, destaca o que os frequentadores da noite no Mercado Novo procuram. “Essas pessoas buscam um momento de lazer, relaxar, tomar bons drinks e conhecer um pouco mais da cultura mineira contemporânea. Aqui é hoje o antro de várias marcas, tanto de bebidas, comidas, quanto marcas de roupas e acessórios da região. Isso traduz muito também o momento em que as pessoas estão vivendo hoje”.

Sapucaí

A rua Sapucaí, no bairro Floresta, lado Leste da capital, virou um dos pontos de encontro mais frequentados da capital mineira. O espaço reúne bares com mesas e cadeiras nas ruas, bons drinks e até uma boate, a Casa Sapucaí.

Estudante de engenharia de produção, Maria Luísa Fontes, 23 anos, frequenta a região e conta que chegou a curtir algumas baladas, mas mudou de preferência com o passar do tempo. “Na pré-pandemia, a gente ia muito para boates que acolhiam movimentos de pessoas que dançavam. Eram boates mais LGBT e eu ia para curtir e dançar muito. Depois, comecei a trabalhar e a estudar, e não aguentei acompanhar esse ritmo. Hoje em dia saio bem eventualmente, para rever amigos e ter essa manutenção de amizades”, explica a jovem, que ressalta: “As boates hoje em dia são bem segmentadas por gênero”.

A Obra

Inaugurada em 1997, a A Obra resiste firme e está consolidada na noite de Belo Horizonte há quase três décadas. Marcelo Crocco Rodrigues, 59 anos, é um dos sócios da casa. Ele ressalta que o sucesso tem relação direta com a união com os demais parceiros na iniciativa (Marcelino Rodrigues da Silva e Claudio Vieira Rocha), e com o fato de não focar somente no lucro.

Mesmo com tantas transformações, ele diz que o público da A Obra se mantém fiel. “O comportamento das pessoas mudou muito. Acredito que, principalmente, por causa do mundo digital. As pessoas não saem tanto mais de casa. Teve a pandemia que, obviamente, mudou um pouco o comportamento, mas a pandemia acabou e quem é mais velho continua, mais ou menos, com a rotina que tinha antes da pandemia. Mas os mais jovens, não. O público da vida noturna, realmente, diminuiu muito nos últimos anos. Então, quem tem uma casa noturna com o intuito de fazer grana, realmente não consegue sustentar”, aponta.

Ao contrário do que ocorre em muitas baladas, Marcelo explica que a A Obra mantém da tradição de virar as madrugadas. “Na A Obra isso nunca se perdeu. A casa abre sempre às 22h, mas o auge é sempre depois da meia-noite e vai até os últimos clientes. Muitas vezes, a gente fecha 5h, 6h. Dependendo da festa, vai até mais tarde. Os jovens de hoje não têm, realmente, muito esse perfil mais”, disse, lembrando de como era o público há 27 anos:

“No início era um público bem mais jovem. Hoje em dia, realmente, a média de idade da A Obra, a maioria está entre 35 e 50 anos. Quando a Obra abriu, era de 20 a 35 anos.

Chalezinho

Nem somente de evento tranquilo vive a geração Z. A boate Chalezinho, na região Oeste de BH, é opção para jovens que buscam diversão que atravessa as madrugadas. A casa tem mais de 20 anos de tradição e conta com uma programação diversificada, para atender jovens e mais velho, como explica Bianca Isabelle de Souza, hostess na boate.

“Temos eventos que acontecem esporadicamente às quartas e, como é de rock, acaba trazendo um público um pouco mais velho. Sexta e sábado a gente sabe que é uma galera que gosta mais de funk, então acaba vindo um público mais jovem. Domingo temos sertanejo, que fica mais ou menos intermediário, com público jovem e um pouco mais velho.

“O Clube Chalezinho sempre busca novidades. A gente vai para fora do Brasil, para fora do estado de Minas, sempre tenta trazer as atrações do momento e diversificar de todas as formas. Também fazemos pesquisa de satisfação, para ver o que o público está ou não gostando. Além disso, já é uma empresa consolidada, que passa de pai para filho, e acaba sendo uma tradição. Já temos mais de 20 anos no mercado”.

Relembre algumas boates de BH

  • Hippodromo (Santa Efigênia)
  • Swingers (Santa Lúcia)
  • Floricultura (Buritis)
  • Estação 767 (Centro)
  • Josefine (Savassi)
  • Café Cancun (Savassi)
  • Pop Rock Café (Savassi)
  • Happy News (Lourdes)
  • Mary in Hell (Savassi)
  • Flapper (Savassi)
  • Cheio de Graça (Funcionários)
  • Estação 2000 (Barro Preto)
  • Velvet (Savassi)
  • Seven (Santa Mônica)
  • Mercado das Borboletas (Centro)
  • Circus Rock Bar (Lourdes)
  • Lord Pub (Savassi)
  • Studio B (Leste)
  • Studio Bar (Centro)
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Jornalista formado pela Newton Paiva. É repórter da rádio Itatiaia desde 2013, com atuação em todas editorias. Atualmente, está na editoria de cidades.
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