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‘Piiê': Justiça de Minas recua e permite que criança seja registrada com nome de faraó negro

Juíza havia impedido registro sob argumento de que o menino poderia sofrer bullying no futuro; pais alegam que o nome é um símbolo de resistência e orgulho negro

A Justiça de Minas Gerais aceitou que o filho do casal Catarina e Danillo Prímola seja registrado com o nome de ‘Piiê', em homenagem ao primeiro faraó negro do Egito. O registro havia sido negado pelo cartório e pela juíza Maria Luíza Rangel, titular da Vara de Registros Públicos de Belo Horizonte, sob a alegação de que o nome lembra o passo de ballet “Plié", o que poderia levar a criança a sofrer bullying no futuro.

Após a repercussão do caso, a Defensoria Pública de Minas Gerais (DPMG), por meio da Coordenadoria Estratégica de Tutela Coletiva (CETUC), recorreu da decisão. Nesta quarta-feira (11), a Justiça reconsiderou o pedido dos pais e permitiu que o bebê seja registrado com o nome africano.

“O juízo da Vara de Registro Públicos de Belo Horizonte autorizou o registro, conforme a grafia original, do nome Piiê Massena Prímola na certidão da criança nascida no último dia 2 de setembro, na Capital”, informou a Defensoria Pública de Minas Gerais.

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Entenda o caso

Em entrevista à Itatiaia, o casal de professores de dança Catarina e Danillo Prímola contou que conheceu a história do faraó Piiê durante a preparação para o desfile da Acadêmicos de Venda Nova, em 2023 - ano em que a escola ganhou o Carnaval de BH, além de um prêmio especial pela melhor comissão de frente dos desfiles.

Danillo e a esposa dançaram e coreografaram a comissão de frente. “Como tivemos que pesquisar para fazer esse trabalho, aprofundar na história, pensamos: ‘quando tivermos um filho ele vai se chamar Piiê'. É um nome que tem essa raiz ancestral e tem referencial de força e integridade”, explicou Danillo.

Danilo conta que assim que o filho nasceu, no dia 31 de agosto, ele foi a um cartório no Centro da capital mineira para registrá-lo com o nome do faraó africano, mas foi impedido. Inicialmente, o cartório queria que a criança fosse registrada com o nome de ‘Piê', com apenas uma letra i. Para ser registrado com duas letras i, ele deveria escrever uma justificativa para a juíza da Vara de Registros Públicos de Belo Horizonte.

No entanto, a magistrada negou que o bebê fosse registrado com o nome do faraó, em qualquer grafia, sob o argumento de que o menino poderia sofrer bullying, principalmente na fase escolar. Os pais discordam da magistrada e dizem que o nome “Piiê" é um símbolo de resistência e orgulho negro.

“A gente fica indignado. O nome não é à toa. Eu não criei ele para batizar o meu filho. Ele já existe. A gente fica à mercê da Justiça. O que eles estão tentando fazer era uma prática comum na escravidão. Os escravos chegavam aqui e eram batizados com um nome europeu, que era colocado na frente de todos os outros. Eles só podiam usar o nome africano entre eles. Em pleno 2024, eles estão tentando fazer a mesma coisa”, alega.

Em nota à Itatiaia, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) informou que a juíza avaliou a argumentação apresentada pelos pais, mas disse que a escolha “se baseou tão somente na homenagem a um faraó, sem mencionar a relação do personagem a aspectos culturais e históricos por eles valorizados”.

Por isso, a magistrada considerou a sonoridade e a grafia do nome como preponderantes para o negar o registro, “visto que, seriam aptas a causar constrangimento futuro à criança”. O TJMG também destacou que a juíza sugeriu que fosse utilizado um nome composto, à escolha do casal, para manter a homenagem ao faraó e ampliar a possibilidade de uso do nome pelo filho no futuro.


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Fernanda Rodrigues é repórter da Itatiaia. Graduada em Jornalismo e Relações Internacionais, cobre principalmente Brasil e Mundo.
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