O tempo não para. Eis uma frase que deixa pouco à explicação. Pertinente para os idos de agosto, onde já passamos do meio do ano, mas ainda um pouco longe do final. Para alguns, este é um mês de superstição, para outros o mês do trágico ou do desgosto. Se o tempo não para, faz bem que nós paremos um pouco. Faz bem ajustar o curso, colocar sobre questão as metas, atravessar incertezas.
O início do ano passa rápido, a vida é um sopro, um avião pode despencar do céu em um minuto, e de repente sonhos, projetos, sorrisos parecem se lançar no nada. A gente se cansa com o tempo que parece nos ser indiferente. Marca nossa pele, nosso rosto, de modo constante e sem ressentimento. Quando o colágeno nos abandona, depois dos 25, seguido depois dos joelhos e da coluna, vem a nós um “cansaço de correr na direção contrária”.
Lutamos com o tempo que é feito para não parar. O tempo não é outra coisa que movimento. O relógio nada mais é do que a tradução digital, ou menos analógica do movimento da terra em torno do sol. E que proveito nós tiramos de todo trabalho do qual nos afadigamos debaixo do sol (Ecl 1, 3)?
A princípio, essa assunção de que o tempus fugit (o tempo voa) pode parecer desconfortável e indigesta, mas, ao final, revela-se libertadora. Em seu pensamento, o polêmico, tanto quanto irreverente filósofo Nietzsche, ao compreender o mundo desde o ponto de vista cósmico como um eterno retorno do mesmo, indica que a posição mais madura diante da vida é o amor fati (a apreciação pelo destino, daquilo que acontece e de como acontece). Aqui o destino não deve ser entendido como uma determinação rígida, mas como a própria vida, com seus conflitos, com sua impermanência, que deve ser apreciada e celebrada tal como ela “acontece”. O filósofo afirma, em Zaratustra, que essa aceitação da vida, no momento em que parece aniquilar, transforma, e, assim, somos obrigados a amar a vida e a nós mesmos para não querer outra coisa.
Nietzsche, em absoluto não fala em termos cristãos (qualquer hipótese de cristianizar seu pensamento é um contrassenso) mas, já que em seu pensamento há “apropriações selvagens”, nos seja permitido usurpar seus pensamentos.
Ateus ou cristãos, espíritas ou budistas, o tempo não para. Todos estamos envoltos em neblina e fumaça, no incenso de nossos templos ou sufocados pelo mormaço que não deixa a poluição subir. Hébel, diz o hebraico, “neblina, fumaça”, vaidade das vaidades, tudo é vaidade (Ecl 1,1).
O que resta a nós, então? Desespero? Claro que não. Que a vida não nos encontre mortos. Que a morte se prepare, pois não iremos nos encontrar. Onde estamos, ela nunca está.
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Uma vida bem vivida é um legado. Nos anos longos, envelheça como os carvalhos, seja para os seus filhos e netos, ninhos, como são as grandes árvores aos passarinhos (Olavo Bilac). Que a vida seja infinita, no instante presente. Não há nada melhor do que comer, beber e gozar das delícias. Tudo isso vem da mão de Deus (Ecl 2,25). Para Ele, todos vivem (Lc 10,38).
Se o tempo não para, então que ele corra atrás de nós! Que sejamos nós a marcarmos o compasso da vida. Carpe diem (colhamos o dia). Sim, haverá dores, luto, luta, lágrimas, quedas, embaraços, conflitos, medo, mas existirá também gratidão, lembrança, dança, superação, solidariedade, ressurreição, esperança.