O Brasil é o maior exportador de alimentos do mundo e o país com mais espaço livre para expandir a fronteira agrícola. O país também detém a quarta maior malha rodoviária do planeta para escoar a cadeia produtiva - são quase 1,7 milhão de quilômetros de estradas. Mas todo esse potencial global é freado por problemas em escalas locais que prejudicam o avanço do setor de alimentos e o acesso à comida com preço acessível e de qualidade.
Mais do que transportar a produção agropecuária do campo para a mesa dos brasileiros, as estradas têm um papel fundamental na garantia da segurança alimentar da população. E o caminhoneiro, a responsabilidade por guiar essa cadeia marcada por desequilíbrios.
“O caminhoneiro não ganha dinheiro, ele luta pela sobrevivência”, desabafa o caminhoneiro Júlio Lessa. O relato reforça que parte da conta não fecha: o diesel está, em média, na casa dos cinco reais, além dos impostos, pedágios e da manutenção cada vez mais frequente por causa das más condições das estradas.
Se para as empresas de frete os custos estão cada vez maiores, para os autônomos, como o Júlio Lessa - que trabalha por conta própria - assumir o volante, os gastos e as consequências das viagens sozinho é um desafio.
‘Estrada ruim acaba com o caminhão e com a carga’
Rodando há décadas nas principais rodovias do país, o presidente do Sindicato Interestadual dos Caminhoneiros, José Natan Emilio Neto, reforça a situação de abandono das estradas e a consequência desse cenário para os profissionais. “Nós temos vários trechos, mas Minas Gerais é premiada, o que tem de coisa mal feita e abandonada. Estrada ruim acaba com o caminhão, acaba com a carga. Eu tenho falado que o motorista autônomo praticamente acabou”, afirma.
Na BR-381, que liga Minas Gerais ao Espírito Santo, conhecida como rodovia da morte, caminhoneiros enfrentam longos congestionamentos que colocam em risco a carga. O tempo de espera impacta diretamente na qualidade do alimento que chega à mesa do consumidor.
Além de inflacionar os preços, quando um caminhão fica preso em um congestionamento ou roda por trechos esburacados, os produtos sofrem danos que podem, inclusive, trazer malefícios à saúde.
“Se nós pensarmos na perecibilidade das frutas e verduras, qualquer toque que comprometa a qualidade do produto, a casca, por exemplo, interfere no tempo que esse produto vai ficar disponível na prateleira do supermercado. Isso pode gerar um grande desperdício”, avalia a assessora técnica da Federação da Agricultura de Minas, Aline Veloso.
Minas Gerais tem o maior número de problemas em estradas do país
Minas tem a maior malha rodoviária do país e o maior número de problemas nas estradas, liderando o ranking da Confederação Nacional dos Transportes sobre pontos críticos. Em cerca de 15 mil km analisados, os especialistas identificaram 387 pontos críticos - um ano antes, eram 94. Ou seja, entre 2021 e 2022, o nível de deterioração das rodovias mineiras quadruplicou - prejuízo para o autônomo e para grandes transportadoras, como destaca o diretor executivo da CNT, Bruno Batista.
“O setor de transportes é fundamental para o bom funcionamento da economia. O atual cenário é de bastante desafio, os riscos são grandes. O que a gente percebe é que cada vez mais as empresas têm que investir, que gastar de forma desnecessária, para mitigar riscos que são estruturais do país. Isso é muito ruim para a atividade produtiva, isso faz com que o país perca grandes oportunidades de crescimento”, diz.
Na quarta reportagem da série “Custo Estrada: o impacto das rodovias ruins na mesa do brasileiro”, vamos mostrar as melhorias em infraestrutura, obras nas estradas e o investimento, ou a ausência, dessas iniciativas.
Ficha técnica:
Reportagem: Mardélio Couto
Produção e edição: Maria Fernanda Cinini
Sonoplastia: Thiago Castro