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Desde que foi descoberto, juiz que usava nome falso recebeu mais de R$ 500 mil de aposentadoria

Justiça suspendeu os pagamentos de José Eduardo Franco dos Reis, que dizia se chamar Edward Albert Lancelot Dodd Canterbury Caterham Wickfield; farsa foi revelada em outubro de 2024

O juiz aposentado José Eduardo Franco dos Reis, que virou réu por falsidade ideológica e uso de documento falso, recebeu mais de R$ 500 mil líquidos referentes à aposentadoria do Tribunal de Justiça de São Paulo desde que teve a identidade falsa revelada, em outubro do ano passado.

O magistrado se apresentava como Edward Albert Lancelot Dodd Canterbury Caterham Wickfield por mais de 40 anos. Ele dizia ser descendente de nobres ingleses e usou os documentos falsos para entrar na faculdade de Direito da Universidade de São Paulo e passar no concurso para Juiz de Direito.

A farsa só foi descoberta após José Eduardo solicitar a segunda via da identidade em nome de Edward Wickfield. O sistema acusou que haviam duas identidades, com nomes diferentes, com a mesma impressão digital.

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Em abril deste ano, o Ministério Público denunciou a farsa do juiz à Justiça. Na última sexta-feira (5), o poder judiciário tornou José Eduardo réu e ainda suspendeu os pagamentos da aposentadoria do magistrado.

Conforme o Portal da Transparência, entre a descoberta da farsa e a suspensão dos pagamentos, José Eduardo recebeu uma quantia líquida (com os impostos já descontados) de R$ 553.826,23. O mês de maior valor foi dezembro de 2024.

Veja os detalhes abaixo:

  • Novembro de 2024: R$ 87.032,66
  • Dezembro de 2024: R$ 187.427,28
  • Janeiro de 2025: R$ 136.075,74
  • Fevereiro de 2025: R$ 143.290,55

Como foi a descoberta

José Eduardo foi descoberto ao ir ao Poupatempo da Sé, na região Central de São Paulo, para solicitar segunda via da carteira de identidade. Isso foi em outubro do ano passado. Quando foi colhida a biometria, os agentes descobriram que as digitais dele - que, até então, se identificada como Edward Albert Lancelot Dodd Canterbury Caterham Wickfield - eram as mesmas de José Eduardo Franco dos Reis.

Conforme a denúncia do MP, com a inconsistência dos dados, o caso passou a ser investigado pela Delegacia de Polícia de Combate a Crimes de Fraude Documental e Biometria.

Os agentes descobriram, então, que havia documentos no nome de José Eduardo e da persona fictícia Edward Wickfield, criada por ele. Além de documentos, como duas carteiras de identidade, também havia dois CPFs e dois títulos de eleitor ligados ao juiz.

Segundo o MPSP, por razões ainda desconhecidas, em 1980, José Eduardo Franco dos Reis criou a persona de Edward Albert Lancelot Dodd Canterbury Caterham Wickfield, dizendo ser filho de Richard Lancelot Canterbury Caterham Wickfield e Anna Marie Dubois Vincent Wickfield, descendentes de nobres britânicos.

No entanto, o juiz é natural da cidade de Águas da Prata, no interior paulista, e é filho de Vitalina Franco dos Reis e José dos Reis. Apesar de ter criado uma segunda identidade, José Eduardo nunca abandonou a verdadeira e, em 1993, apresentou-se com sua real certidão de nascimento para registrar-se como vendedor, alegando ter apenas o primeiro grau concluído.

Com a identidade de Edward Wickfield, José Eduardo entrou na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), onde se formou em 1992, e passou no concurso de Juiz de Direito em 1995. Ele exerceu a magistratura até 2018, quando se aposentou.

Fernanda Rodrigues é repórter da Itatiaia. Graduada em Jornalismo e Relações Internacionais, cobre principalmente Brasil e Mundo.