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Primeiras evidências de Moisés e José no Egito? Descoberta reacende debate sobre o Êxodo bíblico

Estudo propõe nova leitura de inscrições milenares no Sinai, sugerindo possíveis referências históricas a figuras centrais da tradição judaico-cristã

A análise de antigas inscrições protossinaíticas (alfabeto antigo) encontradas na Península do Sinai trouxe à tona novas hipóteses sobre a presença semita no Egito Antigo e reabriu discussões sobre personagens bíblicos como Moisés e José.

A proposta vem do pesquisador independente Michael S. Bar-Ron, que, após oito anos de investigação epigráfica, sugere que algumas inscrições descobertas em Serabit el-Khadim, uma antiga mina de turquesa, fazem referência direta ao nome ‘MŠ', interpretado por ele como ‘Moisés’. As inscrições datam do final da XII Dinastia egípcia, no reinado de Amenemhat III, e estão escritas em protossinaítico, um dos sistemas de escrita mais antigos conhecidos.

Segundo Bar-Ron, os textos revelam frases como ‘ZT MMŠ' (‘Isto provém de MŠ') e ‘N’UM MŠ' (‘Um dito de MŠ'), que ele interpreta como marcas de autoria. “Se estiver correto, esta poderia ser a primeira evidência escrita de Moisés como indivíduo histórico”, afirmou ao portal Patterns of Evidence. A linguagem utilizada nas inscrições - um dialeto semítico do noroeste próximo ao hebraico bíblico, com influências aramaicas - reforça sua tese.

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Para sustentar suas conclusões, o pesquisador utilizou tecnologia de ponta, incluindo imagens de alta resolução, escaneamentos 3D e moldes preservados no Museu do Antigo Oriente Próximo de Harvard. Ele identificou padrões linguísticos e formas como a letra ‘mem’ (מ), que estariam associadas a autores semitas da elite egípcia - uma descrição compatível com a narrativa bíblica que mostra Moisés sendo criado na corte do faraó.

A pesquisa também propõe uma identificação do visir egípcio Ankhu como possível representação histórica de José, figura central do livro de Gênesis. A inscrição Sinaí 350, por exemplo, apresenta um cartucho com elementos egípcios e semíticos, além de referências à divindade El, associada ao antigo culto hebraico.

Bar-Ron sugere ainda um cenário de conflito religioso em Serabit el-Khadim, baseado em alterações visíveis nas inscrições. “Vemos inscrições de adoração que aludem a Baalat, só para que escribas posteriores as modificassem, apagando símbolos como o peixe e os substituindo por louvores a El”, afirmou. Segundo ele, isso indicaria uma ‘rebelião teológica’, talvez liderada por seguidores de El - com possível participação de Moisés -, que culminaria na destruição de um templo dedicado a Baalat.

Apesar da repercussão, a proposta divide especialistas. O egiptólogo Thomas Schneider, da Universidade da Colúmbia Britânica, considerou as alegações “completamente infundadas e enganosas”, questionando a identificação das letras e o viés teológico da interpretação.

Mesmo assim, as enigmáticas inscrições de Serabit el-Khadim continuam atraindo atenção acadêmica. Caso as interpretações de Bar-Ron sejam confirmadas, elas podem reconfigurar a arqueologia bíblica ao oferecer indícios materiais sobre personagens e eventos antes restritos à tradição religiosa.

Jornalista graduado com ênfase em multimídia pelo Centro Universitário Una. Com mais de 10 anos de experiência em jornalismo digital, é repórter do Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Antes, foi responsável pelo site da Revista Encontro, e redator nas agências de comunicação FBK e Viver.