Em dezenas de cidades do Irã, o simples ato de caminhar com um cachorro pela rua passou a ser considerado um crime.
A medida, imposta por autoridades locais nas últimas semanas, intensifica uma política já presente em Teerã desde 2019 e agora se estende a centros como Isfahan, Kerman e Ilam.
O argumento oficial é que os cães em espaços públicos representam ameaça à saúde, à moral e à segurança social, mas especialistas alertam para o uso crescente dessas proibições como forma de repressão aos modos de vida urbanos e ocidentalizados.
A repressão tem amparo em interpretações religiosas do Islã xiita adotadas pelo regime iraniano, segundo as quais o cão é considerado um animal “impuro”.
O líder supremo do país, aiatolá Ali Khamenei, já declarou que manter cães como animais de estimação não é adequado à cultura islâmica.
Em 2017, ele afirmou: “Criar cães por motivos que não sejam caça, guarda ou pastoreio é um costume ocidental reprovável”.
Nova onda de proibições avança sem base em lei nacional
Embora não exista uma legislação nacional que proíba passeios com cães, promotores e autoridades locais têm recorrido a regulamentos de ordem pública e moral para justificar detenções, multas e apreensão de animais.
Em junho de 2025, o promotor de Isfahan, Mohammad Mousavian, declarou publicamente que “passear com cães em parques, vias e veículos será punido com rigor, em defesa da saúde e da ordem social”, conforme relatado pela agência IranWire.
A ONG Human Rights Watch denuncia que esse tipo de medida tem sido usado para coibir comportamentos ligados à classe média urbana, vista com desconfiança pelo regime.
Segundo o relatório da organização, publicado em maio deste ano, há um “uso sistemático de leis vagas para controlar a vida cotidiana sob o pretexto de valores culturais”.
O portal The Guardian reforça que, para além do discurso religioso, a repressão se insere num contexto mais amplo de vigilância e moralização:
“A criminalização dos cães é parte de um esforço para suprimir símbolos da vida moderna que desafiam as normas tradicionais”, analisa o jornal.
População tenta resistir, mas clima de medo avança
Em Teerã e outras cidades maiores, muitos tutores têm tentado driblar a proibição ao sair com os cães no colo, dentro de bolsas ou apenas no carro.
No entanto, há registros de pessoas detidas, veículos apreendidos e cães confiscados. O clima é de medo e incerteza, agravado pela falta de comunicação clara entre as autoridades e a população.
Organizações de direitos humanos e grupos de defesa animal têm pressionado o governo iraniano por mais transparência e revisão da política.
Para a Iran Human Rights, sediada na Noruega, a medida é “injustificável, discriminatória e parte de uma escalada autoritária que restringe liberdades básicas”.