Quando o zagueiro Arthur Henrique acertou a ida para defender o Náutico na Série B 2022, o contrato, curto, apontava o fim da ligação ao encerramento daquele campeonato. Mas nem o trato chegou até o final, por opção do Timbu, nem o vínculo do jogador com o clube terminou de vez após os nove jogos disputados com a camisa alvirrubra.
Afinal, antes de regressar a Belo Horizonte, a sua cidade, o defensor ex-Cruzeiro e América deparou-se com uma acusação que mudaria o rumo da sua carreira: de acordo com Kuki, auxiliar-técnico e ídolo do Náutico, Arthur teria cometido um pênalti de forma proposital na reta final da Segunda Divisão. Por dinheiro. Acusação: manipulação de resultado.
“Naquele jogo da Chapecoense, não teve um homem dentro do vestiário para pegar o contêiner e jogar em cima dele e dizer que ele era um lixo. É só você olhar o jogo da Chapecoense o que ele fez. Ele puxa o cara e joga-o para dentro. Vergonhoso. Eu liguei para Nei Pandolfo [executivo de futebol do Náutico] e disse: ‘tira agora para desmoralizar’. Quase tive um treco, eu tremia no sofá”, afirmou o auxiliar-técnico do clube.
“Foi uma vergonha o que aconteceu dentro do Náutico. Esquema de jogo no final. Pode ver nas redes sociais do cara, ele ganhava R$ 10 mil no Náutico e andava de Land Rover’’, disparou Kuki, o Silvio Luiz Borba da Silva, na mesma entrevista.
Pelas acusações sofridas, Arthur Henrique, através dos seus advogados, primeiramente, notificou extrajudicialmente a Kuki, em dezembro passado, pelos crimes tipificados nos artigos 139 e 140 do Código Penal: de calúnia e de difamação. O atleta pediu uma retratação pública, esta não atendida.
A seguir, em 9 de março deste ano, o zagueiro ingressou com um pedido de indenização por danos e materiais morais através da 2ª Unidade Jurisdicional Cível - 4º JD da Comarca de Belo Horizonte. No total, o atleta cobra um prejuízo de R$ 55 mil a Kuki.
Abaixo, é possível ver o lance pelo qual Arthur Henrique é acusado. Sobre o pênalti, o zagueiro se defende destacando, por exemplo, que a falta dentro da área só foi assinanalda com o auxílio do VAR.
“O centroavante da Chapecoense que vinha jogando naquele jogo era um centroavante muito forte. E toda bola que ia no fundo, eu e ele nos trombávamos numa briga por espaço. Ele me agarrava, eu o agarrava. E numa dessas brigas, o VAR interpretou como pênalti. O juiz foi lá e deu o pênalti, mas foi um lance de jogo”, afirmou.
Não fiz o pênalti de propósito, eu não tive nenhuma proposta para fazer o pênalti. Tanto que se eu tivesse alguma proposta, alguma coisa, todo mundo ia ficar sabendo disso depois dessa Operação Penalidade Máxima do Ministério Público de Goiás. Iriam achar alguma coisa em relação a mim e não é o caso
Arthur Henrique: “Eu perdi cinco contratos”
Desde que deixou o Náutico, o zagueiro Arthur Henrique tem convivido com a sombra da desconfiança. Para o seu azar, ou para a sua sorte, uma série de investigações, a partir do Ministério Público de Goiás (MPGO), tem acontecido no Brasil acerca da manipulação de resultados no futebol, inclusive com jogos da Série B 2022.
O lado ruim é que a
“Isso é a minha cartada final. Quando chega a denúncia no MPGO, quando envolve polícia, você vê que a coisa ficou séria mesmo. Eu fui acusado e em nenhum momento chegou perto de falarem o meu nome ou o nome do Náutico ou qualquer outro jogador do Náutico. Só agora que falou o nome de um zagueiro do Náutico que chegou bem depois que eu já tinha saído. Mas nunca falaram o meu nome. Eu nunca tive que responder nada em relação à manipulação de resultado, nunca tive nenhuma proposta nem nada disso. E mesmo se eu tivesse não é da minha índole fazer isso”, afirmou Arthur Henrique.
Como consequência da acusação sofrida, o zagueiro afirma que tem perdido oportunidades de trabalho. Propostas do futebol da Armênia, da Arábia, da Portuguesa-SP, do Santo André-SP e do Campinense-PB chegaram e foram por água abaixo, segundo ele, em razão do temor dos clubes em relação ao seu falso envolvimento com manipulação de resultados.
A reportagem da Itatiaia teve acesso às propostas documentadas em papel timbrado. No caso mais emblemático, neste ano, Arthur Henrique chegou a ser confirmado como novo reforço do Campinense no início de fevereiro. Mas, por pressão da torcida, o clube desfez o convite e apagou o anuncio do jogador das redes sociais. Na ocasião, o zagueiro estava defendendo o Santa Cruz, no Estadual do Rio Grande do Norte, único clube que lhe abriu as portas.
“Eu cheguei a ir para Campina Grande e tudo mais, mas quando eu cheguei lá a torcida barrou a minha contratação por causa dessas notícias relacionadas a mim. Depois que terminou o campeonato, eu vim aqui para Belo Horizonte e tive uma proposta agora da Portuguesa, tudo encaminhado, mas na hora de assinar vetaram a minha contratação novamente por essas notícias mentirosas”, afirmou.
“O Santa Cruz de Natal foi uma benção na minha vida, eles acreditam em mim enquanto todo mundo preferiu fechar a porta antes mesmo de saber do meu lado. Agora que eu quero almejar coisas grandes para a minha vida de novo. Eu tive que me posicionar e fazer o que estou fazendo”, acrescentou o defensor mineiro.
Procurado, o Campinense afirmou em nota que “o contrato com o atleta não foi firmado por motivo de força maior” e que não gostaria de entrar em detalhes sobre o caso. A Portuguesa, que fez oferta no último dia 25 de abril, não quis se pronunciar “sobre atletas que não estão sob contrato com o clube”. Apenas no primeiro caso, a nossa reportagem conseguiu confirmar que, de fato, a desistência se deu diretamente pelo boato em torno do jogador.
O Santo André foi outro caso relevante. Arthur chegou a se apresentar ao clube para atuar entre 16 de novembro do ano passado e 15 de março deste ano. O atleta treinou, mas não estreou, tendo o contrato rescindido antes de jogar - novamente, segundo ele e seus representantes, em razão do peso das acusações por manipulação de resultados. A nossa reportagem questionou ao Santo André, através da sua assessoria de comunicação, sobre as razões que levaram à rascisão, mas a equipe paulista não deu retorno.
De acordo com a ação que corre na Justiça mineira, Arthur deixou de ganhar com a rescisão contratual com o Santo André R$ 42 mil - sendo este valor cobrado a Kuki (danos materiais) - outros R$ 13 mil são pedidos por danos morais.
Sobre as propostas do exterior, a Itatiaia tentou, não conseguiu contato com os clubes.
Kuki silencia; fala o presidente do Náutico
A reportagem da Itatiaia tentou contato com o auxiliar-técnico Kuki através da assessoria de comunicação do Náutico. O ex-atacante não quis se pronunciar. Por outro lado, o presidente do clube, Diógenes Braga, afirmou que a rescisão contratual de Arthur Henrique, após a penúltima rodada da Série B, a seguir à derrota para a Chapecoense, foi uma decisão dele.
“Não existe link entre a entrevista de Kuki e a saída do atleta. A rescisão de contrato com o atleta é anterior a essa entrevista”, explicou Diógenes. “A rescisão é uma prerrogativa do presidente, assim como a determinação de encerramento de contrato de qualquer atleta”, acrescentou, sem detalhar as razões pelas quais optou pelo fim do vínculo com o jogador.
Por fim, o presidente do Náutico afirmou que Arthur Henrique teve um “comportamento normal” durante a sua passagem de três meses pelos Aflitos e que o Timbu não foi procurado por outros clubes para pedir referência sobre o atleta.
“Para mim, foi uma surpresa bem grande. Eu sabia que o Náutico estava encarando vários tipos de problemas, mas o que fizeram comigo foi tirar a responsabilidade da má gestão e tentar achar algum culpado. Não tenho medo de falar porque eu sei que o que o ex-jogador [Kuki] falou, eu não fiz”, concluiu Arthur Henrique, atualmente desempregado.