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Dia Nacional do Reggae: Relembre sucessos brasileiros do gênero jamaicano

Data homenageia morte de Bob Marley, principal ícone do movimento que influenciou Gilberto Gil, Skank e Natiruts

Gilberto Gil é um dos principais divulgadores do reggae no Brasil, como no caso da versão ‘Não Chore Mais’, baseada em sucesso de Bob Marley

A palavra tinha significado duplo. Podia se referir a “farrapos” e “roupas rasgadas”, ou a “uma confusão”, “quizumba”. Essas características eram chamadas de “rege-rege”, que originou o termo em inglês pelo qual a música espalhada pelos quatro cantos do mundo por Bob Marley passou a ser conhecida como reggae.

Não há dúvidas de que o mítico artista de cabelos dreadlocks, discurso e expressão pacifista, invariavelmente portando sua guitarra ou seu cigarro de maconha, é o principal totem do gênero jamaicano que se transformou em movimento e ideologia para alguns, adquirindo, inclusive, atmosfera de seita.

Por conta disso, o Dia Nacional do Reggae foi instituído no Brasil pela ex-presidente Dilma Rousseff, em 2012, na data de falecimento de Bob Marley, 11 de maio, com apenas 36 anos, naquele triste ano de 1981, vítima de um câncer não tratado. Seu legado, no entanto, permanece, influenciando gerações de músicos nacionais, de Gilberto Gil e Os Paralamas do Sucesso a Vanessa da Mata e Melim.

“Negra Melodia” (reggae, 1977) – Jards Macalé e Wally Salomão

Jards Macalé e Wally Salomão escreveram “Negra Melodia” pensando em Luiz Melodia, amigo de ambos. A música é uma exaltação bem ao estilo da dupla, e também ao feitio do homenageado. Prepondera a mistura de influências e a miscigenação de linguagens que formou a própria sociedade brasileira. Não por acaso, o idioma português se mescla ao inglês em determinadas passagens da letra. Lançada por Jards Macalé em 1977, no álbum “Contrastes”, ela só recebeu a voz de Luiz Melodia em 2005, em dueto com Macalé. Antes, foi regravada por Itamar Assumpção, Margareth Menezes e Lenine, até dar nome ao disco lançado por Zezé Motta em 2011, dedicado ao repertório de Luiz Melodia e Jards Macalé. O ritmo de reggae se abre a fusões.

“Não Chore Mais” (reggae, 1979) – versão de Gilberto Gil

A Bahia deu a Gilberto Gil régua e compasso e, aos 80 anos, ele continua mandando aquele abraço. Ícone do Tropicalismo, dono de sucessos inesquecíveis, vencedor de prêmios no mundo inteiro e recentemente nomeado membro da Academia Brasileira de Letras, Gilberto Gil é, sem dúvida nenhuma, um dos maiores nomes da música brasileira. O músico também é um dos principais responsáveis pela difusão do reggae em terras tupiniquins. Em 1979, ele verteu para o português uma das mais emblemáticas canções do repertório de Bob Marley. “No Woman, No Cry”, de Vincent Ford, virou “Não Chore Mais” pela pena de Gilberto Gil. Um sucesso atemporal.

“A Novidade” (reggae, 1986) – Gilberto Gil, Herbert Vianna, Bi Ribeiro e João Barone

Um ano antes de serem uma das duas únicas bandas brasileiras a não serem vaiadas no primeiro Rock in Rio da história, ao lado do Barão Vermelho, o grupo Paralamas do Sucesso confirmou a sua apoteose com o álbum “O Passo do Lui”, que rendeu ao trio formado por Herbert Vianna, Bi Ribeiro e João Barone discos de platina e ouro pelas milhões de cópias vendidas. Seguindo esse toada de sucessos, eles lançaram, em 1986, “Selvagem?”, disco que se tornou paradigma da mistura que o grupo empreenderia na música brasileira, levando ao rock influências do ska e do reggae. O exemplo mais bem acabado é “A Novidade”, reggae em parceria com Gilberto Gil.

“Go Back” (reggae, 1988) – Torquato Neto e Sérgio Britto

“Sempre tive um culto pela figura revolucionária e multifacetada do Torquato. Numa viagem que fiz a Teresina há três anos conheci o primo dele, George Mendes, que guarda o acervo completo do Torquato. Com fotografias, letras de músicas, colunas de jornal, revistas, desenhos, pinturas, tudo bem-cuidado. Fiquei contaminado por esse amor”, assegura o poeta Marcelino Freire. Tal encantamento também tomou o titã Sérgio Britto, que, em 1988, musicou versos de “Go Back”, transformada em reggae e lançada pelos Titãs. A música se transformou em sucesso imediato e foi regravada pelos grupos Paralamas do Sucesso, Só Pra Contrariar e LS Jack, além da cantora Patrícia Marx.

“Jackie Tequila” (reggae, 1994) – Chico Amaral e Samuel Rosa

Juntando baladas românticas a canções cheias de suingue, influenciadas pelo reggae e pelo ska da Jamaica, o Skank criou uma mistura azeitada que elevou o pop rock mineiro a nível nacional, arrebatando milhões de fãs em todo o Brasil e excursionando através do mundo. Formada por Samuel Rosa, Henrique Portugal, Lelo Zaneti e Haroldo Ferretti, a banda jamais perdeu o sotaque mineiro e o contato com suas raízes, embora em uma rotação contemporânea que permitia a intersecção com diversas linguagens. Em 1994, no disco “Calango”, eles lançaram “Jackie Tequila”, um reggae de Chico Amaral e Samuel Rosa que dominou as paradas radiofônicas de todo país.

“Presente de Um Beija-Flor” (reggae, 1997) – Alexandre Carlo

Formada em Brasília, a banda de reggae Natiruts faturou dois discos de ouro em 1996 e 1997, quando ainda atendia pelo nome Nativus. Nessa época, estourou com sucessos como “Presente de Um Beija-Flor” e “Liberdade pra Dentro da Cabeça”. Devido a uma ação judicial de um conjunto catarinense de música regional, chamado Nativos, eles mudaram o nome para Natiruts, e seguiram embalando o público com canções cheias de positividade e astral elevado, levando a sua mensagem de paz, amor e boas energias, como comprova a letra de “Presente de Um Beija-Flor”, mistura de amor à natureza e romantismo, regada pelo misticismo.

“Girassol” (reggae, 2002) – Toni Garrido, Da Ghama, Lazão, Bino Farias e Pedro Luís

O espírito de comunidade comparece bem na música “Girassol”, que apresenta cinco compositores: Toni Garrido, Da Ghama, Lazão, Bino Farias e Pedro Luís. Lançada pelo grupo Cidade Negra no Acústico MTV, de 2002, o reggae se tornou tema de abertura do programa de calouros “Fama”, apresentado por Angélica, na Rede Globo. Posteriormente, ganhou regravações de Elba Ramalho e de Pedro Luís. “Falamos sobre a cidade, futuro, melhorias, positivismo, evolução, crescimento, amor, perdão”, observa Toni Garrido, vocalista do trio que se tornou um dos principais representantes da corrente reggae na música brasileira, alcançando sucessos como “A Estrada”, “Onde Você Mora?”, “Girassol”, e etc.

“Desenho de Deus” (reggae, 2006) – Armandinho e Bedai

O reggae encontrou sua face mais pop e diluída com o cantor Armandinho, gaúcho de Porto Alegre que, na metade dos anos 2000, se tornou ídolo de toda uma juventude sedenta por otimismo e mensagens embebidas em leveza. É o que explica o sucesso da romântica “Desenho de Deus”, uma balada que pega emprestado o ritmo do reggae. Os versos propagados pelo cantor se colaram de tal modo ao imaginário popular que, mais tarde, viraram alvo de memes. “Quando Deus te desenhou/ Ele tava namorando”, garante a abertura melosa da composição de Armandinho e Bedai, lançada em 2006 em um espetáculo ao vivo do artista. Seja como for, a canção conquistou corações.

“Meu Abrigo” (reggae, 2018) – Gabi Melim e Rodrigo Melim

Dentro de um cofrinho em formato de porco, Gabi Melim juntava suas economias na adolescência. Porém, um belo dia, em vez de dinheiro, ela resolveu colocar no porquinho uma folha de papel, onde escreveu sobre o futuro próspero que almejava. Com o refrão escrito pela irmã mais nova, os gêmeos Rodrigo e Diogo começaram a desenvolver aquele que viria a se tornar o maior hit do trio nascido em Niterói, no Rio de Janeiro, que despontou para o estrelato depois de aparecer no programa “SuperStar”, da Globo, em 2016. Atualmente, o videoclipe de “Meu Abrigo” supera as 320 milhões de visualizações no YouTube, e a música chegou ao topo do Spotify em 2018, além de ter integrado a trilha de “O Sétimo Guardião”. Não restam dúvidas de que os versos do refrão, “meu amor, por favor, vem viver comigo/ no seu colo é o meu abrigo” mobilizaram multidões. É um reggae diluído pela indústria pop com competência.

“Dance Um Reggae Comigo” (reggae, 2019) – Vanessa da Mata

Vanessa da Mata preenche um déficit histórico na música brasileira, tanto de compositoras quanto de mulheres que interpretam reggae, com “Dance Um Reggae Comigo”, composto e lançado por ela em 2019, no álbum “Quando Deixamos Nossos Beijos na Esquina”. A influência jamaicana já se fazia perceber desde o início da carreira da intérprete mato-grossense, dona dos sucessos “Ainda Bem”, “Não Me Deixe Só”, “Amado”, “Ai, Ai, Ai”, “Boa Sorte”, dentre outras, emanando positividade e boas energias, numa música que prima pela leveza. Em “Dance Um Reggae Comigo”, Vanessa dá um passo à frente na assunção dessa influência, estendendo-a a outras mulheres.