O 21 de agosto marca uma data triste para a família de Charles Wallace dos Reis Aguiar, jovem estudante de 23 anos, que morreu neste dia, há três anos, em uma cela da delegacia de Ouro Preto, na Região dos Inconfidentes. Ele usou um tirante de caneca para cometer autoextermínio enquanto se encontrava sob tutela do Estado.
Charles, que não tinha passagens pela polícia, havia sido detido após uma briga com o namorado, na cidade de Mariana. O jovem, natural de Itabirito, ambas as cidades também da Região dos Inconfidentes, estudava História no município, na Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP).
Desde então, a família de Charles briga por justiça. Eles alegam que o jovem foi vítima de negligência dos policiais presentes na noite da morte. Isso porque, segundo consta no inquérito, o estudante foi para a cela com um tirante e um isqueiro, objetos que deveriam ter sido recolhidos por representarem potencial risco à vida do homem, especialmente pelo fato dele se mostrar alterado no momento da prisão.
Além disso, a mãe do jovem alega que ficou sabendo da morte através da funerária e não da polícia e que o corpo de Charles apresentava hematomas não compatíveis com uma briga de casal.
Defesa questiona lentidão do processo
Em contato com a Itatiaia, a defesa de Charles cobrou mais celeridade da Justiça no andamento do processo. Após três anos da morte, o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) ainda não definiu se inicia ação penal, arquiva ou pede complementação das investigações.
O MPMG recebeu o inquérito no final de novembro de 2022 e desde então os trâmites ainda não avançaram. A última movimentação foi registrada há três meses, no dia 30 de maio.
Além disso, a defesa enxerga que o processo tem sido movimentado de maneira pouco objetiva. Em termos informais, andando em círculos.
Procurado pela Itatiaia, o MPMG emitiu nota afirmando que “atualmente o MPMG analisa o inquérito policial para definição das medidas cabíveis, que, como explicado pelo advogado (da família de Charles), pode ser o oferecimento de denúncia, pedido de novas diligências ou eventual arquivamento”.
O inquérito, concluído pela Polícia Civil, entendeu que não houve responsabilidade de nenhum policial. Porém, o MPMG não precisa, necessariamente, acatar essa visão. Há a possibilidade de o órgão protocolar denúncia se definir que existiram falhas na atuação policial.
Entenda o caso
Charles Wallace foi detido pela Polícia Militar (PM) após uma discussão com seu namorado, na noite do dia 20 de agosto. Os jovens haviam participado de uma festa, onde ingeriram bebidas alcoólicas.
Durante a briga, Charles teria desacatado policiais que foram chamados para apartar a confusão. Ele então foi levado à delegacia de Ouro Preto, onde foi deixado em uma cela, onde, posteriormente, seria encontrado morto.
A defesa da família de Charles busca a responsabilização dos agentes envolvidos na situação. Segundo Gabriel de Faria, advogado da família, como estava sob tutela do Estado, o jovem deveria ter tido sua integridade física garantida pela corporação.
Consta no inquérito que, mesmo demonstrando estar muito nervoso, Charles foi deixado sozinho na cela e somente “duas ou três” verificações, em tom de reprimenda, foram feitas somente em momentos que o estudante faria muito barulho.
Além disso, havia uma câmera que mostrava o local onde ele estava detido, porém, as imagens não estavam sendo acompanhadas, tanto que nenhum dos policiais viu Charles utilizando o tirante para tirar a própria vida.
Os policiais envolvidos à época alegaram que Charles passou por revista, mas que, provavelmente, ele teria escondido o objeto utilizado para o autoextermínio, que foi apontado, no inquérito, como uma falha de procedimento.
Entendimento da defesa
De acordo com a defesa, há a possibilidade concreta de se discutir um homicídio com dolo eventual — que ocorre quando uma pessoa não tem a intenção direta de causar um resultado danoso, mas prevê a possibilidade desse resultado ocorrer e, mesmo assim, não age, assumindo o risco de que ele se concretize — dos policiais, praticado por omissão imprópria, já que os policiais tinham a obrigação de garantir a vida e integridade física do tutelado.
Também pode-se discutir o homicídio culposo, apesar da defesa entender que a primeira situação seja a mais apropriada.