Chegaram ao Brasil, nesta sexta-feira (21), os dois pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) que participaram da primeira expedição brasileira ao Ártico. Os cientistas integram uma equipe de cinco pessoas que embarcaram, no dia 8 de julho, para a cidade de Longyearbyen, em um arquipélago da Noruega.
Luiz Henrique Rosa e Vívian Gonçalves, ambos do Departamento de Microbiologia da UFMG, viajaram até o extremo norte do planeta para estudar a biodiversidade local e analisar o impacto das mudanças climáticas na região.
Rosa, um dos coordenadores do projeto, explica que a expedição é fruto do Programa Antártico Brasileiro (ProAntar). Desde 2006, o cientista integra a equipe de pesquisadores que estudam o continente gelado do hemisfério Sul. Agora, o objetivo do grupo é comparar os dados coletados por anos na Antártica com o Ártico.
“A gente tem uma experiência muito boa na Antártica, já estamos há anos coletando amostras na região. Agora, nós queremos entender como essas duas regiões interagem entre si. Há aves, por exemplo, que atravessam do Ártico para a Antártica, com parada no Brasil. Então, existem micro-organismos que são transportados de um polo para o outro e é importante conhecê-los”, afirma o pesquisador.
Para Luiz Henrique Rosa, estudar o Ártico também é importante para entender os efeitos no Brasil, já que 7% do território brasileiro está no hemisfério norte. “Uma parte do nosso país está na parte norte do planeta. O que acontece no Ártico impacta a região”, argumenta.
Descongelamento do Ártico
Segundo Rosa, o grupo também quer entender o impacto do aquecimento global no Ártico. “As regiões polares são como refrigeradores do planeta, ou seja, elas são responsáveis por resfriar a Terra. Com as mudanças climáticas, é fato que o Ártico vai descongelar mais rápido do que a Antártica. Isso porque o polo sul é maior e mais preservado. Esse degelo do Ártico pode nos dar pistas de como ele acontecerá na Antártica”, explica.
Neste ano, a Terra bateu um novo recorde de calor. De acordo com dados do Centro Nacional de Previsão Ambiental, dos Estados Unidos, no dia 4 de julho, a temperatura média do planeta foi de 17,18°C, sendo considerado o dia mais quente da história.
Rosa conta que a equipe sentiu o efeito do calor na pele. “Um sol inacreditável, quase nada de neve. Ainda que seja verão no hemisfério Norte agora, isso é atípico. Pegamos 15ºC, isso é muito alto”, conta.
Substâncias coletadas podem ser usadas na indústria, medicina e agricultura
A partir de amostras de plantas, fungos, micro-organismos e sedimentos coletadas, os pesquisadores tentam descobrir substâncias com potencial para serem usadas na indústria, medicina e agronomia. Segundo Rosa, as amostras serão trazidas o Brasil e analisadas pelas universidades participantes.
“Esses organismos coletados podem desenvolver substâncias ainda desconhecidas. É importante conhecermos o potencial de aplicação delas na biotecnologia. Um dos objetivos, por exemplo, é estudar a aplicação dessas novas substâncias para o tratamento de doenças tropicais, como a malária”, ressalta.
Coleta de mais de dez horas e risco de urso polar
Rosa conta que inúmeros desafios fizeram parte do dia a dia da equipe. “Uma das coletas que fizemos durou mais de dez horas. Pegamos um barco e fomos para o meio dos fiordes noruegueses. Nessa época do ano, tem luz solar durante 24 horas no polo norte, é o chamado sol da meia-noite. Então, a luz permitia que ficássemos trabalhando até muito tarde”, relata.
Além do trabalho duro, os pesquisadores tiveram que enfrentar o perigo de encontrar um urso polar durante a expedição. “Pela lei da Noruega, a gente só podia sair da cidade com um guia ou armado. Isso era para nos proteger dos ursos polares. Tivemos até um treinamento da Marinha do Brasil e do Exército para usar esse armamento, mas graças a Deus não chegamos a ver o urso”, conta.
O especialista analisa a operação como bem-sucedida e já planeja expedições no futuro. “Dessa vez viemos no verão para entender a logística da região. Aprendemos muito aqui. Agora, já temos novas ideias e estamos preparando para voltar no inverno”, afirma.
Rosa explica que alguns materiais importantes não puderam ser coletados dessa vez. “Vamos voltar para coletar amostras do permaforst (camada do subsolo que fica constantemente congelada) e de micro-organismos presentes apenas no inverno”, diz.