Trigêmeos nascem no Brasil após transplante de útero da irmã em procedimento inédito

Paciente que nasceu sem útero engravidou após receber o órgão da própria irmã; parto de trigêmeos entra para a história da medicina mundial

Trigêmeos nascem no Brasil após transplante de útero da irmã em procedimento inédito

O Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (HC-FMUSP), em São Paulo, confirmou o primeiro caso no mundo de trigêmeos gerados em um útero transplantado. A gestação é fruto do primeiro transplante de útero entre mulheres vivas realizado na América Latina. A paciente, que nasceu sem o órgão devido à síndrome de Rokitansky, uma condição que afeta cerca de uma em cada 4 mil mulheres, recebeu o útero da própria irmã, que já tinha dois filhos e se dispôs a fazer a doação. O procedimento ocorreu em 2024, e os bebês nasceram prematuros em agosto deste ano.

O professor Dani Ejzenberg, da FMUSP, supervisor do Centro de Reprodução Humana do HC e integrante da equipe responsável pela cirurgia, destacou que este é o primeiro caso bem-sucedido na região com doadora viva. Segundo ele, a paciente inicialmente estava inscrita no programa de doadoras falecidas, mas a possibilidade de doação pela irmã acabou viabilizando o transplante.

“Esse caso agora é o primeiro de sucesso na América Latina, com doadora viva, feito em 2024 e que nasceu agora em agosto de 2025. Ela estava inscrita no programa de doadora falecida e depois desenvolvemos um outro projeto para que a irmã pudesse doar. A irmã já tinha dois filhos de parto normal e tinha interesse de doar o útero para que ela pudesse gerar”, disse ele, em entrevista a USP.

Riscos e avanços do procedimento

De acordo com o professor Wellington Andraus, coordenador médico da Divisão de Transplantes de Fígado e Órgãos do Aparelho Digestivo do HC, apesar de ainda ser uma técnica recente, o transplante de útero apresenta baixo índice de rejeição. “Alguns casos de perda do útero já foram relatados, mas conseguimos controlar com doses intermediárias de imunossupressores. Neste caso, não houve nenhuma intercorrência”, afirmou ele.

A equipe também celebrou avanços no tempo de preparo para o implante embrionário. O intervalo, que costumava ser de um ano após a cirurgia, foi reduzido para cerca de seis meses. No caso da paciente, o procedimento foi realizado após sete meses, quando o órgão já estava cicatrizado e estabilizado.

Embrião único que virou três

Conforme o médico, a transferência embrionária aconteceu no fim de janeiro de 2025. Para evitar gestação múltipla, apenas um embrião foi implantado. No entanto, o embrião se dividiu duas vezes, fenômeno raríssimo, estimado em 0,04% das gestações, resultando em trigêmeos idênticos.

Por se tratar de uma gestação múltipla em útero transplantado, o acompanhamento foi feito de forma rigorosa por especialistas em obstetrícia, transplantes e reprodução humana. Os bebês nasceram prematuros, após sete meses de gestação, mas tiveram boa evolução e já receberam alta.

O caso também marcou o menor período de imunossupressão já registrado entre pacientes submetidas a transplante uterino: apenas um ano e dois meses. Para Andraus, o nascimento reforça a viabilidade tanto do útero transplantado quanto dos embriões congelados, neste caso, preservados desde 2014.

Ejzenberg ressaltou também que o sucesso do transplante entre irmãs abre novas perspectivas para mulheres que não conseguem engravidar por ausência de útero. Já Andraus destacou o papel pioneiro do Brasil. “O país se torna referência nessa modalidade de transplante e no acompanhamento de gestações após o procedimento”, afirmou.

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Formada em jornalismo pelo Centro Universitário de Belo Horizonte (UniBH), já trabalhou na Record TV e na Rede Minas. Atualmente é repórter multimídia e apresenta o ‘Tá Sabendo’ no Instagram da Itatiaia.

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