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Mito ou efeito real? Nutricionista analisa a “farinha da felicidade” e seus riscos

Receita viral chamada de ‘farinha da felicidade’ combina diferentes farinhas funcionais, mas não há comprovação científica; nutricionista alerta para efeitos gastrointestinais

Mito ou efeito real? Nutricionista analisa a “farinha da felicidade” e seus riscos

A chamada “farinha da felicidade” é uma mistura caseira que ganhou popularidade nas redes sociais e tem cada vez mais chamado a atenção dos internautas. Ela basicamente combina diferentes tipos de farinhas e farinhados funcionais, como psyllium, farinha de banana-verde, farinha de beterraba, farinha de maçã, ora-pro-nóbis, linhaça ou gérmen de trigo.

Nas redes, a mistura é associada a diversos benefícios — emagrecimento, desinchaço e regulação intestinal —, mas, cientificamente, trata-se de uma combinação heterogênea de ingredientes, com efeitos distintos e evidência limitada sobre os resultados da mistura pronta. Mas, de acordo com a nutricionista esportiva Ruth Egg, a “farinha da felicidade” há risco de efeitos adversos gastrointestinais.

“A junção de várias fontes de fibra tende a aumentar muito a carga de fibras solúveis e insolúveis na dieta, o que pode aumentar saciedade, regular o trânsito intestinal e modular a microbiota intestinal. Contudo, efeitos clínicos (por ex., perda de peso) dependem da dieta total e do estilo de vida — a mistura não é uma “solução mágica”. Há risco de efeitos adversos gastrointestinais (gases, distensão, diarreia) se a fibra for introduzida de forma rápida ou sem hidratação adequada”, disse.

Principais componentes e efeitos conhecidos:

  • Psyllium (fibra solúvel): melhora constipação, reduz LDL e auxilia no controle glicêmico. Atenção: pode reduzir a absorção de alguns medicamentos.
  • Farinha de banana-verde: contém amido resistente, que ajuda a controlar a glicemia pós-refeição.
  • Beterraba: rica em nitratos, favorece vasodilatação e pode reduzir levemente a pressão arterial. Pessoas com pressão baixa ou que usam anti-hipertensivos devem ter cuidado.
  • Linhaça: pode melhorar perfil lipídico, resistência à insulina e ter efeito anti-inflamatório.
  • Farinha de maçã, ora-pro-nóbis e outras fibras: fornecem micronutrientes e polifenóis, com potencial efeito prebiótico e antioxidante, mas variam conforme processamento e quantidade.

Ainda de acordo com a nutricionista, não há “estudos clínicos randomizados, de alta qualidade, que tenham avaliado exatamente essa mistura padronizada (ou seja, a “receita viral”)”. Ruth pontua que a extrapolação dos efeitos de ingredientes isolados para uma mistura complexa requer cautela.

“Portanto, não se pode afirmar com evidência de nível que a receita, tal como divulgada viralmente, produz todos os benefícios anunciados. Especialistas e veículos de saúde alertam justamente para essa lacuna e para o fato de que promessas de emagrecimento “rápido e fácil” não são sustentadas por evidência de alta qualidade”, completou ela.

Efeitos práticos e diferenças entre homens e mulheres

Ruth Egg pontuou à Itatiaia como algumas dessas farinhas funcionam na prática clínica entre homens e mulheres. Os efeitos mais prováveis incluem:

  • Melhora transitória do hábito intestinal e maior sensação de saciedade;
  • Alterações metabólicas leves a moderadas: redução de colesterol LDL, melhora discreta da sensibilidade à insulina e leve queda da pressão arterial em quem consome beterraba.

Diferenças entre sexos:

  • Em geral, homens e mulheres respondem de forma semelhante a fibras e amido resistente.
  • Pequenas diferenças podem surgir por variações hormonais, composição corporal, microbiota e padrões alimentares.
  • A linhaça, por exemplo, pode influenciar sintomas da menopausa ou o eixo estrogênico, exigindo atenção em mulheres com histórico de neoplasias hormônio-sensíveis.

Para a profissional de nutrição, receitas virais como essa devem ser analisadas sob três aspectos:

  1. Evidência científica: segundo ela, “benefícios de ingredientes isolados existem, mas não há comprovação de que a mistura pronta produza os mesmos efeitos”.
  2. Segurança: “excesso de fibras sem orientação pode causar desconfortos gastrointestinais e interferir na absorção de medicamentos; populações sensíveis podem ter riscos maiores”.
  3. Contexto individual: “o impacto real depende da alimentação e do estilo de vida. A receita pode ser útil como forma de aumentar fibras e nutrientes, mas nunca substitui um plano alimentar personalizado”.
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Formada em jornalismo pelo Centro Universitário de Belo Horizonte (UniBH), já trabalhou na Record TV e na Rede Minas. Atualmente é repórter multimídia e apresenta o ‘Tá Sabendo’ no Instagram da Itatiaia.