A agricultura urbana e periurbana, praticada em pequenos espaços como quintais produtivos, tem ganhado cada vez mais espaço como estratégia para garantir segurança alimentar, gerar renda e promover a resiliência climática. O tema esteve presente na
Segundo as mulheres participantes da discussão, os quintais produtivos vão muito além da produção de alimentos, funcionando como verdadeiros “equipamentos urbanos” no enfrentamento a desafios como a crise climática e a especulação imobiliária.
A pesquisadora da Embrapa Agrobiologia Marta Ricci explicou o conceito de quintais produtivos como espaços rurais, urbanos ou periurbanos caracterizados pelo cultivo muito intenso em pequena área de hortaliças, fruteiras, ervas medicinais e, por vezes, pequenos animais. De acordo com a cientista, eles são cruciais para a segurança alimentar, geração de renda, diversidade alimentar e redução da temperatura da vizinhança.
Marta relatou também a experiência de um quintal produtivo modelo implantado na Embrapa Agrobiologia: em um ano, a sucessão de cultivos gerou quase 176 quilos de alimentos variados (hortaliças, Pancs, feijões, raízes, tubérculos e frutas) e 700 ovos. “Quintais são lugares de memória, onde se cultiva o que é mais caro para as famílias”, afirmou a pesquisadora.
Resiliência climática e serviços ecossistêmicos
O papel dos quintais no enfrentamento dos extremos climáticos foi ressaltado pela pesquisadora da Embrapa Agrobiologia Mariella Uzeda. Em áreas da Baixada Fluminense, a pesquisa demonstrou que 90% das áreas de quintais produtivos apresentam produção insuficiente ou inexistente no verão, devido ao calor e à falta de chuva.
Medições em Nova Iguaçu e Duque de Caxias mostraram que os quintais apresentam, em média, dois graus Celsius menos que o território circundante. Os solos também são muito mais permeáveis, dessa forma, o estímulo aos quintais pode ajudar a reduzir os níveis de inundação.
“Os quintais são cruciais para a resiliência ao manterem a diversidade, especialmente o patrimônio alimentar”, afirmou. A preservação da biodiversidade também é evidente, com os quintais atuando na conservação de abelhas nativas e mantendo a diversidade de polinização.
Outro ponto ressaltado pela pesquisadora foi a importância da mulher nesses espaços. De acordo com a agrônoma, cerca de 74% dos quintais observados na Baixada Fluminense têm a mulher como principal responsável.
Mariella propôs ainda olhar para esses espaços como um ponto de nexo entre alimento, povo e território, e defendeu medidas disruptivas e políticas públicas que valorizem esses serviços e os conhecimentos locais.
Saberes ancestrais
A professora Wilza Pinto, da Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA), falou sobre os quintais agroflorestais, uma prática anterior à colonização, iniciada pelos indígenas como fonte de alimentos e remédios. Ela defendeu que os saberes e práticas ancestrais são o caminho para a segurança alimentar, pois os quintais modernos dependem desses conhecimentos para funcionar como agroecossistemas baseados na agrobiodiversidade.
A docente trouxe para o debate a agricultora familiar Maria Rosa dos Santos, que vive de sua produção orgânica em Santa Bárbara do Pará, a 40 km de Belém. Em seu sítio, que faz parte de um assentamento, ela produz hortifrutigranjeiros para consumo próprio e comercialização via programas como Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), além de feiras.
“Minha terra é minha empresa. Coloco alimento na minha mesa e de outras pessoas”, afirmou Maria Rosa, cuja produção se concentra em apenas 3 de seus 10 hectares, o suficiente para garantir o sustento sem a necessidade de desmatamento.