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Mineiros querem voltar ao ranking dos maiores produtores de arroz do país; entenda

Iniciativa testa novas cultivares de ‘arroz de terras altas’ com o objetivo de aumentar a produção do estado que já foi terceiro no ranking nacional e melhorar a renda de agricultores familiares

Janir e Janice: pai e filha na luta pela volta do arroz nas plantações mineiras

Antes de trabalhar na Empresa Mineira de Pesquisa Agropecuária (Epamig), quando ainda era estudante, a engenheira agrônoma Janine Guedes conta que seu pai, seu Janir Guedes, que toi técnico agropecuário da mesma empresa, por 44 anos, sempre lhe dizia:

“Minha filha, o arroz está diminuindo. As pessoas estão parando de plantar. Quando estiver lá, você precisa fazer alguma coisa, porque vai começar a faltar”.

Seu Janir estava certo e a filha - agora pesquisadora da Epamig - pode, finalmente, cumprir o desejo do pai. Com o preço do arroz lá nas alturas e o Brasil tendo que importar o cereal, a empresa em parceria com a Emater-MG e com o Programa “Melhor Arroz” da Universidade Federal de Lavras (UFLA) lançou um projeto que auxilia produtores rurais - especialmente os da Agricultura Familiar - a testarem novas cultivares de arroz que não necessitam ser cultivadas em solos encharcados, nem mesmo irrigadas.

O quilo do cereal está custando, em média, R$ 35 nos supermercados mineiros e a cotação da saca de 50 kg foi vendida, na semana do Natal, por mais de R$ 130, um recorde histórico, segundo dados Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea – USP).

40 UDs até o final de janeiro

Trinta e três unidades demonstrativas (UDs) já foram implantadas em quinze municípios para testes com cultivares comerciais e linhagens de arroz de terras altas. A ideia é chegar a 40 UDs até o final de janeiro de 2024.

Em outras 30 propriedades rurais, também foram plantadas sementes com as novas cultivares. A ideia é selecionar as melhores cultivares para cada propriedade e definir o sistema de plantio a ser utilizado. O arroz produzido, nessas propriedades poderá ser comercializado. “O sucesso é tanto que há 55 produtores rurais numa fila de espera para participarem”, conta Janine Guedes.

Entenda o que é um ‘arroz de terras altas’

Engenheira agrônoma, mestre pela Embrapa Arroz e Feijão, de Goiás, e doutora pela UFLA, ela explica que o “arroz de terras altas” nada tem a ver com a topografia da região e sim com a cultivar. É que antes só existiam cultivares de ‘terras baixas’ ou sejam plantadas dentro d’água, como é a produção do Rio Grande do Sul que, hoje, abastece 80% do país, mas, nos últimos anos, foram feitos melhoramentos genéticos e lançadas novas cultivares que suportam bem o cultivo sem irrigação. E é aí que entra o projeto em parceria com a Emater e UFLA.

Novas cultivares já estão sendo colhidas e não necessitam de irrigação

Produção hoje é só para consumo próprio

O objetivo é fomentar o cultivo do arroz em Minas e, assim, gerar novas alternativas de renda. “Já fomos grandes produtores. Hoje, a produção é basicamente para a subsistência. Temos potencial para aumentar a produção de forma sustentável. Não podemos desperdiçar isso”.

Arroz de terras baixas é pouco sustentável

Outra vantagem da produção do ‘arroz de terras altas’ é que ela é mais sustentável. Segundo Janine, o cultivo do cereal irrigado emite muitos gases que provocam o indesejado efeito estufa. Além disso, o sistema pode poluir os rios. Assim, o cultivo em terras altas surge como alternativa para suprir a demanda do Brasil, que sempre foi autossuficiente, mas começou a importar arroz nos últimos três anos”.

Como tem funcionado a parceria?

Produtores do sul de Minas que participam do projeto

Pesquisadores e estudantes acompanham a produtividade, adaptabilidade, desenvolvimento e rentabilidade das cultivares plantadas no Sul de Minas, Vale do Jequitinhonha e Campo das Vertentes.

O plantio iniciado em outubro, será acompanhado até fevereiro de 2024, quando ocorrerá a colheita de amostras a serem levadas para avaliações na UFLA. Nessas unidades serão avaliados também altura, floração, “acamamento” e possíveis doenças. A produção será voltada somente para pesquisa. Nas propriedades do sul de Minas, o arroz foi plantado, de forma consorciada com o café orgânico.

Trabalho gratificante

Janine conta que sempre quis trabalhar com o pequeno produtor

As expectativas são as melhores possíveis. A pesquisadora contou à Itatiaia que o trabalho tem sido gratificante. “Eu sempre quis trabalhar com o pequeno produtor. Eles ficam muito gratos com a nossa presença e ajuda. E é maravilhoso ver nosso conhecimento ser colocado em prática e ajudar a transformar a vida das pessoas”.

“Além do consumo próprio, podem vender o arroz nas feiras locais, fornecer para escolas e prefeituras e para o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Em muitas localidades, as prefeituras têm verbas para a aquisição do arroz juntamente ao produtor, mas, pela falta, têm comprado em supermercados”, alertou.

Pra completar a alegria de Janine, aposentado há três anos, seu Janir ficou tão feliz com o projeto coordenado pela filha que se ofereceu para participar como consultor voluntário. Hoje, os dois viajam juntos pelo Estado dando dicas e todo tipo de assistência técnica para os produtores. “Meu sonho é encher esses campos de arroz novamente para que a gente não precise importar mais e o cereal tenha em fartura na mesa do todo mundo”, disse seu Janir.

De 3º para 18º do ranking nacional

Minas já foi o terceiro maior produtor do grão do país, porém, com a concorrência da soja, a produção caiu. Hoje são produzidas, em média, 10,3 mil toneladas de arroz em uma área de 3,2 mil hectares no Estado, que ocupa a 18º posição entre os maiores produtores nacionais.

Maria Teresa Leal é jornalista, pós-graduada em Gestão Estratégica da Comunicação pela PUC Minas. Trabalhou nos jornais ‘Hoje em Dia’ e ‘O Tempo’ e foi analista de comunicação na Federação da Agricultura e Pecuária de MG.