Seis entidades de agricultura familiar, que beneficiam cerca de 4.800 pessoas que trabalham com agroextrativismo no Norte de Minas vão receber aporte de R$ 1,5 milhão do Programa Pró-Pequi, da Secretaria de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Seapa), para reestruturação de associações e cooperativas. Hoje, na região, mais de 60 mil famílias dependem do agroextrativismo.
Para quem não sabe, agroextrativismo é a união de práticas agrícolas sustentáveis, de baixo impacto e alto valor social, com foco na extração de produtos nativos. A atividade tem enorme potencial socioeconômico, cultural e ambiental por aliar geração de renda à restauração de áreas degradadas e desmatadas. Mas, de acordo com pesquisador da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia Aldicir Scariot, a prática ainda é pouco reconhecida e enfrenta preconceito por uma parte da sociedade.
O coletor Valney Soares
A Associação Comunitária dos Pequenos Produtores Rurais de Riacho D’Antas e Adjacências, com sede em Montes Claros, é uma das seis entidades de agricultura familiar selecionadas por meio de edital e aprovadas pelo conselho diretor do programa. Valney Soares Costa, de 39 anos, líder da associação, que trabalha com o beneficiamento de coco macaúba, conta que ela nasceu da persistência para a superação de dificuldades na microrregião e viveu vários altos e baixos desde a criação em 2009.
“A associação nasceu em meio à falta d’água no Riachão. Teve uma luta para lacrar grandes pivôs que existiam na nascente e, nisso, viram a necessidade de algo para manter o pequeno produtor, para que ele tivesse outra oportunidade de emprego e renda. O produto com abundância por aqui e que nunca tinha sido trabalhado era o coco macaúba. Então, implantamos um projeto com a ajuda de vários parceiros para construir o galpão, comprar equipamentos e começar o beneficiamento do coco”, lembra.
Assim, nasceu a Cooperativa de Agricultores Familiares e Agroextrativistas Ambiental do Vale do Riachão (Cooperriachão), que envolve 62 comunidades de Brasília de Minas, Mirabela, Coração de Jesus e Montes Claros e chegou a coletar 400 toneladas de coco macaúba por ano.
“Porém, veio a pandemia e a cooperativa ficou fechada por dois anos. Aí, eu e a minha tia Maria Eunice, com muita luta, conseguimos reabri-la e voltamos a ter contato com os extrativistas, a coletar o coco e processá-lo”, resume Valney.
Os recursos de aproximadamente R$ 270 mil destinados à Associação Comunitária dos Pequenos Produtores Rurais de Riacho D’Antas e Adjacências serão destinados à compra de um tanque de aço para a higienização de frutas, um refrigerador horizontal, um quebrador cinético para amêndoas, um despolpador de macaúba, uma prensa extratora de óleos vegetais, uma mesa inox e uma de secagem para a desidratação. No local, o beneficiamento resulta, entre outros itens, em óleos, sabão e shampoo.
“Muitos dos extrativistas nem sabem o que se faz com o coco, os produtos que são beneficiados. Quando eles veem, dizem: ‘daquele coco que eu pego lá, saem esses produtos aqui’. E para a gente, é uma alegria muito grande ouvir as pessoas relatando: ‘minha primeira geladeira, eu comprei com o dinheiro do coco macaúba’, ‘meu tanquinho de roupa, que eu não tinha, comprei com o dinheiro que eu juntei com coco macaúba aqui na comunidade’”, diz Valney.
Pequi, baru e outros
O Pequi dá nome ao projeto por ser um dos produtos mais coletados
Ao todo, devem ser beneficiadas cerca de 1,2 mil famílias. Além do pequi, que dá nome ao programa, e do coco macaúba, podem ser citados entre esses alimentos típicos da vegetação regional, o baru, o buriti e a cagaita. Esses produtos nascem espontaneamente no bioma e vêm conquistando até mesmo o interesse internacional.
Entre os critérios de seleção para a política pública, estão a localização na área de abrangência do Cerrado e sua transição para a Caatinga, tratar-se uma Organização da Sociedade Civil sem fins lucrativos e, idealmente, ser composta por maioria de pequenos produtores com Cadastro Nacional da Agricultura Familiar (CAF) - item relevante para a classificação dos inscritos.
Para o secretário de Agricultura, Thales Fernandes, o edital vem impulsionar o desenvolvimento socioeconômico regional. “A iniciativa vai permitir a agregação de valor aos produtos e, principalmente, a geração de empregos e renda. Com esse investimento, não apenas fortalecemos a cadeia produtiva, mas também oportunizamos o crescimento sustentável das comunidades”, avalia.
Em última instância, políticas públicas como esta são cruciais para a permanência das famílias no campo. A agroextrativista Magdalena Carvalho Silva, de 40 anos e moradora do município de Brasília de Minas, destaca a atividade como uma herança para as próximas gerações.
“Viver do extrativismo, para mim, significa uma vida mais saudável, e nem precisa de a gente sair da zona rural para ir à cidade em busca de emprego, porque na própria natureza, no nosso meio, tem tudo. A gente quer levar isso adiante, para outras pessoas, para os jovens, incentivá-los a catar”, declara Magdalena.
Coleta representa 20% do PIB em Japonvar
O Programa Mineiro de Incentivo ao Cultivo, à Extração, ao Consumo, à Comercialização e à Transformação do Pequi e Demais Frutos e Produtos Nativos do Cerrado (Pró-Pequi) é uma das principais políticas públicas do Estado de Minas Gerais voltadas para a sustentabilidade das espécies nativas do Cerrado.
No intuito de fornecer auxílio às populações que vivem e trabalham de forma sustentável no bioma, o Pró-Pequi incentiva práticas de extrativismo agroecológico e atividades de transformação e comercialização de frutos nativos.
“O agroextrativismo na agricultura familiar se faz importante especialmente no Norte de Minas. Cito o exemplo de Japonvar, onde a atividade é tão relevante que, sozinha, representa quase 20% do PIB do município, mesmo levando em conta a sazonalidade”, afirma Samuel.
Também neste ano, a Secretaria de Agricultura repassou R$ 950 mil à Prefeitura de Montes Claros, por meio do programa, para a execução do projeto “Arranjo Produtivo Local (APL) do Pequi e Frutos do Cerrado: negócio de impacto socioambiental”. A ação contribui para a comercialização de produtos in natura e beneficiados, o fortalecimento econômico local e o enriquecimento cultural gastronômico.
(*) Com informações da Agência Minas.