Os efeitos e sensações de diferentes bebidas alcoólicas no organismo humano é frequentemente alvo de suposições e “teses” nas mesas dos bares.
Por exemplo, muitas pessoas associam o consumo de cerveja à sonolência e o vinho ao instinto sexual.
No entanto, esses efeitos não estão relacionados ao tipo de bebida, mas sim à concentração de álcool no corpo, conforme explicou Patrícia Lara (@nutripatricialara), nutricionista especialista em medicina biomolecular, sócia-fundadora da Clínica Soloh de Nutrição em Belo Horizonte (MG).
Ao mesmo tempo, o álcool pode ter efeitos distintos entre as pessoas, dependendo do gênero e idade, mas a sua dependência não está diretamente ligada a substância. Enteda:
Teor alcoólico
Em entrevista à Itatiaia, Patrícia Lara explica que a diferença do efeito entre bebidas como vinho, cerveja e destilados está na concentração de álcool.
“A concentração alcoólica de uma cerveja é muito mais baixa do que a do whisky, por exemplo. Os vinhos também têm variações de teor alcoólico entre eles, e por aí vai”, explica a especialista.
Segundo ela, a variação nas sensações provocadas pelas bebidas alcoólicas está associada à quantidade de etanol ingerida, que afeta a metabolização do líquido no fígado.
Também conhecido como álcool etílico, o etanol é a principal substância psicoativa presente nas bebidas alcoólicas, sendo o responsável pelos efeitos intoxicantes e eufóricos após o consumo.
Patrícia explica que, ao chegar no fígado, o álcool é transformado em acetaldeído: uma substância tóxica que afeta o neurotransmissor, que pode modificar a visão e causar uma sensação de relaxamento extremo.
Quanto mais elevado o teor alcoólico, maior é a “desconexão” provocado no indivíduo, segundo ela.
Portanto, as correlações que vinculam o vinho à sexualidade e cerveja à sonolência, não têm base científica.
Em geral, os principais responsáveis pela reação das bebidas no organismo são a quantidade de álcool ingerida, a saúde do sistema digestivo e do fígado, além de fatores genéticos.
Cerveja
Patrícia Lara explica que a sensação de “relaxamento” provocado pela cerveja está relacionada à eliminação acelerada do álcool pelo sistema renal. Isso, geralmente, ocorre em bebidas ricas em líquidos, que influenciam a urinação frequente.
“A bebida alcoólica, normalmente, inibe um outro hormônio no cérebro, chamado hormônio antidiurético, que impede a necessidade de urinar o tempo inteiro. Ao beber álcool, esse hormônio é bloqueado e começa uma missão contínua, que vai perder muita água (do organismo)”, explica a nutricionista.
Essa relação entre o álcool e a urina justifica o ditado popular: “Depois de abrir a porteira, não tem como segurar o boi”.
A necessidade de fazer xixi regularmente durante a ingestão de cerveja, na verdade, diminui o efeito do álcool, explica a especialista.
“Como a cerveja é uma bebida mais rica em líquido e com baixa concentração alcoólica, você metaboliza e elimina o álcool mais rápido”, disse Patrícia.
“Beber muita água e urinar, é uma forma de tirar o álcool do sistema. Ao tirar essa substância, você melhora (o efeito de embriaguez) mais rápido. Normalmente, bebidas ricas em líquido tem um efeito relaxador, que acabao o efeito (do álcool)”, acrescenta.
Vinho
Apesar de não estar diretamente vinculada ao instinto sexual, como é popularmente associado, Patrícia explica que o vinho causa essa sensação na medida em que a concentração de álcool no sangue é diferente da cerveja.
“É uma bebida com menos líquido concentrado, que causa um efeito relaxador mais intenso. E muitas mulheres e homens precisam se sentir relaxados para tirar um pouquinho da tensão, e estarem mais dispostos a ter relações (sexuais)”, explica.
Destilados
A amnésia alcoólica - perda de memória associada ao consumo de álcool - é mais comum com bebidas destiladas devido à maior concentração álcoolica.
“Pela concentração maior de álcool, realmente, os destilados são mais favoráveis a causar essa inibição do seu sistema cognitivo, de forma mais rápida, do que bebidas que têm uma concentração menor de álcool”, disse Patrícia.
Patrícia explica que isso ocorre porque o neurotransmissor GABA, estimulado em altas quantidades no cérebro com o consumo de álcool, provoca desconexão nos níveis de atenção, enquanto as toxinas inflamatórias geradas pelo álcool prejudicam a função da memória.
A ação desse neurotransmissor também prejudica a retenção das lembranças, contribuindo para a amnésia alcoólica, resultante da toxicidade do álcool.
Quanto maior o teor alcoólico da bebida, mais fácil isso deve acontecer.
A nutricionista destaca que a amnésia não está limitada a um tipo específico de bebida.
“Mesmo bebidas mais leves, como a cerveja, podem levar a amnésia alcoólica se o volume ingerido for muito alto”, ressalta.
Reações distintas
Por outro lado, a Patrícia disse à Itatiaia que os efeitos do álcool podem variar entre duas pessoas que ingerem a mesma bebida.
Ela afirma que isso está relacionado a fatores como alimentação prévia, saúde do estômago, intestino e fígado de cada indivíduo.
Além disso, diferenças na metabolização são influenciadas por medicamentos, saúde hepática e até a genética, com a presença da enzima álcool desidrogenase (ADH) - que provoca uma eliminação mais rápida da substância do organismo.
A produção e atividade dessa enzima podem variar com base em fatores genéticos.
Pessoas com fígados saudáveis, sem interferências medicamentosas, ou com uma melhor produção de ADH, podem metabolizar o álcool de maneira mais eficiente.
A hidratação também desempenha um papel importante, afetando a intensidade dos efeitos entre indivíduos que consomem a mesma quantidade de álcool, de acordo com Patrícia Lara.
“Eu posso beber álcool com uma colega em estado hiper hidratado, enquanto ela está desidratada. Então, o efeito em mim vai ser mais leve do que nela ao beber a mesma quantidade”, exemplifica.
Mulheres ficam mais bêbadas?
Características pessoais, como idade, gênero e saúde geral, afetam o efeito do álcool, de acordo com a nutricionista.
Nesse sentido, ela afirma que há uma tendência de que mulheres tenham uma metabolização mais lenta, embora existam variações individuais.
“Mulheres metabolizam de forma mais lenta o álcool, mas isso não é uma regra, porque algumas mulheres podem metabolizar de forma igualitária a determinados homens”, destaca.
A metabolização mais lenta significa que o álcool permanece por mais tempo no organismo, potencialmente prolongando seus efeitos. Isso pode resultar em uma sensação de embriaguez mais duradoura e intensa.
A idade também pode impactar o efeito do álcool, mas não é determinante. O uso frequente de medicamentos por idosos afeta a saúde hepática, com potencial de influenciar a metabolização do etanol.
Segundo ela, não há diferenças químicas nas sensações provocadas pelo álcool devido a fatores culturais, embora a percepção possa variar.
Dependência
Patrícia Lara explica que não existe uma bebida específicas que causa maior dependência e prejuízo ao corpo humano, em comparação com outras.
Segundo ela, a dependência química do álcool está relacionada à genética e à busca por uma saída emocional, não ao tipo de bebida em si.
O desejo de usar o álcool como agente realizador, uma forma de escape dos problemas, está ligado ao estado psicológico de cada indivíduo. Ou seja, o foco está na pessoa, não na bebida.
“Isso é uma questão emocional, que tem que ser tratado com um profissional, um psicólogo, um psiquiatra, para entender porque o paciente está buscando entorpecer a mente, de forma que não enxergue, não veja, não sinta os problemas”, explica Patrícia.
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