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Livros: manifestações de 2013, dez anos depois

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A certa altura de “A Razão dos Centavos: Crise Urbana, Vida Democrática e as Revoltas de 2013" (Zahar), o urbanista e professor da UFMG Roberto Andrés explica como ideias que já pareceram sonhos distantes vão ganhando espaço na sociedade, alimentadas por protestos populares, até se tornarem aceitáveis, com impacto real na vida das pessoas.

O conceito, emprestado do antropólogo americano David Graeber, explica como a tarifa zero no transporte público passou de tema ridicularizado nos jornais à realidade em cerca de 70 cidades brasileiras em apenas uma década.

Para quem pensa que as manifestações de junho de 2013 “não deram em nada”, essa é a chave: mudar a mente da sociedade leva tempo até dar resultado. A tarifa zero é uma das conquistas dos protestos que tomaram as ruas do Brasil em junho de 2013.

“As revoltas de junho de 2013 tiveram uma grande quantidade de pautas e cada uma delas recebeu respostas institucionais diferentes. A ideia de gratuidade e que o transporte é um direito foi se disseminando. E aí aconteceu a transformação do debate público. Vimos uma onda de ‘tarifa zero’, principalmente a partir da crise do transporte durante a pandemia. Uma série de prefeituras de cidades pequenas e médias adotou uma política que era utópica”, afirma à Itatiaia.

No livro recém-lançado, Andrés recupera o surgimento dos protestos e analisa, dez anos depois, o que aquele movimento caótico por melhores serviços públicos conquistou. “O setor de transporte está em franca degradação no Brasil desde meados do século XX, e as empresas evitavam uma regulação mais severa, como se fossem donas das linhas e não prestadoras de serviço. O aumento da frota de veículos particulares nos anos 1990 e 2000 - e dos congestionamentos - degradou ainda mais a condição do transporte”.

Andrés calcula que hoje 3,3 milhões de pessoas moram em cidades que aboliram a cobrança de passagem de ônibus. É uma nova relação que estabelecem com o lugar onde vivem.

Antes de junho de 2013, a passagem só não era cobrada em 12 cidades - todas de pequeno porte. Hoje, são cerca de 70. Uma delas é Ibirité, na Grande BH, com 170 mil habitantes. “Em Ibirité, por exemplo, somente nos primeiros meses desse ano de 2023, desde que a tarifa zero foi implementada, o número de viagens duplicou. Foram de 170 mil para 350 mil por mês. Ou seja, eram 180 mil viagens que não aconteciam porque a tarifa impedia. São deslocamentos que passaram a ser possíveis de pessoas indo à escola, ao trabalho, a postos de saúde, visitar amigos, usufruir da cidade e alimentar a economia com essa circulação”.

“A Razão dos Centavos”, de Roberto Andrés. Editora Zahar, 512 páginas. R$ 119,90.

Enzo Menezes é chefe de reportagem do portal da Itatiaia desde 2022. Mestrando em Comunicação Social na UFMG, fez pós-graduação na Escola do Legislativo da ALMG e jornalismo na Fumec. Foi produtor e coordenador de produção da Record e repórter do R7 e de O Tempo
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