Que fuzuê foi esse na semana da mulher? Tudo bem que todo ano essa é uma data para falarmos dos homens. Esses cujos elogios as vezes dissimulam julgamentos, cujo ressentimento se disfarça de opinião, cujas mão entregam flores e atam correntes... Mas este ano foi demais: entre tapas e beijos, de um machismo desmascarado e de um feminismo que já está “chato”, lá estamos nós brigando por causa de comentários desconectados. Sim, estamos falando da fala da “ministra bonita”, estamos falando da fala do Frei Gilson.
Não dá para passar pano. Em nenhum dos casos! E aqui não nos referimos às ilustres pessoas “do Presidente Lula”, ou do “Frei Gilson”, que, como qualquer ser humano, tem “vícios” e “virtudes”. A análise é acerca dos discursos tresloucados, sobre os recortes nas Redes Sociais, sobre as indignações seletivas... Em temos de narrativas, é preciso, sim, ter sempre muita atenção ao que se diz e ao como se diz. O que se diz e o modo com o qual se diz são sempre um “sintoma”.
Para dizer, sobretudo de questões internas, e sabendo que os cristãos devem orientar a si mesmos, por correção fraterna (Mt 18), a fala de que a “ a mulher foi criada para curar a solidão do homem”, seja recorte ou não, é um discurso infeliz. Antes de pensar em teologia, vale a pena a ironia: alguém que entende de homem sabe muito bem que a coisa que um marido mais quer é ficar só!
Quando se vai à raiz hebraica, o que se encontra em “não é bom que o homem fique só" (Gn 2, 18) é o termo “levado” que no hebraico indica só, sozinho, isolado, e, no texto, não traz o sentido de uma acepção emocional, psicológica. A perspectiva de uma "ézer kenêgdo”, “auxiliar que lhe corresponda” não é a de uma “ajudante” que Deus dá ao homem para que esse não fique sozinho. O sentido aqui é o de uma companheira que Adão terá “diante de” (isto é, no mesmo nível), para ficar ao seu lado, para que lhe corresponda. Isso não como uma muleta ou um simples apoio, mas como um “tu”, em face a quem, o homem, na doação e na reciprocidade, descobre-se mais pleno, mais humano.
“Ezér”, ou “auxílio”, na acepção hebraica nada tem a ver com “inferior”. Tanto é verdade que o Salmo 124, 4 diz que o nosso auxílio, (ezrênu) está no nome de YHWH (Senhor) ou o Salmo 54, 4, fala que YHWH é o nosso auxílio (ozer, o ajudador). Isso para não aludir ao Novo Testamento em que o Espírito (dimensão feminina em Deus, já que Ruah, na compreensão judaica tem um acepção feminina) é chamado de o “Paráclito” (Parákletos) (Jo 14,26), ou seja, o auxiliador.
Ora, ninguém diria, que Deus, que é auxílio e colo, o é como alguém que, num lugar e posição inferiores, ampara o homem. Data vênia ao ilustre Frei, ou ao Apóstolo Paulo que diz que “o homem é a cabeça” (Ef 5,23), todo mundo sabe, na prática, que as mulheres têm atribuições divinas. E nem falamos disso no sentido de “empoderamento”, não (só Deus tudo pode!), mas em termos de onisciência, já que é impossível mentir para sempre a uma mulher, pois elas terminam por descobrir tudo, e de, via de regra, assim como ocorre com Deus, não ser coisa muito boa discutir com mulheres acusando-as de estarem erradas. “Elas tem razão!”... Todo mundo sabe que se o homem é a “cabeça”, então, a mulher é o “pescoço”!
Enfim,
Para a direita, talvez seja bom um pouquinho mais de exegese e de senso de orientação histórica. Nada conta orações longas e de madrugada, mas um pouco de senso hermenêutico não faz mal a ninguém. Modelos históricos são mutáveis, e se alguém disser que não, citando algum trecho de Paulo, lembre-se de que ele também diz que lugar de mulher é calada e que mulheres não devem ensinar (1 Cor 14, 34-35, 1 Tm 2, 11-12). Ah, é o que está cheio de mulher bela, recatada, pregadora e influencer na Internet não está no gibi. E que bom que seja assim! A questão é que se é para citar versículos, com anacronismo, que se tome a Bíblia inteira, não só partes...
Para a esquerda - e a guerra dos sexos -, talvez esteja na hora de, juntamente com as lutas pela emancipação feminina (muito legítimas, aliás!), prestar um pouco mais atenção nas mulheres de fato, com seus anseios mais genuínos, singulares e profundos. Às vezes o que mulheres querem não tem a ver com gritos e passeatas, mas com um pouco de paz poder escolher não só sobre sua roupa, sua carreira, mas também sobre sua fé, sua quantidade de filhos... Nem tudo é sobre “poder”. “Ah, se as mulheres soubessem que mais importante do que poder é influência”, lembrava o saudoso filósofo Clodovil...
Ah, e à esquerda, por último: não bastasse a “Guerra Santa” contra os evangélicos, agora vão mexer também com os católicos? Ano que vem isso vai tirar votos, ein...