Um levantamento feito por uma ONG especializada em meio ambiente constatou que, há mais de duas décadas, a emissão de poluentes na região metropolitana de Belo Horizonte é considerado acima da médica tolerável pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
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O instituto destaca dois tipos de poluentes que são extremamente maléficos à saúde: o material particulado (MP10), que tem um nível máximo tolerado de 17 microgramas por metro cúbico; e o material particulado fino (MP2,5), que tem um nível máximo tolerado de 5 microgramas por metro cúbico.
“O material particulado (MP) é um dos principais poluentes que prejudicam a saúde humana, podendo ser de origem primária, isto é, emitido diretamente por uma fonte poluidora, ou de origem secundária, quando formado na atmosfera a partir de reações químicas. O MP é classificado conforme o seu tamanho, [...] Quanto menor o tamanho dessas partículas, maior a capacidade de penetrar o trato respiratório e atingir partes mais profundas do pulmão e até adentrar o sistema circulatório, causando maiores danos à saúde”, explica o relatório divulgado.
Os dados levantados são de 2000 a 2021 e a coleta foi feita em 22 estações mantidas por empresas que possuem potencial poluidor, por regras da legislação ambiental. Estas empresas também são responsáveis, por lei, a colocar esses dados em um sistema de acompanhamento.
Ainda conforme o levantamento, na região metropolitana de Belo Horizonte, as partículas poluentes encontradas no ar são emitidas, especialmente, por indústrias do setor de mineração e siderurgia.
Recorde de poluição
Segundo o levantamento do Instituto de Energia e Meio Ambiente, o município de São José da Lapa apresentou uma média de poluentes quase cinco vezes superior à recomendação da OMS em 2021, o que ultrapassou todos os padrões de qualidade do ar vigentes no Brasil.
“Essa situação também é evidenciada pelas ultrapassagens dos padrões diários, que revelam que em 305 dias do ano de 2021, a estação apresentou concentrações de MP10 acima dos valores recomendados pela OMS, representando um risco significativo para a saúde da população. Isto é, em 83% do ano foram monitorados dados com concentração que, segundo a OMS, apresentam risco à saúde da população de São José da Lapa”, explica o relatório.
Betim também bateu recorde de poluentes em 2021, quando foram encontrados 21 microgramas de material particulado fino (MP2,5) por metro cúbico, o que é quatro vezes maior que o limite considerado tolerável pela OMS - de 5 microgramas por metro cúbico. Conforme o inventário do município de Betim, mais de 60% da massa poluente emitido no município é proveniente das indústrias
Em Belo Horizonte, o recorde também foi registrado em 2021, em uma estação no centro da cidade, na avenida do Contorno, com 17 microgramas por metro cúbico.
Problemas com monitoramento
O estudo publicado destaca, ainda, que pode haver uma subnotificação da poluição. Isso porque foram descobertas falhas em algumas estações de monitoramento, além de que outras foram desativadas com o passar dos anos.
O Iema explica que, no Brasil, o monitoramento da qualidade do ar é de responsabilidade dos estados. Em Minas Gerais, dois modelos são empregados pela Fundação Estadual do Meio Ambiente (FEAM): uma rede de operação própria e estações de monitoramento das empresas poluidoras. As empresas devem instalar estações de monitoramento em locais definidos pelo órgão ambiental e divulgar os dados em um sistema próprio. Assim, a FEAM fica responsável por validar e divulgar estes dados coletados pelas empresas.
Atualmente, a região metropolitana de Belo Horizonte tem 17 estações automáticas de monitoramento da qualidade do ar em operação. Isto, é, estações que coletam dados em tempo real e os enviam para um sistema central, permitindo uma análise contínua, sem a necessidade de operação humana rotineira.
As estações estão localizadas nos municípios de:
Belo Horizonte (quatro estações);
Betim (duas estações);
Brumadinho (três estações);
Contagem (uma estação);
Ibirité (três estações);
São José da Lapa (três estações);
Vespasiano (uma estação)
Outras cinco realizaram monitoramento no início dos anos 2000, mas foram desativadas com o passar dos anos, segundo o Iema.
“Esse modelo ainda exige uma atuação consistente do órgão ambiental para validação dos dados e garantia da continuidade do monitoramento sem falhas. O elevado número de estações com dados não representativos nos últimos anos acende um alerta sobre a eficácia do modelo de monitoramento adotado pelo órgão ambiental, especificamente no tocante à efetividade do órgão em garantir a geração de dados suficientes pelas empresas operadoras, tomando medidas corretivas para evitar prejuízos à continuidade do monitoramento”, afirma o estudo publicado.
O relatório destaca que, no caso das 17 estações que monitoram poluentes, cinco não forneceram dados válidos para cálculo da média de concentração de material particulado (MP10) em 2021, e em sete estações não foi possível calcular a média referente ao material particulado fino (MP2,5)
“No ano de 2021, destacam-se três estações que por mais de 300 dias não geraram dados válidos, indicando que essas estações permaneceram quase o ano todo sem a manutenção adequada para realizar o monitoramento”.
Outros poluentes
Além do material particulado, o estudo também monitorou o registro de ozônio (O3), dióxido de nitrogênio (NO2) e dióxido de enxofre (SO2) liberados na atmosfera na região metropolitana de Belo Horizonte. O Iema explica que o ozônio é um poluente mais complexo, e pode aparecer na atmosfera bem distante de onde foi liberado inicialmente.
Em 2020/2021, três estações que monitoram a liberação de ozônio (uma em Betim e duas em Ibirité), apresentaram concentrações compatíveis com as diretrizes da qualidade do ar da OMS. A estação do bairro Cascata, em Ibirité, inclusive, não ultrapassa os limites há quatro anos. No entanto, outras cinco estações na região metropolitana apresentaram números que ultrapassam o limite da OMS.
“Ao longo dos anos e na maioria das estações prevalece um cenário sustentado de não conformidade às diretrizes de qualidade do ar da OMS (DAQ). Em cinco das 11 estações que monitoram o O3 [ozônio], as concentrações médias registradas não atenderam às DQA em nenhuma vez no período analisado”, revela o estudo.
Quando se tratando do dióxido de nitrogênio (NO2), um componente que também forma o ozônio e outros poluentes, em 2021, todas as estações, com exceção da localizada no bairro Cascata do município de Ibirité, apresentam níveis superiores aos recomendados pela OMS. O estudo, entretanto, destaca que há uma tendência de redução da concentração deste poluente nos últimos anos, especialmente em Ibirité.
Já os dados do dióxido de enxofre (SO2) mostram que a qualidade do ar se encontra em conformidade com a meta final brasileira e as diretrizes da OMS, com valores bastante baixos e sempre abaixo da metade do valor considerado seguro pela OMS. A única exceção foi em 2014, quando uma estação na avenida Amazonas apresentou números elevados do poluente.
Posicionamento dos órgãos
A Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável afirmou, por meio de nota, que “os valores orientadores da OMS ainda não estão vigentes a nível nacional” e que a Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam) “realiza o acompanhamento do monitoramento contínuo e automático da qualidade do ar no estado de Minas Gerais, atualmente abrangendo 20 municípios mineiros”. Leia a nota na íntegra no fim desta matéria.
Em nota, a PBH afirmou que “apresentou o 6º Inventário de Emissão de Gases de Efeito Estufa na reunião ordinária do Comitê Municipal de Mudanças Climáticas e Ecoeficiência” e que, em 2021" aderiu à campanha global Race to Zero, assumindo a meta de neutralização do carbono até 2050".
A prefeitura destacou que também plantou mais de 17 mil árvores em 2022 e 16 mil em 2021, e que possui um “programa de Operação Oxigênio com ações de combate à poluição dos veículos e melhoria da qualidade do ar”. Denúncias de poluição Ambiental (Hídrica, Atmosférica ou do solo) podem ser registradas no PBH APP, 156 ou no Portal de serviços da PBH.
A Prefeitura de Ibirité afimrou, por meio de nota, que “o licenciamento ambiental é concedido as empresas potencialmente poluentes somente com o monitoramento ou a mitigação destas fontes de poluição” e que “há espaço para denúncias da população, para que seja feita a fiscalização das fontes de poluição causadas por pessoas físicas, tais como as queimadas em lotes, queima de resíduos sólidos (lixo), dentre outros”.
As prefeituras de Betim e São José da Lapa também foram questionadas, mas não retornaram.
Nota na íntegra da Feam:
“Em relação ao estudo do IEMA, que aponta que a concentração de poluentes no ar da Região Metropolitana de Belo Horizonte está acima das recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS), a Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam) esclarece que os valores orientadores da OMS ainda não estão vigentes a nível nacional, conforme aponta o próprio Boletim divulgado pelo IEMA.
A própria OMS indica que as diretrizes por ela traçadas não devem ser aplicadas automática e indistintamente, devendo cada país levar em conta os riscos à saúde, sua viabilidade tecnológica, questões econômicas e fatores políticos e sociais peculiares, além do nível de desenvolvimento e da capacidade de cada ente competente para atuar na gestão da qualidade do ar.
Entretanto, objetivando uma análise mais conservadora, o IEMA optou por enfatizar a comparação aos padrões da OMS, da mesma forma que a Feam também usou essa mesma estratégia para definir as metas de redução das emissões destacadas no Plano de Controle das Emissões Atmosféricas de MG (PCEA).
A Feam realiza o acompanhamento do monitoramento contínuo e automático da qualidade do ar no estado de Minas Gerais, atualmente abrangendo 20 municípios mineiros. Os dados do monitoramento constituem uma importante base de informação, utilizada para desenvolver o Plano de Controle de Emissões Atmosféricas (PCEA). Para elaboração da proposta do PCEA, além dos dados de monitoramento da qualidade do ar, a Feam realizou um levantamento utilizando os inventários de fontes de emissão da região para identificar os principais contribuintes, com o objetivo de que as ações propostas no Plano fossem direcionadas aos principais contribuintes das emissões.
Destaca-se que, de acordo com Resolução Conama nº 491/2018, o padrão de qualidade do ar é um dos instrumentos de gestão da qualidade do ar, determinado como valor de concentração de um poluente específico na atmosfera, associado a um intervalo de tempo de exposição, para que o meio ambiente e a saúde da população sejam preservados em relação aos riscos de danos causados pela poluição atmosférica. Eles são divididos em duas categorias:
Padrões de qualidade do ar intermediários - PI: padrões estabelecidos como valores temporários a serem cumpridos em etapas; e
Padrão de qualidade do ar final - PF: valores guia definidos pela OMS em 2005
Ainda conforme essa norma os padrões de qualidade do ar serão adotados sequencialmente, levando em consideração os Planos de Controle de Emissões Atmosféricas e os Relatórios de Avaliação da Qualidade do Ar, elaborados pelos órgãos estaduais e distrital de meio ambiente, conforme determinado nos artigos 5º e 6º da 491/2018.
Cabe ressaltar que a Feam está em fase final de construção do PCEA. Atualmente, o Plano, que busca delinear as ações visando o controle da poluição em regiões priorizadas, se encontra em fase de consulta pública. Nesta primeira versão são analisados oito municípios: Belo Horizonte, Contagem, Betim, São José da Lapa, Congonhas, Ipatinga, Timóteo e Conceição do Mato Dentro.
Exemplos de ações que compõem o plano são: verificação dos sistemas de controle para as fontes de emissões industriais mais importantes, e alinhamentos estratégicos junto ao plano de mobilidade dos municípios, considerando que as emissões veiculares são relevantes para algumas regiões analisadas.
A minuta do plano está disponibilizada para consulta pública até dia 06/07/2023, no
No âmbito do processo de licenciamento ambiental, são solicitados estudos específicos, como os Estudos de Dispersão Atmosférica, que são analisados pelo órgão ambiental responsável durante o processo de obtenção de licença. Esses estudos visam subsidiar as medidas de controle que serão adotadas em relação aos empreendimentos e a exigência ou não de monitoramento da qualidade do ar, que poderão ser contemplados no processo de licenciamento ambiental, por meio da definição de condicionantes ambientais”.