Os chamados ‘manicômios judiciais’ estão com os dias contados. No próximo dia 17 de junho entra em vigor uma resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que divide opiniões nos meios jurídico, médico e da segurança pública. Assinada pela presidente do órgão e do Supremo Tribunal Federal, ministra Rosa Weber, a resolução institui a Luta Antimanicomial no judiciário e no sistema penitenciário.
Durante toda semana, a Itatiaia apresenta uma séria de reportagens especiais sobre o tema com relatos de psiquiatras e especialistas em segurança pública. Nesta quinta-feira (11), o ativista social e estudante de jornalismo, Luan Gomide de Souza Cândido, 42 anos, que já ficou preso em ‘manicômios judiciais’, acompanha de perto a questão do sofrimento mental das pessoas privadas de liberdade. No passado, ele chegou a ser considerado semi-imputável pela Justiça e ficou preso em Juiz de Fora, na Zona da Mata mineira.
“Sou sobrevivente dos manicômios judiciários. Eu vi violações de direitos; a privação de liberdade por si só já é uma tortura física e psicológica. O corpo e a mente adoecem proporcionais ao tempo em que ficamos ociosos e improdutivos, seja na cela individual ou na coletiva. A gente, na pandemia, sentiu bastante a tortura do confinamento. No manicômio prisional a gente via pessoas que não tinham perspectiva de ver, novamente, a liberdade, ver os afetos, porque estavam presas além das suas penas, sofrendo torturas.”
Luan relata à Itatiaia que a saúde mental dele, no período em que ficou preso, piorou muito.
“Piorou muito. Em geral, as pessoas que passam por manicômio não conseguem melhorar o seu quadro clínico. Só piora, porque a privação de liberdade ela tira aquilo que a pessoa precisa para poder conseguir melhorar que é a socialização, o afeto, estar em contato com uma rede de pessoas e de cuidados.”
A coordenadora da Pastoral Carcerária, Ana Lúcia, celebra a decisão do CNJ.
“Nós da Pastoral Carcerária, por defendermos o desencarceramento e a garantia dos direitos das pessoas privadas de liberdade, em termos inclusive de assistência à saúde e principalmente a saúde mental que é tão excluída em todos os espaços, e não seria diferente no espaço do cárcere, pra gente é mais uma conquista.”
Já Laura Fusário, da Associação dos Usuários do Serviços de Saúde Mental de Minas Gerais, elogia a resolução dos CNJ, mas acredita que será necessária uma ampliação da rede de saúde mental.
“A gente já tem muito mais dispositivos, muito mais conhecimento, sobre como acolher pessoas com sofrimento mental. Agora, tensionamentos vão existir, questões de ordem principalmente social, de organização da rede, de dimensionamento de equipes, de processo de trabalho, mas isso não é negativo. Isso, na verdade, é muito positivo, porque a gente vai estar ampliando o acesso ao cuidado em saúde mental.”
Sobre a polêmica de que as medidas do CNJ podem gerar impunidade o ativista Luan Gomide discorda.
“As pessoas que são inimputáveis, elas respondem o processo em liberdade, elas não deixam de ser responsabilizadas e uma forma de responsabilizar essa pessoa e fazer com que ela não reincida em novos quadros psíquicos de violência, contra ela mesma ou contra outra pessoa, é realmente este acolhimento que ela tem com referências técnicas públicas no cumprimento da medida, na rede de atenção psicossocial e junto com a família ou com os afetos.”