A Justiça de Goiás tornou o juiz aposentado Levine Raja Gabaglia Artiaga, de 45 anos, réu por participação no desvio de R$ 18 milhões por meio de decisões fraudulentas. Além do ex-juiz, a Justiça também aceitou a denúncia contra o pastor Efraim Soares de Moura, acusado de fazer a ponte entre o “núcleo judicial” e o operacional da quadrilha, e a assistente do gabinete de Levine, Graciele Matias dos Santos.
A investigação começou em dezembro de 2020 na Comarca de Corumbá de Goiás, cidade a cerca de 120 quilômetros de Goiânia. Em maio de 2022, Levine foi aposentado compulsoriamente do cargo de juiz. A punição é considerada a mais alta para o cargo, porém o ex-magistrado continua recebendo o salário integral. Em julho deste ano, por exemplo, Levine recebeu R$ 15.865,71 dos cofres públicos.
De acordo com o Ministério Público de Goiás, pelo menos 43 decisões judiciais que passaram pelas mãos de Levine tinham indícios de fraude. A denúncia se aprofundou em seis delas, sendo que em duas os réus não conseguiram efetuar as fraudes. Nas outras quatro, o grupo criminoso conseguiu desviar R$ 18 milhões de valores pagos, dos quais o ex-juiz ficou com 10% (ou R$ 1,8 milhão), de acordo com o processo.
Além dos três réus acusados de participar do “núcleo jurídico”, outras 16 pessoas são rés por integrar o esquema. O processo contra a quadrilha, no entanto, foi desmembrado e a denúncia contra os 16 restantes será analisada separadamente.
Como funcionava o esquema?
Entre 2017 e 2020, o grupo conseguia informações bancárias de contas que tinham valores milionários. Após identificarem os potenciais alvos, o grupo criava personagens fictícios, criava documentos falsos, e até vínculos de parentesco inexistentes com os correntistas. Tudo isso servia para que eles conseguissem os benefícios ou comprovassem a história perante a Justiça.
Com a narrativa criada, o grupo entrava com um processo pedindo acesso ao dinheiro por meio da Comarca de Corumbá de Goiás, fazendo com que Levine fosse o responsável por julgar os casos. Segundo a denúncia, pelo menos oito advogados estão envolvidos no esquema. Eles respondiam pelos falsos clientes e davam credibilidade ao processo.
Depois que o caso chegava à Justiça, Levine determinava que os valores fossem repassados para as contas dos beneficiários. Em seguida, o grupo repartia a quantia entre os envolvidos. O pastor Efraim recebia cerca de 25% do valor e repartia a quantia pela metade com Levine.
Levine cometia ‘erros grosseiros’ em decisões, diz juíza
A juíza Placidina Pires, responsável pelo caso, afirma que Levine cometia “diversos erros grosseiros no manejo de tais ações, praticando, por exemplo, evidentes falhas técnicas, erros jurídicos crassos, atropelos de procedimentos, anotações indevidas de segredo de justiça e, ainda, deixava passar documentos com supostos sinais de adulteração”.
Após receber a quantia milionária, o ex-juiz repartiu os valores em diversas remessas para despistar a origem ilícita do dinheiro. Ele enviou parte delas para o exterior e teria comprado um veículo de luxo e um terreno.
A magistrada ainda afirma que Graciele Matias dos Santos atuava como assistente administrativa do gabinete de Levine, e que tinha o papel de assessorar o ex-magistrado nas ações fraudulentas. A juíza ainda afirma que Graciela também recebia quantias por participar do esquema.
Levine, Efraim e Graciela respondem pelos crimes de organização criminosa, peculato, corrupção passiva, corrupção ativa, estelionato, falsidade ideológica e lavagem de capitais.
O que diz a defesa do ex-juiz
Procurada pela Itatiaia, a defesa de Levine Raja Gabaglia Artiaga informou que o ex-juiz nega todas as acusações que lhe foram imputadas. Os advogados de Levine também afirmam que “as alegações carecem de provas robustas que justifiquem tal imputação”.
Sobre os 43 processos que teriam sido fraudados pelo ex-magistrado, a defesa argumenta que não há provas suficientes de que ele tenha manipulado essas decisões judiciais. Os advogados dizem que esse trecho da decisão foi colocado para manchar a imagem de Levine.
Os advogados finalizam a nota informando que o juiz aposentado se recupera de uma grave cirurgia, “realizada em razão de um traumatismo craniano recentemente descoberto”.
O que dizem as defesas dos demais acusados:
Em nota, o advogado Sandro Ferreira Lopes Rezende, que representa a defesa de Efraim Soares de Moura, afirmou que, embora a denúncia tenha sido recebida, a Justiça determinou a citação do réu para poder ratificar as peças de defesa já apresentadas ou, se necessário, apresentar novas peças. Por isso, a defesa informa que aguarda a citação para, assim, adotar as medidas cabíveis.
Já a defesa de Graciele Matias dos Santos negou que a ré tenha algum envolvimento com o grupo criminoso, e que ela é inocente.