Assim como toda criança, Marcos Neto Júnior Hilário Gutemberg ama brincar de carrinho e dançar. Entre idas e vindas do hospital, o menino, de apenas 2 anos e 8 meses, mantém a alegria, mesmo após ser diagnosticado com leucemia linfoide aguda (LLA) de alto risco, um tipo de câncer do sangue e da medula óssea. Sem resposta aos tratamentos oferecidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS), o menino vê nos Estados Unidos a única oportunidade para sobreviver. Enquanto aguarda a família conseguir o dinheiro para custear o procedimento, Marcos está sob cuidados paliativos.
A mãe Juliana Félix Hilária dos Santos, de 32 anos, conta que o filho foi diagnosticado com a doença aos 32 dias de vida. “Logo quando o Marcos nasceu, ele tinha uma barriga grande, com dois caroços, e vomitava muito. Cheguei a ir 18 vezes no posto de saúde atrás de um diagnóstico. Até que um dia ele passou mal, vi que ele estava morrendo e levei no hospital. Lá eles descobriram que ele estava com leucemia”, conta.
Mesmo em meio a fortes dores, Marcos não tira o sorriso do rosto.
Ele é cheio de vida. Tem gente que olha e fala que ele não tem problema nenhum. Ele é gordinho, come bem, brinca. Todo mundo que conhece o Marcos fica apaixonado, ele é cativante
Agora que as opções de tratamento gratuitas se esgotaram, um procedimento feito nos Estados Unidos é a única chance do menino. “Em novembro de 2022, os médicos me falaram que o Marcos estava desenganado. Aí comecei a pesquisar e descobri um médico aqui em Belo Horizonte que faz um tratamento inovador, mas ele não é coberto pelo SUS. Os médicos retiram um líquido da medula, enviam para os Estados Unidos e tratam com um medicamento. Depois eles reaplicam o líquido no paciente”, diz Juliana.
O tão desejado tratamento custa mais de R$ 2 milhões. Para conseguir o dinheiro necessário, Juliana entrou na Justiça e criou uma vaquinha online (
Até que a família consiga o tratamento particular, Marcos está sendo acompanhado pela equipe de cuidados paliativos do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais. O menino está há nove meses sem realizar quimioterapia e apenas toma medicamentos para amenizar as dores.
O que é cuidado paliativo?
A Organização Mundial da Saúde (OMS) define o cuidado paliativo como uma “abordagem que melhora a qualidade de vida de pacientes (adultos e crianças) e suas famílias, que enfrentam problemas associados a doenças que ameaçam a vida”.
De acordo com a Tatiana Amaral, médica pediatra e coordenadora do grupo de cuidado paliativo do hospital das Clínicas da UFMG, os cuidados paliativos englobam uma comunicação de alta qualidade, o planejamento de cuidado avançado e a avaliação e gestão dos sintomas físicos e psicológicos do paciente.
Tudo é feito por uma equipe multidisciplinar que conta com médicos, enfermeiros, psicólogos, fisioterapeutas, assistentes sociais, pedagogos e artistas, como palhaços, musicistas e atores que fazem peças infantis nos hospitais.
"É importante que o cuidado paliativo comece logo após o diagnóstico de uma doença crônica de cuidado prolongado e complexa. No caso da pediatria, muitas vezes ela vai acompanhar o paciente desde o nascimento, ou seja, a vida toda”, esclarece a especialista.
Quais as diferenças entre o cuidado paliativo adulto e o pediátrico?
Segundo a pediatra, o fato das crianças ainda estarem em desenvolvimento é determinante para as escolhas da equipe acerca do tratamento. “Essas crianças estão em constante desenvolvimento físico e emocional. Isso vai impactar todos os aspectos do cuidado. Dilemas éticos vão surgir, por exemplo, porque a medida que ela cresce, ela passa ater mais autonomia e decisões sobre o próprio corpo”, diz.
O objetivo do cuidado paliativo pediátrico é permitir que crianças vivam sua infância e adolescência da melhor maneira possível, apesar de terem uma doença complexa e crônica
Outro ponto que difere dos adultos é prognosticar a doença. “Na pediatria é muito complicado prognosticar. Isso por que ao mesmo tempo que as crianças estão adoecidas, elas estão crescendo. Então, os órgãos eles podem estar recuperando e crescendo, ao mesmo tempo em que a doença está avançando”, explica a coordenadora do grupo de cuidado paliativo do HC-UFMG.
Crianças internadas têm brincadeiras, arte e encontro com pets em hospitais
Crianças com doenças crônicas graves muitas vezes chegam a passar longos períodos internadas, algumas chegam, até mesmo, a morar em unidade de saúde por meses. Em um ambiente normalmente frio e desconfortável, os pequenos contam com a ajuda de uma equipe interdisciplinar para tornar a internação mais confortável.
“A gente entende que diante de um cuidado integral, ainda que seja no hospital, essa criança merece ter a melhor condição de vida possível. Então, existem vários projetos no sentido de oferecer para essas crianças internadas vivências da própria infância”, relata a médica Tatiana Amaral.
No Hospital das Clínicas da UFMG, pedagogos criam brincadeiras, palhaços fazem visitas para divertir a criançada e, até mesmo, cachorros marcam presença na ala infantil de tratamento. “O encontro com os pets é um projeto do HC em parceria com a veterinária da UFMG. Existem várias atividades que fazem com que essas crianças possam vivenciar essa infância ainda que seja dentro do hospital”, conclui.